Luís Eduardo Magalhães (BA) - Em muitos lugares do Brasil em que o agronegócio é forte, os assuntos principais são as cotações de grãos e o clima. No oeste da Bahia, os produtores rurais e os empresários repetem bastante outra expressão: “mão-de-obra”.

Principal economia da região, o município de Luís Eduardo Magalhães é exemplo disso. A cidade abriga pouco menos de 110 mil habitantes, mas é o sétimo maior Produto Interno Bruto (PIB) da Bahia, segundo levantamento feito pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgado no final de 2023, com dados de 2021.

Toda esta força vem do agronegócio. A cidade, fundada em 2000, responde por cerca de 11% de toda a produção de soja brasileira, além de ser um polo muito relevante nas produções de algodão e milho.

Com esse rápido crescimento, LEM, como é conhecida, começa a sofrer com a escassez de trabalhadores, segundo os produtores e empresários da região. O tema dominou boa parte das conversas durante a Bahia Farm Show, maior evento de tecnologia para o agronegócio do Nordeste.

Ali, em uma reunião com diretores da Associação de Agricultores e Irrigantes da Bahia (Aiba), Davi Schmidt, sócio da Schmidt Agrícola, empresa familiar que produz soja, milho e algodão, além de banana e cacau”, classificou o tema como o mais relevante para o agronegócio da região neste momento.

“Nós praticamente não temos desemprego. Em Barreiras, fica na casa dos 3%, 4%. Nós estamos crescendo e com problemas para encontrar pessoas para ocupar as vagas que surgem”, disse Schmidt, pré-candidato à prefeitura da cidade vizinha e que deu origem a LEM.

O problema é mais urgente na produção de algodão, segundo disse ao AgFeed o presidente da Associação dos Agricultores e Irrigantes da Bahia (Aiba), Odacil Ranzi. “É a cultura que mais gera empregos, e que mais precisa de gente. Para cada emprego gerado pela cultura da soja, o algodão gera cinco vagas”.

Há um consenso na região de que é difícil encontrar uma solução rápida para esse problema. Não há dados claros sobre o número de trabalhadores necessários para suprir as necessidades dos municípios, mas o poder público e até mesmo os produtores têm tomado iniciativas para garantir a sustentabilidade do crescimento de LEM e Barreiras no médio e longo prazo.

Uma delas é da Associação Baiana dos Produtores de Algodão (Abapa). O presidente Luiz Carlos Bergamaschi confirma que a mão-de-obra é hoje a maior preocupação dos produtores do oeste baiano. Um problema atual, mas que já era percebido há algum tempo.

“Nós montamos um centro de treinamento que formou mais de 80 mil pessoas nos últimos 10 anos, porque precisamos principalmente formar profissionais qualificados”, diz Bergamaschi.

Esse ponto também foi levantado por Schmidt durante a reunião na feira. “A automação está cada vez maior. E precisamos de gente que saiba operar as máquinas que hoje vêm com uma alta tecnologia já instalada de fábrica”.

Feira mostra região ainda em expansão

A Bahia Farm Show de 2024 foi uma amostra de como, mesmo com o agronegócio como um todo passando por um momento mais desafiador, a região continua em crescimento.

Segundo o balanço divulgado nesta segunda-feira, 17 de junho, pela organização do evento, foram quase R$ 11 bilhões em negócios gerados na Bahia Farm Show 2024, um volume quase 33% maior que em 2023.

Em público, o crescimento foi próximo de 10%, com pouco mais de 111 mil visitantes na edição deste ano.

A organização da feira destaca, nesse crescimento, os segmentos de revendas de máquinas agrícolas, concessionárias de veículos, equipamentos para irrigação e estruturas para armazenagem.

“Tivemos um início de safra instável, por causa do El Niño, mas com conhecimento e tecnologia, os produtores conseguiram vencer a etapa do plantio e manter as produtividades em alta no oeste da Bahia e na área do Matopiba”, diz Odacil Ranzi, ao comentar os resultados.

