Dezembro tem tudo para ser particularmente agitado para Gustavo Herrmann e Danilo Pedrazzoli, os homens que dividem o comando da operação da multinacional holandesa Koppert no Brasil.

Além dos desafios naturais do fim de ano e de um momento particularmente complexo pelo cenário da agricultura nacional, na agenda de ambos o mês está marcado como aquele em que eles devem começar a receber as primeiras propostas não vinculantes de investidores interessados em aportar recursos na subsidiária brasileira da fabricante de insumos biológicos.

“Esperamos pelas cartinhas do Papai Noel”, brinca Herrmann, em entrevista ao AgFeed. Na conversa, ele traz detalhes da transformação que a companhia começou a realizar em 2025 para acomodar a entrada de um novo sócio-investidor, que aportaria um montante estimado em 100 milhões de euros (cerca de R$ 620 milhões, no câmbio atual) na operação brasileira da Koppert.

A busca por esse investidor começou em agosto, quando a companhia entregou ao Itaú BBA um mandato com esse objetivo. Desde então, segundo Herrmann, o cronograma tem sido seguido à risca.

Nos meses seguintes, o banco selecionou um grupo de cerca de 20 potenciais investidores, que, a partir da assinatura de termos de confidencialidade, receberam os prospectos com as informações preliminares sobre a Koppert e seus planos – inclusive um pacote de dados que permitem fazer uma primeira avaliação financeira do valor do negócio.

Por esse mesmo cronograma, chegou o momento de entender o interesse desses investidores, o que deve ocorrer entre dezembro e janeiro. A partir de então, as conversas devem afunilar, ficando focadas em um número estimado entre três e cinco propostas.

“Então, a gente vai discutir com cada um, de forma mais detalhada. Aí cabe a nós escolhermos a melhor combinação entre valuation e perfil do sócio”, afirma Herrmann. “Passando essa fase, ou seja, escolhendo com quem a gente vai casar, tem o período de due diligence e contratos”.

O casamento, pelo menos na cabeça da noiva Koppert, tem prazo para acontecer. Gustavo Herrmann espera concluir o processo até julho de 2026.

Independente do desfecho, porém, a jornada iniciada em agosto passado já representa a maior transformação da história da Koppert no Brasil, desde que os holandeses desembarcaram por aqui, em 2010, depois de uma provocação de Hermann e Pedrazzoli, sócios minoritários na operação.

Em boa parte desses 15 anos, os euros da matriz sustentaram os investimentos que permitiram a expansão da marca e seu posicionamento como uma das líderes do mercado nacional de bioinsumos.

Em janeiro de 2024, em entrevista ao AgFeed, os irmãos René e Martin Koppert, netos do fundador Jan Koppert e na época, respectivamente, CEO e CBO (Chief Business Officer) da empresa familiar, chegaram a anunciar apoio financeiro a mais uma rodada de expansão da subsidiária.

Pelo pano de negócios da época, seriam R$ 700 milhões para a construção de três novas plantas, todas na região de Piracicaba, que já concentra a sede e as unidades de produção da empresa no Brasil.

Passados quase dois anos, o quadro é bem diferente. “A gente vem executando pela metade o business plan que a gente fez para cinco anos”, reconhece o executivo.

As prometidas fábricas, vistas como estratégicas para o futuro da empresa no País, ainda não saíram do papel, fruto de uma conjunção de fatores que reúne desaceleração e queda das vendas no Brasil e vendas mais fracas também na Europa e nos Estados Unidos.

“Faltou funding”, resume Herrmann. “A gente não conseguiu recursos suficientes para tudo que a gente gostaria de ter feito para atender a demanda de mercado”.

E, sem o capital barato vindo da matriz, foi preciso buscar opções “criativas”, segundo define.

“A ideia desse projeto de ter um investidor local entrando na Koppert do Brasil é justamente a gente poder desmamar da Holanda depois de 15 anos e ter uma autossuficiência de investimento e financiamento da operação brasileira”, diz.

Pressões do mercado

O prazo estabelecido para a conclusão do processo de captação com a entrada de um novo sócio não é aleatório. Segundo Herrmann, ele atende à necessidade da empresa de recuperar o tempo perdido e se preparar para atender a uma demanda projetada por novos produtos em um futuro breve.

