Se em 2024 a crise chegou ao agronegócio, com a queda de preços das principais commodities, 2025 será um ano de ajuste, ainda com incertezas. E o mercado, no máximo, andará de lado. A única certeza do vice-presidente de Soluções para Agricultura Brasil da Basf, Marcelo Batistela, é que esse ciclo de baixa vai acabar.

Para mitigar o risco em um cenário de crédito restrito e juros altos, a companhia aumentou a disponibilidade de recursos para dar liquidez ao mercado e, ao mesmo tempo, gerenciar riscos. “Esse é um ponto crucial”, disse o principal executivo da divisão agrícola do grupo alemão no País ao AgFeed em evento realizado, na semana passada, na estação de pesquisa da Basf em Santo Antônio de Posse (SP).

Além do suporte financeiro, Batistela avalia que, como a produção não pode parar, o papel da companhia é prover soluções tecnológicas e manter a proximidade com o agricultor por meio de parcerias.

Na entrevista abaixo, o executivo falou sobre a estratégia silenciosa da Basf para o setor de biológicos, o qual cresce acima do mercado de defensivos. Ele lembra que a empresa não surfou na recente onda de aquisições, mas garantiu que avaliará qualquer negócio que se encaixe ao propósito da companhia.

Confira os principais trechos da conversa:

O cenário para o agronegócio não é muito bom, principalmente por causa da soja. Como a Basf avalia esse ano, o que espera para 2025 e como é que vocês esperam reverter esse quadro?
O primeiro ponto é ter a clareza de que estamos em um negócio que tem ciclicidade. Já entramos num ciclo em 2023 e 2024 bem diferente do que vinha acontecendo nas últimas safras. E também já tínhamos uma clareza de que 2025 ainda será um ano de ajuste.

É um ciclo não tão fácil, que tem bons desafios. E não é uma especificidade do Brasil ou da região. Mas está acontecendo na agricultura e no mundo inteiro. Tem fatores comuns a todos os lugares e tem fatores específicos no Brasil.

O que é específico do Brasil?
Aqui, na nossa realidade, o câmbio é importante. Outro fator é o achatamento de margem do produtor. A questão da disponibilidade de crédito e de liquidez é outro ponto importante. Um último fator é o custo do capital. A agricultura é uma atividade que demanda muito capital. E nós temos hoje um custo que desafia o setor, sem dúvida nenhuma.

E que vai ser maior, porque elevaram a taxa básica de básicos…
Como lidar com isso é o mais importante. Primeiro, ter foco e priorizar para que a gente passe por esse ciclo de baixa, porque a única certeza que eu tenho para te dizer é que vai passar. A questão é como você passa por ele.

Há uma receita para passar por esse ciclo?
Tem três focos claros. O primeiro deles é produzir. Mesmo num ambiente desafiador, um driver tem que ser produtividade. E a produtividade, na agricultura, está intimamente ligada à tecnologia. Nós entendemos o nosso papel, pois somos fundamentalmente uma empresa de tecnologia.

Segundo foco importante são os ganhos de eficiência na cadeia inteira. Em todo momento de muita prosperidade você quer capturar (essa prosperidade) rapidamente e vai gerando ineficiências ao longo do tempo. Então, acho que há uma oportunidade de ganho de eficiência.

Mas apenas por vocês da indústria ou por toda a agricultura?
Por todos. O agricultor precisa buscar eficiência, o sistema de distribuição, a indústria, o trader. Todo mundo vai buscar eficiência porque as margens se achataram na cadeia inteira. A gente está em um negócio de ciclo longo. Então, acho que uma habilidade que tem que ter é o senso de realidade do presente, os pés bem fincados no presente, mas com os olhos muito fixos para o futuro. E o futuro é próximo.

Nós fizemos uma mudança importante nesses últimos dois anos de posicionamento. Isso também mudou a maneira de a gente se organizar e mudou a maneira que a gente interage com o mercado. Que a gente se antecipou um pouco a isso e isso está nos deixando mais equipados nessa situação.

Pode dar um exemplo?
Tem alguns investimentos que a gente não vai abrir mão de fazer. Tanto pelo ponto de vista de tecnologia, que é o óbvio, mas também por coisas que vão além. Alguns exemplos: a gente tem feito parcerias com agentes do setor para estar olhando para a biodiversidade, para práticas agrícolas que vão adicionar ao que já existe.

Nós estamos também fazendo colaborações entre o setor público e o privado para garantir que esse aumento do conhecimento e da eficiência apareça. E o terceiro fator é uma intenção muito clara de seguir investindo forte no Brasil e também de crescer acima do mercado aqui.

O mercado cresce quanto?
É muito difícil dizer nessa volatilidade. Acho que o mercado mudou um pouco, a curva agora vinha de crescimentos muito grandes. Não acreditamos em crescimentos grandes. Acreditamos que o mercado pode crescer um pouco, andar um pouco de lado. E a gente vai crescer um pouco mais do que o mercado.

