Prestes a completar 100 anos de existência, que são comemorados no mês que vem, a companhia de silos e soluções para armazenagem Kepler Weber fechou o primeiro trimestre de 2025 com um desempenho enfraquecido pelas condições desfavoráveis vividas no campo ao longo do ano passado pelos produtores rurais, associadas à escalada da taxa Selic e ao crédito mais restrito.

Mas a perspectiva da companhia é de  que o ano do centenário ainda traga crescimento a partir do segundo semestre, já sob influência da safra que está sendo colhida, diversificação de negócios e transações a serem fechadas inclusive no exterior, com destaque para a Argentina.

Entre janeiro a março deste ano, a receita líquida da companhia foi de R$ 357,2 milhões, queda de 6,1% na comparação com o mesmo período de 2024, quando havia obtido R$ 380,3 milhões.

O Ebtida (lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização) recuou 41% nesse período, passando de R$ 90,4 milhões no primeiro trimestre de 2024 para R$ 52,9 milhões agora. A margem Ebtida também retraiu nove pontos percentuais no primeiro trimestre de 2025, saindo de 23,8% para 14,8%.

O lucro líquido caiu 51%, saindo de R$ 52,2 milhões no começo de 2024 para R$ 25,6 milhões no mesmo período deste ano.

Entre os segmentos da companhia, o negócio de Portos e Terminais foi o que teve maior retração de receita, que caiu 77,2%, passando a R$ 10,6 milhões, seguido por Agroindústrias, que recuou 4,9%, chegando a R$ 100,8 milhões e Fazendas, que retraiu 0,2%, passando a R$ 131,7 milhões.

Em contrapartida, o negócio de Reposição e Serviços teve alta de 28,6% em sua receita, que foi de R$ 73,1 milhões, seguido por Negócios Internacionais, cujos ganhos subiram 5,6%, chegando a R$ 41 milhões.

Os números negativos de uma formal estão associados principalmente às dificuldades da safra passada e também a uma base de comparação elevada, explicou Bernardo Nogueira, CEO da Kepler Weber, em entrevista a jornalistas na sede da companhia nesta terça-feira, dia 29 de abril, em São Paulo.

“Quando a gente compara com o primeiro trimestre de 2024, a gente está falando de uma conjuntura macroeconômica com soja nas alturas e os juros um pouco altos. Foi um trimestre abençoado e aí fica uma base de comparação bastante elevada”, afirmou Nogueira.

O resultado do primeiro trimestre de 2025 carregou as adversidades do ano de 2024 pelo caminho, uma combinação de juros mais altos, preços das commodities mais baixos e quebra de safra, segundo Nogueira.

“O Cerrado teve quebra de safra, houve frustração no Mato Grosso, a soja caiu quase 20%, recuando para 24 dólares a saca de de soja, o milho também caiu, e os juros estavam um pouco melhores, na casa de 11%”, afirmou.

Os resultados devem continuar fracos no segundo trimestre de 2025, antecipa Nogueira, antes de passarem por um processo de “inflexão”, com a safra 2024/2025 mais positiva, ainda que a taxa Selic, hoje fixada em 14,25% seja um fator que atenua os ganhos.

“A gente começa a ver uma aceleração. Não vou dizer que é o final de um ciclo negativo, mas a gente enxerga o ano fechando melhor do que no primeiro trimestre”, afirmou.

“Hoje dá pra dizer que vamos ter um terceiro trimestre com muito mais receita em relação ao segundo trimestre desse ano. Há um crescimento sazonal que é apresentado no ano a ano e dá pra sentir que tem uma melhoria gradual de margem”, complementou Renato Arroyo, diretor financeiro e de RI da companhia, que também participou da entrevista com os jornalistas.

Os balanços do segundo semestre devem o impacto, por exemplo, do anúncio de uma operação já fechada envolvendo uma empresa de etanol que ainda será anunciada, segundo Nogueira. “É uma unidade bastante grande de biocombustível”, antecipou, sem dar mais detalhes.

O comando da Kepler também comentou sobre o Plano Safra, que será anunciado pelo governo federal nos próximos meses.

O pacote de linhas financeiras é importante para a Kepler por ter linhas de financiamento de armazenagem que são utilizadas pelos produtores rurais, o Programa para Construção e Ampliação de Armazéns (PCA).

“O que a gente enxerga para esse plano que vai vigorar é que um é plano que provavelmente vai chegar mais dinheiro na ponta, mas com um juro um pouquinho mais caro. O juro que vigora agora está entre 7,5% e 8,5%, e o que se fala é algo ali próximo de 10,5% e vai ter o mesmo diferencial de 3,5%”, disse Renato Arroyo.

O PCA é importante especialmente para a área de fazendas da companhia, representando 35% a 40% do total desse segmento – que, no todo, representa uma fatia entre 13% a 14% do faturamento total da Kepler.

“Há cinco, seis anos atrás, a Kepler era muito mais dependente do Plano Safra do que é hoje, chegando a 50% a 60% [do faturamento total]”, estimou Arroyo.

