Ribeirão Preto - Um agricultor que produz algodão sequeiro consegue uma margem de R$ 3 mil por hectare, lucro que sobe para R$ 14 mil por hectare com irrigação. O caso é real e foi relatado pelo presidente da Valley e da Câmara Setorial dos Equipamentos de Irrigação (CSEI) da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), Cristiano Del Nero.
Essa diferença de 367% chega a ser um gargalo para o avanço da indústria de irrigação no País. “Me tira o sono quando a pessoa não acredita e fala ‘é bom demais para ser verdade’. Há um sentimento de que está sendo enganada”, disse Del Nero ao AgFeed durante a Agrishow, em Ribeirão Preto.
Com tanta vantagem, o perfil do cliente da companhia de origem estadunidense com mais de 70 anos e unidade fabril em Uberaba (MG) é peculiar. Apenas 30% do faturamento da Valley são de linhas de financiamento. “O agricultor pede prazo, mas paga em cash”, resumiu o executivo. É comum, segundo ele, a amortização total do equipamento só com o lucro obtido após a primeira safra irrigada.
O setor cresce 5% ao ano em média e vive ciclos de estabilidade e baixa na esteira das crises agropecuárias como a do ano passado. “Estamos em patamares de 15% a 20% acima do platô de 2017 a 2019, ou seja, é um mercado com crescimento constante no geral”, explicou Del Nero
O último pico do mercado foi entre 2021 e 2022, na retomada do mercado represado pela crise global da Covid-19. À época, o prazo de entrega, de 60 dias a 90 dias, saltou para até 10 meses. Produtos como bombas para captação e pneus de irrigação sumiram do mercado e deixaram os fornecedores do setor à deriva.
A Valley precisou importar produtos de suas outras unidades, atendeu a demanda e chegou a um faturamento recorde em 2023. No ano passado, houve uma queda de 15% na receita da companhia, parte dela por causa da crise dos grãos.
Este ano, a estimativa é de alta de 5% no faturamento, segundo Del Nero. Para ter a empresa mais preparada para suprir a demanda, a Valley anunciou recentemente investimento de R$ 30 milhões em suas operações em Uberaba, aporte que eleva o total investido na região para R$ 130 milhões nos últimos anos.
De acordo com o presidente da companhia, a área útil da unidade cresceu 40%, o que permite triplicar a operação no futuro. O volume produzido é calculado por “lances”, cada um com 50 metros de extensão nos pivôs. A capacidade de produção na unidade vai crescer dos atuais 1.400 lances por mês para 2 mil lances mensais.
“Vamos ampliar a nacionalização da produção que importamos para ficarmos menos expostos”, afirmou Del Nero. Tudo isso, dentro de um mercado mais maduro e com nichos de crescimento bem claros.
Além de regiões produtoras de algodão - o Oeste da Bahia, por exemplo, foi a única região que teve crescimento de mercado no Brasil em 2024 - a Valley aposta na retomada da soja e do milho e até em lavouras incomuns. Entre os exemplos, Del Nero cita os cultivos de trigo na Bahia e o de gergelim no Maranhão.
Mas a maior aposta são as lavouras de cana. O setor era responsável por 5% do faturamento da Valley, saltou para 8% no ano passado e deve passar para entre 13% e 15%. “O pessoal da usina acordou para a irrigação”, afirmou o presidente da Valley.
Entre os lançamentos apresentados pela empresa estão tubos revestidos com um polímero capaz de suportar a corrosão da vinhaça e para a aplicação por meio de pivôs.
O subproduto do processamento da cana é utilizado como fertilizante nas lavouras da cultura e a aplicação é normalmente feita por tubos plásticos em carretéis, o que limita a produtividade das operações.
Agrishow
No estande da companhia na Agrishow, outras soluções estão disponíveis. Entre elas, painéis solares, estações meteorológicas e unidades de conectividade por satélite, todas integradas ao equipamento de irrigação.
Dona da Solbras, empresa de energia solar adquirida em 2020, a Valley aposta no crescimento das vendas casadas entre equipamentos de irrigação e usinas solares.
Muitas propriedades têm demanda contratada fixa e necessitam de energia extra para a produção e irrigação. Por isso, recorrem às usinas solares, ou mesmo em operações híbridas com geradores a diesel ou baterias carregadas pelos próprios painéis.
“As vendas casadas ainda não estão maduras. Mas tem muitos ‘early adopters’ (primeiros compradores) que já começam direto com pivôs e painéis solares”, disse.
Como menos de 10% da área agricultável do Brasil é irrigada, e apenas 2,5% por meio de pivôs, Del Nero vê o mercado nacional como maduro. Mas, para o executivo, há espaço para crescer.
“Com aumento no custo da produção e das terras, o produtor busca cada vez mais verticalizar sua produção e o investimento em irrigação é mais barato do que comprar terra”, concluiu.