E quanto a Basf vai crescer?
A gente não fala em números especificamente de um país, mas eu posso te dizer que, relativizando isso, a gente quer crescer mais do que o mercado. É relativo, é verdade, porque tem muitos fatores acontecendo. Estamos no final de um ano fiscal, mas estamos no começo do nosso ciclo de negócios. Como eu gosto de dizer, tem muita água pra passar debaixo da ponte e todo desafio vem grampeado com oportunidade. Vai depender muito da habilidade de minimizar esses desafios e capturar as oportunidades.

Um setor que cresce mais do que esse mercado de defensivos é o de biológicos e a Basf ainda não está muito presente. O que vocês pretendem nesse mercado?
Primeiro, a Basf está, e não é há pouco tempo, no negócio de biológicos. É que a gente não fez, nessa onda de aquisições, nenhum movimento. Não fez por enquanto.

A Basf tem planos de fazer, ou não?
Primeiro, o negócio de biológicos não é um negócio ausente na Basf. Segundo, a gente acredita que é um negócio que vai seguir crescendo e é importante, porque a combinação de tecnologias é o nome do jogo. Eu acredito que nenhuma tecnologia isolada vai resolver e que vai continuar crescendo esse balanço entre as diferentes tecnologias. A gente não só acredita nisso como começou a investir nisso há muitos anos.

Acho que nós fomos, da empresa de produção de cultivo, a primeira a fazer aquisição. E não é insignificante o nosso negócio de biológicos no portfólio da Basf no mundo e no Brasil. É verdade que a gente, aqui no Brasil, não participou de nenhum movimento nesses últimos meses, que teve bastante aquisições.

Aparentemente, a consolidação ainda não acabou…
A gente acha que esse é um negócio que deve continuar se consolidando, um negócio que ainda tem muito a ganhar maturidade. E a gente está sempre observando o mercado. Temos clareza de propósito grande e, se tiver “fit” com a nossa estratégia e que isso adicione valor para o nosso cliente, a gente vai avaliar.

Recentemente houve um movimento bem grande de problemas no setor de distribuição de insumos e o temor é que haja uma contaminação para outros. Como é que vocês avaliam isso? É temeroso para vocês que são fornecedores ou é um problema pontual?
O nosso negócio é altamente demandado financeiramente e isso não muda, ao contrário, se intensifica. Então, disponibilidade de crédito e custo de capital têm que estar dentro da equação o tempo inteiro. Esses desencontros entre a capacidade de seguir com o negócio e o risco na cadeia financeira estão trazendo, sim, dois efeitos claros.

Quais são eles?
O primeiro é que diminuiu a liquidez do mercado, o apetite em tomar risco e dar crédito, e aumentou o custo do crédito. É uma crise que nasceu de baixo para cima. Menos liquidez para o produtor por conta da menor demanda e maior oferta contaminou a segunda parte da cadeia, o insumo.

E pode chegar a vocês nas indústrias?
A nossa cadeia é muito interligada. Então, eu não diria que nem foi só por causa do preço de commodities, mas é uma combinação de fatores. Foram safras desafiadoras pelo ponto de vista agronômico e climático. Regiões do Brasil ficaram três safras colhendo aquém do necessário. Além disso, você tem uma queda do preço e aumento do custo do capital.

Aí você tem em todos os elos da cadeia, desde o produtor, na distribuição, na indústria, no trader, melhor ou pior posicionados e você tem efeitos diferentes no mesmo elo da cadeia.

Tem agricultores, distribuidores e indústrias que vão se beneficiar de uma situação dessas, porque estão muito mais preparados para isso. É evidente que é uma situação que demanda cuidado.

E como a Basf se preparou para isso?
A primeira forma é entender que a gente precisa, por um lado, mitigar risco e, por outro, ajudar nessa situação de disponibilizar recursos para o mercado. Então, uma coisa é que a gente aumentou muito as nossas operações, seja financeira, seja de commodities. Um percentual importante do nosso negócio tem um papel importante de ajudar a dar liquidez para o mercado, de dar crédito, mas, ao mesmo tempo, gerir o risco. Através de barter, através de parcerias com o mercado financeiro. Esse é um ponto crucial.

O outro ponto é ajudar a produzir. Porque, se não tiver produção, toda essa equação desmonta no primeiro momento. Então, acho que a segunda coisa que a gente está fazendo é conscientizar o mercado, o parceiro, o cliente, de que não podemos brincar com produção. Precisamos produzir. E aí a gente tem tecnologia, conhecimento. E a terceira coisa, para mim, é a proximidade. É um momento ainda mais importante de estar próximo do cliente, próximo do parceiro e próximo do mercado, para que a gente, junto, consiga conduzir isso.