Passo Fundo (RS) - Enquanto parte dos grandes grupos de educação resolveu desidratar cursos, demitir professores e enxugar custos para garantir lucros nos últimos anos, após o boom do ensino superior no começo da década passada, a faculdade gaúcha Atitus Educação tem buscado seguir um outro caminho.

Criada há pouco mais de 20 anos, a instituição de ensino cresceu comprando outras faculdades, abrindo cursos de pós-graduação e expandindo sua atuação para áreas distintas de sua origem, o curso de Direito.

O campo mais promissor, na visão do próprio grupo, está no campo. Por isso, agora, a ideia é concentrar forças no agronegócio para continuar crescendo e, mais adiante, quem sabe até mesmo ultrapassar a fronteira do Rio Grande do Sul.

“O agro é a nossa prioridade número 1 em termos de posicionamento de perspectiva de futuro porque traz a visão de a gente nacionalizar nossa operação a partir dele”, resume Eduardo Capellari, CEO da Atitus, em entrevista ao AgFeed, concedida nas instalações do campus da Escola do Agronegócio da empresa, localizado em Passo Fundo, cidade do Norte gaúcho.

Por enquanto, o próprio Capellari admite, o projeto é “incipiente”. “É de médio ou longo prazo, porque passa necessariamente para entender qual é o modelo para escalar isso”, afirma o CEO da Atitus.

Por isso, no momento, a Atitus vem fazendo um mapeamento de possíveis regiões do Brasil onde poderia atuar oferecendo cursos ligados ao setor – a faculdade tem cursos de Agronomia e Medicina Veterinária e readequou seus currículos nos últimos anos para aproximar academia e mercado.

Capellari cita cidades como Ribeirão Preto (SP), Luiz Eduardo Magalhães (BA), Barreiras (BA), Cascavel (PR) e Lucas do Rio Verde (MT) como exemplos de localidades já mapeadas e com potencial.

“São regiões simbólicas para o agronegócio, que têm PIB, têm empresas, têm demanda e ajudam a posicionar uma estratégia nacional”, afirma o CEO da Atitus.

Por ora, além do modelo de negócios, o entrave para fazer o projeto decolar são os recursos necessários para fazer a expansão. “Falta funding, falta investidor. Mas nós temos isso em mente”, diz Capellari.

O problema para a atração de investidores, na avaliação do CEO da Atitus, mora nas condições do mercado de private equity para educação e do cenário macroeconômico como um todo, com a escalada da taxa Selic.

No caso dos fundos, Capellari diz que os múltiplos estão “degradados”. “O problema é: quanto eles vão pagar? Um exemplo: se eles pagam 3,5% do múltiplo de Ebitda, ninguém vai vender. Nós não vamos vender participação societária nesses valores”, afirma.

O CEO da Atitus entende que existem dois tipos de fundos na área de educação. Um desses tipos é o que Capellari classifica como “urubus”.

“São aqueles caras que vão te comprar a 3, para fazer a saída em 5 anos e extrair o máximo de valor possível, cortando todos os custos. A maior parte dos fundos faz isso, só que na educação isso é deletério”, afirma.

Outros fundos, mais alinhados à filosofia da Atitus, têm visão de longo prazo, na avaliação de Capellari.

“Eles entendem o valor da marca, entendem o valor da pesquisa e da pós-graduação. Sabem que vão ganhar menos e o prazo de realocação de investimento deles é mais longo, fazem a saída em 10 anos”, diz.

De qualquer forma, o problema reside na tese, mas, segundo Capellari, o agro pode resolver a equação.

“O mercado hoje não tem uma tese definida de educação que não seja para o curso de Medicina. Nós achamos que essa tese pode existir no agro, mas tem que ficar claro para quais regiões, para qual modelo de Agronomia e Medicina Veterinária seguir”, afirma.

Hoje, a participação acionária da Atitus é dividida entre Capellari e outros seis acionistas – no passado, chegaram a ser 21 sócios, uma vez que a faculdade nasceu, em 2004, a partir de um grupo de estudantes de mestrado que pensava em empreender na educação.

Centro de pesquisa

Se faltam investidores para um plano mais ousado de expansão nacional, por enquanto a Atitus vem se concentrando em um plano de investimentos de R$ 100 milhões a ser executado até 2027 em sua operação no Rio Grande do Sul, onde a faculdade surgiu há pouco mais de 20 anos.

Inicialmente, a Atitus – que antes se chamava Imed, nome trocado em 2022 – era mais uma faculdade de Direito começando no mercado, como outras que surgiram a partir do começo dos anos 2000, influenciadas pela criação do Fies, programa de financiamento para o ensino superior do governo federal.

Com o passar dos anos, a faculdade adquiriu outras instituições de ensino, criando novos cursos, e conseguiu expandir sua operação, chegando a um faturamento de R$ 158 milhões no ano passado – um crescimento de 8% em relação a 2023.

Hoje, são 17 cursos de graduação, cinco programas de mestrado e três de doutorado, distribuídos em cinco escolas: Agronegócio, Direito, Negócios e Tecnologia, Politécnica e Saúde.

Ao todo, a instituição possui cerca de 5 mil alunos em cinco campus, três em Passo Fundo e dois na capital gaúcha, Porto Alegre.