O município é um dos principais produtores de soja da Bahia. Segundo dados da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), o estado deve fechar a safra 2023/2024 com quase 7,5 milhões de toneladas produzidas.

Mas a maior relevância de LEM e de toda a região oeste para o agronegócio baiano está no algodão, já que responde por 98% do total da produção, que deve fechar em mais de 660 mil toneladas de plumas.

A renda per capita de LEM, segundo dados do IBGE, chega a quase R$ 80 mil anuais - ou mais de R$ 6,6 mil mensais, mais do triplo da média nacional, que fica em R$ 1,8 mil, segundo o IBGE.

Barreiras, por sua vez, tem 157 mil habitantes e é a 11ª no ranking dos PIBs entre as cidades baianas.

O empresário Adailton Moreira de Souza, que atua com serviços de tecnologia em Barreiras, afirma que essa prosperidade econômica faz a região ser reconhecida como a maior compradora de caminhonetes do Brasil.

A relevância da região para a indústria automotiva é perceptível até mesmo na Bahia Farm Show. Boa parte dos espaços mais nobres da feira, aqueles mais próximos da entrada dos visitantes, foi ocupada por concessionárias de diversas montadoras.

“Foi um crescimento muito rápido, e que levou até mesmo à formação de um polo universitário, porque era muito comum os filhos dos produtores e dos empresários irem estudar em Salvador e até em outros estados”, conta Souza.

Novos caminhos

Hoje, a Uninassau tem um importante campus em Barreiras, em que o carro-chefe é o curso de Medicina. Mas para o agronegócio, a iniciativa educacional mais relevante vem da Universidade Federal do Oeste da Bahia (Ufob).

O reitor Jacques Miranda conta ao AgFeed que a universidade montou, em 2014, o curso de Engenharia de Biotecnologia. “A primeira turma começou em 2015, e faz poucos anos que tivemos os primeiros formados, pois se trata de um curso novo e bem difícil”.

O reitor da Ufob diz que o curso surgiu de uma demanda das empresas e dos produtores rurais, muitos com produção de insumos biológicos dentro das fazendas.

“A demanda por esse tipo de profissional é tão grande que antes mesmo de formados já tínhamos alguns contratados pelas empresas ou pelas fazendas”, diz.

Outro objetivo da formação do bacharelado em Engenharia de Biotecnologia é a saída projetada por Miranda não só para atrair mais pessoas para Barreiras e LEM, mas também para qualificar os trabalhadores.

“Eu acredito que o próximo passo de LEM e de todo o oeste baiano é o da agroindústria. Inclusive como uma forma de diminuir as desigualdades sociais que ainda existem na região”.

Distantes cerca de 90 quilômetros, Barreiras e LEM têm suas histórias interligadas desde o início, já que a segunda nasceu de um distrito da primeira, chamado de Mimoso do Oeste – quando promovido município, ganhou o nome do filho do histórico governador e senador baiano Antônio Carlos Magalhães, que faleceu em 1998 e já atuava como o grande herdeiro da força política do pai.

A desigualdade social citada por Miranda é exposta em alguns locais inclusive na cidade de Barreiras. Segundo Adailton Souza, em alguns condomínios de luxo, os apartamentos chegam a valer cerca de R$ 7 milhões.

Em alguns pontos de Barreiras, é possível observar o contraste de prédios novos, que abrigam inclusive resorts, com imóveis muito mais modestos e antigos. A dona de um pequeno hotel localizado na parte central da cidade mostra que, da entrada, é possível visualizar a fachada do Beethoven Home Resort, condomínio vertical de luxo da cidade.

“Claro que agora, estamos passando por uma fase de ajuste. A cidade cresceu muito rápido, foi fundada só no ano 2000. Então passou também por um ciclo de especulação imobiliária”, conta.

Mesmo neste cenário, o dado mais recente do IBGE indica que o Índice de Desenvolvimento Humano de LEM é um dos melhores da Bahia, chegando a 0,716, de acordo com o Censo 2022. Quanto mais perto de 1, melhor o indicador.