A companhia aposta também na diversificação de seus negócios como uma forma de garantir receitas e não ficar tão vulnerável ao apetite do produtor em fazer novos investimentos em sua produção.

Na parte de negócios internacionais, por exemplo, a companhia pretende seguir uma trilha de crescimento que já havia experimentado ao longo do ano passado, segundo Nogueira.

"Cresceu em 2024 mais de 70% versus 2024, agora apresentou no primeiro trimestre um crescimento de 5%, mas deve crescer dois dígitos em relação a 2024", afirmou o CEO da Kepler, sem cravar um número exato.

Uma frente importante nesse sentido deve ser a Argentina, segundo o CEO da Kepler Weber, que embarca para o país vizinho em julho, onde vai participar de negociações já em andamento com clientes argentinos.

É uma mudança signficativa para a companhia que, segundo Nogueira, saiu de um faturamento zero na Argentina registrado nos útlimos anos, para R$ 5 milhões no ano passado e, agora, projeta faturar mais de R$ 20 milhões no país somente em 2025.

O crescimento é fruto das mudanças nas políticas econômicas da Argentina, segundo Nogueira, gerando mais estabilidade e a possibilidade de fazer pagamentos para fora do país, que ainda não se cumpriu totalmente.

"A Argentina é um ponto fora da curva no contexto atual porque é um país que ficou anestesiada durante 20 anos, praticamente”, resumiu Nogueira.

Se as projeções da Kepler se confirmarem, a Argentina se tornaria o terceiro maior mercado da companhia, atrás apenas de Brasil e Paraguai.

A Kepler exporta estruturas para um número que varia anualmente entre 15 a 20 países. Fora do Brasil, a companhia tem como clientes especialmente agroindústrias, com ênfase em produtores de arroz, de nações de diferentes continentes como Paquistão, Angola, Ucrânia, El Salvador e Venezuela.

Outra frente importante da Kepler é uma aposta, já anunciada no fim do ano passado, em um fundo de R$ 500 milhões focado em aluguel de armazenagem.

O veículo, sob a gestão da Jubarte Capital, já abriu uma primeira oferta, que se encerra em junho e busca a captação de R$ 250 milhões, por meio de R$ 25 milhões de cotas no valor de R$ 10 cada. O prazo de investimento é de três anos. O coordenador líder da emissão é o banco BTG Pactual.

Até o momento, foram captados cerca de R$ 150 milhões, adiantou Renato Arroyo, diretor financeiro e de RI da companhia.

"Isso tem alto interesse do mercado e estamos conversando com um número entre 7 a 10 clientes que têm interesse real nisso", adiantou Arroyo, diretor financeiro e de RI da companhia.

Arroyo reconheceu que o juro alto pode atrapalhar o interesse no aluguel, mas atentou que o aluguel de armazenagem pode ser uma vantagem. “Acho que é melhor ter armazenagem pagando um aluguel, dado que se tem um juro caro de dívida, do que fazer um investimento cheio”, disse.

Quanto à possibilidade de M&As, Bernardo Nogueira disse que segue com 26 empresas mapeadas para avançar em processos de fusões e aquisições, mas disse que não existe, por ora, um plano mais concreto para tirar isso do papel.

"Não tem uma agenda hoje aprovada no conselho para isso sair de forma muito agressiva. Mas, estrategicamente, sim, a gente gostaria de fazer", afirmou.

Nos últimos anos, a Kepler foi apenas uma vez às compras, em 2023, para adquirir a Procer, empresa de Santa Catarina que faz o monitoramento e gestão de unidades de armazenagem de grãos, dentro de uma estratégia que chama de “monetização dos dados”.

Junto com a apresentação dos resultados do primeiro trimestre de 2025, a companhia divulgou nesta terça-feira que fechou uma parceria com a XP Investimentos, para a oferta de soluções financeiras aos clientes da Procer.

Eles terão acesso a serviços de gestão de risco e caixa, proteção de margens, hedge e investimentos, research, mercado de capitais, câmbio, antecipação de recebíveis, revisão tributária, wealth planning, seguros, entre outras possibilidades.

“Existem ferramentas que a XP oferece de hedging, travando o preço da soja, travando o preço do câmbio, e a gente percebeu a oportunidade de juntar essas forças”, disse Nogueira.

Um piloto com cinco clientes de Criciúma (SC) que faturam até R$ 700 milhões por ano foi bem-sucedido no começo do ano, e agora as duas companhias se sentiram à vontade para fechar de vez a parceria.

“Nosso objetivo é estar próximo dos clientes, temos cobertura regional e um time dedicado exclusivamente para fazer esse trabalho, não só de comerciais que trabalham em conjunto com a Procer mas também tem um time de mesas específicos para poder levar o ganho de eficiência, seja na trava de soja, na trava cambial ou qualquer outro tipo de operação”, afirmou Felipe Campelo, head do Middle Market da XP.

Outros parceiros devem vir no futuro, segundo Nogueira. "Tem outros projetos bastante avançados em que a gente começa a materializar essa monetização de dados. É um universo obviamente novo pra nós, mas bastante estratégico e traz mais resiliência também", afirmou.