A Escola do Agronegócio contempla dois cursos: Medicina Veterinária, criado em 2016, e Agronomia, que é o mais recente e existe desde 2020.

No ano passado, após um investimento de R$ 12 milhões, houve a inauguração de um campus exclusivo para a escola, localizado a seis quilômetros do centro de Passo Fundo, no modelo Smart Farm (fazenda inteligente).

Além disso, há dois anos, a Atitus reformou o currículo dos cursos, com a inserção de disciplinas de empreendedorismo e inovação, voltadas à inserção dos alunos no mercado de trabalho, além da criação de um projeto chamado Agribusiness Partner Program.

Essa iniciativa conta com 26 empresas e instituições participantes, entre elas companhias como Be8, JBS, Ourofino Saúde Animal, Metasa e SLC Máquinas, e um Conselho Consultivo, que reúne nomes como o ex-ministro da Agricultura e Pecuária Francisco Turra e o CEO da Ourofino, Kleber Gomes.

Nesse programa, as empresas participam, em diferentes níveis, das disciplinas e de seu conteúdo programático, possibilitando que os estudantes tenham um contato mais próximo com o mercado, com acesso a vagas de estágio e até mesmo interações com o alto comando dessas empresas – que se reuniram na última quinta-feira, dia 27 de março, em Passo Fundo, para apresentar e debater os resultados do programa com o Conselho Consultivo.

“Para o mercado, também é um aprendizado. As empresas nunca viram isso, nunca tiveram a oportunidade de sentar com a academia e discutir conteúdos programáticos, modelos, o que vai ser abordado e como poderiam fazer”, diz Deniz Anziliero, diretor da Escola de Agronegócio da Atitus.

A partir desse programa e das novas instalações da escola, a Atitus se prepara agora para montar um espaço chamado Centro Brasileiro de Desenvolvimento do Agronegócio, que deve ser instalado em uma área de 60 hectares, também em Passo Fundo.

Com a nova estrutura, a Atitus planeja firmar acordos de pesquisa com empresas interessadas em utilizar as instalações e o conhecimento dos acadêmicos da faculdade para desenvolver soluções e produtos dentro desse centro de pesquisa.

“O que nós estamos propondo é criar um centro com pesquisadores de todas as áreas de conhecimento. Vamos ter uma estrutura com máquinas, equipamentos, técnicos para fazer o plantio. A gente disponibiliza isso para as empresas, para que elas possam desenvolver aqui dentro”, afirma Capellari.

A ideia, segundo o CEO da Atitus, também é ocupar um nicho de mercado local que hoje é ocupado por outras empresas.

“As principais multinacionais têm suas estações experimentais de pesquisa a campo num raio de 60 quilômetros de onde nós estamos. Essas empresas fazem algumas pesquisas nas suas estações e terceirizam muitas pesquisas”, diz Capellari.

Além das empresas, a intenção da Atitus é atender também a pesquisadores que não têm um espaço para desenvolver suas pesquisas.

“Hoje, para o pesquisador que terminou o doutorado e pretende continuar desenvolvendo suas pesquisas, existem alguns caminhos: ou ele tem capital para montar o seu próprio centro ou vai trabalhar em uma empresa como pesquisador ou está fora do jogo. Se ele quer continuar desenvolvendo a pesquisa dele, não existe um espaço disponível”, afirma Capellari.

A instalação desse espaço, que pode ocorrer no fim do ano ou no começo de 2026, ainda está pendente por negociações envolvendo o terreno onde o centro vai operar, segundo o CEO da Atitus.

“O mercado regional, em termos de aquisição de terras, está volátil, porque, como o preço da soja caiu, não há estabilidade no fechamento da negociação. Mas a ideia é que em 60 dias isso se resolva. Fechando negócio, a gente consegue fazer a instalação até o final do ano”, diz Capellari.

Além do centro de desenvolvimento, a Atitus está trabalhando em ações com universidades estrangeiras. O foco no momento são as instituições dos Estados Unidos, como as universidades de Kansas, Illinois, Georgia e Wisconsin. Também está no radar a University of Guelph, do Canadá.

A faculdade já possui termos de cooperação assinados com algumas dessas instituições, como as de Kansas, Illinois e Wisconsin, mas almeja ter “ações concretas” com as universidades estrangeiras.

“Temos que ter um fluxo contínuo de americanos para o Brasil e de brasileiros para os Estados Unidos trocando experiência”, afirma Capellari.

Deniz Anziliero, diretor da Escola de Agronegócios, acrescenta que o motivo de interesse pelas universidades dos Estados Unidos em específico é pela proximidade que têm com o setor no Brasil.

“As universidades americanas espelham o agro brasileiro. Nós somos mais parecidos com o agro americano do que com o europeu”, afirma Anziliero.

Por isso, para consolidar a atuação junto às universidades americanas, a Atitus vai fazer, em agosto, uma “missão empresarial” na Farm Progress Show, a maior feira a céu aberto dos Estados Unidos, realizada no Estado de Illinois.

Lá, a Atitus vai travar conversas com a Universidade de Illinois para possíveis formas de atuação em conjunto no futuro.

O repórter viajou a convite da Atitus Educação.