Quando o assunto é a tempestade perfeita que deu um grande susto no agro nos últimos anos, a abordagem é sempre de cautela.
Os registros de aumento de pedidos de recuperações judiciais, somados às quebras de safra de alguns produtores por conta de problemas climáticos, pesaram não só nas contas e no bolso dos próprios produtores, mas também nos milhares de investidores do agro.
Como resultado, Fiagros viram suas cotações cair e o crédito na praça secou. Na contramão desse momento desafiador, a Strategi Capital, uma gestora focada em ativos com problemas, ou “distressed”, viu oportunidade para crescer.
De um ano e meio para cá, justamente quando o cenário do agro ficou mais complexo, os ativos do setor passaram a ganhar mais espaço no fundo da gestora, segundo disse ao AgFeed o sócio-fundador, Cristian Lara.
Executivo com experiência de mais de 20 anos no mercado financeiro e que já foi diretor no Credit Suisse e passou pelo Deutsche Bank, JP Morgan e BTG Pactual, Lara admite que o agro “não é o setor que a casa prefere investir”.
Mas, atualmente, dos cerca de R$ 100 milhões em ativos do fundo, aproximadamente 25% são originados no agro. Há cerca de um ano, eram apenas 10%, mas a onda de RJs e a alta da inadimplência causada pelas safras difíceis por conta do clima e baixa no preço dos grãos abriram novas porteiras para a gestora.
E esses 25% de agro podem aumentar no fundo, segundo Lara, conforme novas captações ocorrerem. “Tem muito mais por vir”, ele conta, dizendo que existe um delay entre uma RJ ou inadimplência acontecer e a reestruturação.
De olho nessas novas oportunidades, ele afirmou que a Strategi já prepara terreno para iniciar a captação de um segundo fundo, que também deve incluir agro no escopo.
Segundo ele, o novo fundo deve ter um tamanho entre R$ 250 milhões e R$ 350 milhões e deve começar a captar recursos no final do ano.
“Nosso core business é comprar ação judicial ou um crédito de um ambiente de RJ de um produtor e trazer para o fundo. A partir daí, faço o trabalho de recuperação do ativo”, resume.
Todos os recursos captados pela gestora estão alocados nesse fundo, que é do tipo FIDC NP (Fundo de Direitos Creditórios Não-Padronizados). A tese é investir no mercado das “special situations”.
Nesse universo, a gestora foca em ativos de empresas que enfrentam dificuldades financeiras, chamados de “distressed”e Non Performing Loans (NPL), que representa empréstimos bancários que não foram pagos.
O portfólio agro envolve produtores médios e agroindústrias pequenas ou médias distribuídos em cerca de sete operações. “A situação típica envolve uma hipoteca de fazenda ou um produtor rural que tem um certo patrimônio e com isso acreditamos que existe capacidade para reesturutração”, afirmou.
Além do setor, a empresa atua com ativos do mercado imobiliário e de indústrias como a farmacêutica.
"Fazer o Pará caber no Rio"
Os investidores do fundo são os considerados profissionais, ou seja, aqueles que possuem mais de R$ 10 milhões em investimentos financeiros. Nessa lista, estão, segundo o executivo, assets sofisticadas, fundos multimercados e single & multi family offices, além da própria Strategi.
O fundo fechado nasceu com R$ 75 milhões há dois anos e já contou com alguns desinvestimentos, o que possibilitou alguns retornos para os investidores.
“Fizemos uma amortização de 7% do capital em fevereiro deste ano e agora podemos amortizar mais 10%. Isso permite crescer de forma consistente e contínua, formatando o portfólio conforme surgem oportunidades”, disse Cristian Lara.
A Strategi trabalha com um retorno mínimo atrelado ao IPCA + 6% para remuneração dos acionistas.
Sem citar nomes de empresas envolvidas, o sócio-fundador conta que atualmente a Strategi é credora parceira de algumas RJs ou de companhias que estão perto de entrar em recuperação. No agro, são pequenos e médios produtores, principalmente de soja nos estados do Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Bahia.
“São geralmente dívidas que grandes bancos concedem para empresas do setor agro. Nossa atuação hoje está muito pautada em buscar salvar essas empresas do agro que passam por uma necessidade de se reestruturar”.
Além disso, a gestora também compra e encarteira em seu fundo CRAs inadimplentes ou vencidos, desde que as partes estejam em processo de reestruturação.
“Podemos comprar e reestruturar ou em alguns casos compramos o ativo judicial”, diz Lara. O método vai depender da segurança jurídica e da oportunidade posta.
A Strategi faz toda avaliação de risco dentro de casa e com apoio de alguns parceiros de confiança. Ele afirma que a gestora tem sido muito procurada para ajudar processos do tipo no setor e fora dele. Mas, na maioria dos casos, afirma, a conta não fecha ou os desafios para reestruturar o ativo são muito complexos.
“Reestruturação é isso: ‘fazer o Pará caber no Rio de Janeiro’. Nós olhamos o ativo e o passivo, pois em muitos casos o ativo precisa de alguma solução para gerar caixa”, conta.
Segundo Lara, um dos diferenciais desse processo de avaliação do risco de crédito é se apoiar em parceiros, como advogados, que atuam na região em que o ativo está.
“Podemos correr riscos de mercado, mas nunca de diligência mal feita. Não vamos comprar uma fazenda com problema de documentação ou que está numa área de fronteira, pois se eu precisar executar, não vou conseguir”, conta.
Até pouco tempo, a Strategi não era uma gestora. Lara explica que a companhia buscava oportunidades para originar ativos com problemas, estruturá-los e oferecer para um comprador, como um escritório de family office, por exemplo.
“Fizemos mais de R$ 1 bilhão de ativos nesses anos, incluindo algumas operações no mercado agro”. Com uma relação bem estabelecida entre players de diversos setores, há alguns anos a firma passou a atuar como gestora.