Ele tem na ponta da língua o que deve ser feito: “Nós precisamos fazer expansão da fábrica de fungos, precisamos fazer uma nova fábrica de produtos à base de bactérias. Agora tem a tecnologia nova dos nematóides e dos entomopatogênicos, que é um produto que a gente traz da Holanda. Mas fica muito caro para trazer, então também seria interessante internalizar essa produção”.

A estratégia é não depender mais de importação, que envolve incertezas cambiais e de produção em outras regiões, que nem sempre se adequam à demanda local. O executivo lembra do período da pandemia, em que a possibilidade de fabricar no Brasil garantiu à Koppert obter um crescimento acima do mercado e ganhar participação em alguns mercados.

Há dois anos, quando os sócios majoritários concordaram com o plano de expansão, uma contagem regressiva foi disparada e, hoje, sem que ele tenha avançado, o tempo ficou mais curto.

Nas projeções da Koppert, a empresa tem até 2028 para colocar no mercado novas linhas de produtos que a permitirão manter uma posição de liderança no mercado de biológicos.

“Uma fábrica demora dois anos, no mínimo, para ficar operacional. Então, a gente começou a ficar muito atrasado e começou a descasar essa questão de ter a capacidade de investimento e suplantar o mercado”, analisa.

“Chegamos no limite de, se não começar agora, não dar mais. Vamos ficar sem produto ou teremos que comprar produtos de terceiros”.

Essa opção, segundo ele, não está em cogitação na empresa, tradicionalmente detentora das tecnologias que produz e comercializa.

Além de atrasar o cronograma do plano de investimentos, a limitação no fluxo de recursos da matriz tem potencial para emperrar o fluxo de vendas da subsidiária, já que o crédito oferecido pela indústria é essencial no mercado de insumos.

“Você planeja uma coisa e não consegue necessariamente executar, porque, principalmente na nossa indústria de crop protection, tem que dar prazo. Se você não der prazo, você está fora do mercado”, diz.

Nesse sentido, Herrmann trabalha com um cenário de sinais trocados. Ao mesmo tempo em que diz ter a necessidade de investir para atender a demanda do mercado, essa demanda deixou de crescer no ritmo de anos atrás.

A limitação de crédito, ele reconhece, limita o crescimento do setor como um todo. Acostumada a uma média histórica de crescimento de 40% ao ano, segundo Herrmann, em 2024 a empresa viu as vendas sofrerem leve recuo. E, mais que isso, suas margens praticamente zerarem.

“A gente não teve a capacidade de resposta na operação de diminuir os custos conforme o mercado caiu”, admite.

“Foi muito difícil para todos, mas para nós especificamente porque o mercado deteriorou muito em termos de preço. Isso serviu de lição para a gente reforçar nosso posicionamento de liderança, de que temos que entregar custo-benefício para o produtor, não necessariamente igualar o preço com os biológicos mais commoditizados do mercado”.

Herrmann vê, no entanto, uma inflexão nas curvas do mercado, que, na sua observação, já começam a apontar para cima. Para a Koppert Brasil, diz, 2025 já apresenta uma recuperação, com crescimento na casa dos 10% em receita e uma reversão de Ebitda da ordem de R$ 50 milhões.

“Mesmo no ano difícil a gente vê um crescimento satisfatório e uma recomposição de margem, por reforçar nossa posição de ter produto diferenciado na ponta”, diz.

“Estamos olhando muito para a última linha. Não só o crescimento, mas em voltar a ser uma empresa positiva justamente para enfrentar esse desafio com capacidade financeira e também para dar um conforto maior para o investidor que vai entrar”.

O desenho da nova Koppert

A preocupação em criar uma imagem e um ambiente mais atrativos ao futuro sócio aparece em vários momentos ao longo da conversa com Herrmann.

Ele desenha cenários de substituição de moléculas químicas por biológicos como uma curva não para de crescer “independentemente da crise de crédito e de distribuição”, como parte do discurso para justificar a demanda projetada e a necessidade de expansão fabril.

“Talvez a gente não consiga atender, ou talvez ela não venha na mesma proporção que a gente imaginou nesses dois anos, mas uma hora essa questão do crédito vai ter que se resolver”, diz.

“A gente tem que continuar projetando esse crescimento. Quando a gente olha no longo prazo, a gente não pode se dar o luxo de esperar a demanda voltar para investir, porque aí você perde”.

Ele cita um exemplo prático que demonstra suas teses de substituição de químicos por biológicos e de oportunidades perdidas por não ter podido atender à demanda do mercado.

A empresa comercializa atualmente um nematoide benéfico que substitui o tiametoxan, inseticida usado no controle de pragas primárias da cana-de-açúcar.

“Estou represando o crescimento do biológico por ter que trazer esse produto da Holanda, que não tem a capacidade de nos atender”, diz.

A nova Koppert Brasil, modelada por Herrmann e Pedrazzoli e já pactuada com os sócios holandeses, espera ter um nível de independência suficiente para não depender de resultados – “às vezes vais ser pouco, às vezes muito” – ou da capacidade de produção da matriz.

A autonomia viria não apenas no planejamento, mas na capacidade de financiar sua execução, recorrendo a instrumentos locais de crédito, seja uma linha do BNDES, seja um crédito em um banco comercial, seja um CRA, exemplifica.

A entrada do investidor, nesse momento, daria o impulso, relevante, para essa nova etapa da companhia. Esse ingresso seria feito via uma operação de equity, com a compra de participação hoje pertencente à família Koppert ou de novas ações emitidas para esse fim.

“A ideia é que seja um investidor minoritário para que a gente possa, lá na frente ou recomprar isso ou ir para um IPO, por exemplo, caso esse investidor queira sair com a sua remuneração e a gente virar uma empresa listada”, afirma. “Vamos pegar uma espécie de empréstimo-ponte até um IPO futuro”.

Na primeira seleção de potenciais candidatos, a preferência foi dada a investidores financeiros, e não estratégicos. “Vai ser um processo competitivo, dentro de um número limitado de casas que o Itaú BBA traz para a mesa”, explica.

Os novos sócios que teriam acesso a uma participação relevante, mas preservando a condição majoritária dos holandeses. “Estamos falando, de repente, de uma relação 70-30”, afirma Herrmann. “Isso vai depender do quanto a gente conseguir de valuation, da proposta desses investidores para entrar na empresa”.

Em uma eventual emissão de novas ações, situação que ele considera a mais provável – “e um negócio que mais atrai o investidor” –, os dois sócios brasileiros aceitariam ver sua participação minoritária diluída.

“Acho até que para o investidor local é importante a gente ser sócio, estamos desde o primeiro dia da operação. Então também não faria sentido a gente sair, porque ia dar uma certa insegurança para quem está entrando”.

Com o olhar sempre no futuro sócio, os atuais parceiros agilizam também uma reestruturação na governança da companhia, um processo já iniciado e que deve ser acelerado em 2026.

Hoje diretores da operação brasileira, os dois brasileiros passam a co-CEOs na nova estrutura corporativa. Abaixo deles, a reorganização criará uma camada de executivos com estatura de C-Level. Nesse movimento, podem ser contratados executivos de mercado ou promovidos quadros que atualmente atuam em nível de gerência na empresa, respondendo diretamente a Herrman, na área comercial, e Pedrazzoli, na industrial.

Os sócios brasileiros e holandeses também integrarão um conselho de administração, que será constituído ao longo dos próximos meses, já reservando espaço a ser ocupado pelo futuro investidor e também uma cadeira para um conselheiro independente.

“Estamos exatamente nessa fase, com a ideia de fazer um espelho da nova governança da Holanda”, revela Herrmann. Ele se refere à mudança que vem sendo feita na matriz desde o final de 2023, quando a gestora HAL Investments fez um aporte de 140 milhões de euros (o equivalente, na época, a R$ 750 milhões) no grupo e passou a integrar o table cap.

Até então, o grupo familiar não tinha esse tipo de estrutura e as decisões eram tomadas de forma direta pelo sócios. Por demanda dos investidores, foi instituído um conselho de administração e um executive board.

“Agora, pela primeira vez em 58 anos, eles vão contratar um CEO de mercado”, diz o executivo, referindo-se à Koppert global.

Entre a KBV (sigla usada internamente para denominar a matriz) e a KBR (a filial) já foram acertados parâmetro que devem guiar essa governança e o nível de autonomia da subsidiária, indicando até onde os executivos locais poderão tomar decisões sem consultar os holandeses.

Assim, segundo Herrmann, a operação cotidiana deve ser totalmente autônoma, “inclusive na busca por funding, que é vital para os negócios de insumos no Brasil”. Mas a Holanda precisará aprovar aquisições, vendas e investimentos que superem um determinado valor, estabelecido entre eles.

De volta ao jogo do mercado

Herrmann está otimista com a evolução da jornada de busca de um novo sócio. “Pelo que a gente conhece de alguns perfis de investidores locais, tem muita gente olhando esse negócio de biológicos”, afirma.

Segundo ele, já existe hoje um entendimento maior, mesmo entre gente do mercado financeiro, das dinâmicas, especificidades e potenciais do setor de bioinsumos, o que torna mais fácil encontrar alguém que se sinta confortável em assumir o papel de minoritário do negócio, sem a pretensão de sentar à mesa no dia a dia da operação.

“A gente quer uma fatia do bolo, não apenas dos biológicos, mas do mercado de crop protection, que movimenta US$ 15 bilhões no Brasil. Então, quando a pessoa entende isso, vê que, por mais que você tenha todos os soluços normais da agricultura, no longo prazo tende a crescer”.

Uma injeção de capital novo é fundamental para que isso aconteça, repete ele. Inclusive para voltar ao jogo como um agente consolidador do mercado.

“Lá atrás a gente fez, em 10 anos que nós tivemos a matriz com boa capacidade financeira, porque a gente não era tão grande, nós fizemos seis aquisições no Brasil”, lembra. “Ou seja, a gente não só cresceu organicamente, mas quando o mercado virava para baixo, a gente olhava empresas para comprar para você continuar consolidando e crescendo”.

Nos últimos três anos, entretanto, a Koppert avaliou muitos negócios mas não assinou nenhum cheque para adquirir outro negócio, enquanto outros players, inclusive globais, se movimentavam e ganhavam músculos por aqui – o exemplo mais claro é o da belga Biobest, que em setembro de 2023 pagou R$ 2,8 bilhões ao Aqua Capital para ficar com o controle da Biotrop.

“A gente poderia estar muito acima do que nós estamos hoje”, afirma Herrmann. “Até olhamos algumas oportunidades de mercado, mas na hora de entrar no processo, falamos: ‘Espera aí, tem que ter funding. Se não tiver, melhor nem entrar’”.

O discurso, mais uma vez, se volta à busca de capital. “Consolidador é uma coisa que o investidor gosta”, diz. “Se você já tem a tecnologia, já tem o mercado, consolidar por aquisição é um negócio que acelera o crescimento”.

Herrmann imagina uma situação hipotética para os próximos anos em que, após a captação dos recursos destinados à expansão, possa buscar linhas de investimento em um banco como o BNDES, que ajude a financiar parte dessa conta e libere capital para aquisições. “Isso é muito importante para a gente também”.

O executivo recorda de embates que teve com a matriz em busca de obter o dinheiro necessário para se manter na dianteira do setor.

“Tivemos muito problema com a matriz quando a gente cresceu muito, porque a gente precisou de mais capital para crescer”, conta. “Não que a gente teve essa limitação, mas incomodava lá. E eu lutava com isso, questionava: ‘Mas você não quer crescer?’”

A questão, segundo ele, é que a a Koppert Brasil ficou “grande demais para o holandês” e, com o crédito mais restrito e caro também na esfera global, ficou pesado para uma companhia com receitas totais na casa de 500 milhoes de euros (cerca de R$ 3,2 bilhões) bancar um investimento de um quinto desse valor em uma das subsidiárias.

Herrmann diz que a Koppert Brasil chegou à “fase do terceiro salto”. O primeiro em 2012, foi compra da Itaforte, que instituiu as bases da operação da marca no País. O segundo, em 2018, veio com outra aquisição, a da Bug Agentes Biológicos, que marcou a entrada da empresa no mercado de defensivos para a cana.

Agora, para o terceiro, depende de a subsidiária realmente ter a capacidade financeira de investir e continuar consolidando o mercado, andando com as próprias pernas. “E para isso não tem fórmula mágica, precisa de capital novo. A gente tem que correr atrás aqui”.

Resumo

  • Koppert Brasil procura sócio minoritário para investir cerca de R$ 620 milhões e destravar seu plano de expansão fabril e tecnológica
  • Processo conduzido pelo Itaú BBA deve afunilar propostas entre dezembro e janeiro, com conclusão prevista até julho de 2026
  • Meta é reduzir dependência da matriz, ampliar produção local, fortalecer governança e retomar aquisições no mercado de bioinsumos

Gustavo Herrmann e Danilo Pedrazzoli, diretores da Koppert Brasil