Depois da tempestade vem a bonança? Para as gestoras que atuam com o agro no mercado de capitais não tem sido bem assim. Após a perspectiva de aquecimento nas emissões de títulos de crédito ligados ao setor no segundo semestre deste ano, o caso AgroGalaxy jogou um balde de água fria nas expectativas.
Além disso, o humor ficou mais azedo com a interrupção da trajetória de queda de juros pelo Banco Central.
Mesmo assim, algumas gestoras e casas de investimento têm colocado uma lupa em oportunidades para novas emissões. A paulista RB Investimentos, por exemplo, prepara a emissão de R$ 200 milhões em CRAs até o final do ano.
Segundo Ralph Annicchino, sócio da área de capitais da empresa, as operações envolvem um produtor que atua na pessoa física, outro produtor pessoa jurídica que presta serviços a usinas, a distribuição de um Fiagro e um CRA para uma usina.
“Estamos em execução. Não paramos pelo primeiro semestre desafiador e continuamos buscando oportunidades, com algumas já em fase de distribuição”.
Até hoje a RB já emitiu cerca de R$ 500 milhões em CRAs, numa estratégia que até então era mais focada em agroindústrias.
Dentre as emissões, a empresa estruturou um CRA de R$ 30 milhões para a Dengo, de chocolates, uma emissão de um CRI de R$ 60 milhões para a Ultra Cheese, plataforma de lácteos do Aqua Capital que fatura R$ 1 bi por ano, e um CRA de R$ 100 milhões para o Burger King.
Com atuação relevante também no mercado imobiliário, a RB Investimentos possui R$ 3 bilhões sob custódia e um histórico de R$ 25 bilhões de distribuição em crédito estruturado dentro de casa.
Além disso, a companhia ainda ajudou na estruturação e distribuição de uma série de certificados voltados para distribuidores de combustíveis e empresas de bioenergia.
A RB atuou ainda como coordenador e distribuidor do Fiagro da Sparta, que é listado na B3 e possui um patrimônio líquido de R$ 240 milhões.
“Continuamos com o mesmo foco, estruturando vários CRAs nesse momento. Mesmo com o setor passando por desafios de reestruturação, que não é nenhuma catástrofe, os produtores estão empenhados nas novas safras, buscando alternativas de crédito e financiamento”, afirmou Annicchino.
Essa nova estratégia da RB, de atingir a ponta produtiva ao invés de somente agroindústrias, também passa por uma regulamentação que o mercado tem passado.
Em fevereiro, o Conselho Monetário Nacional (CMN), fixou novas regras para emissões de títulos de investimento, tanto do agronegócio quanto do imobiliário. Segundo a nova norma, os CRAS, as LCAs e, por consequência os Fiagros, terão de mudar seus contornos nos próximos contratos.
Na prática, o órgão federal delimitou que os papéis não podem mais ser lastreados em títulos de dívida, como debêntures, emitidos por companhias não relacionadas ao setor agrícola.
A justificativa do governo é que a medida foi tomada para combater um "desvio de finalidade" dos CRAS. Por consequência, a ideia é garantir que o certificado seja utilizado apenas por empresas ligadas ao agro de forma mais direta.
A regulamentação dividiu o mercado e o caso do CRA do Burger King, estruturado pela RB, usado como exemplo de operações que não poderiam mais ocorrer.
Em uma entrevista dada ao AgFeed na época, José Alves, sócio da VBSO Advogados e professor do IBDA (Instituto Brasileiro de Direito no Agronegócio), afirmou que a cadeia agro como um todo sai prejudicada com as mudanças.
Ele explicou que o Burger King não tem uma atividade fim no agro e sim vender hambúrguer. Acontece que o produto é oriundo da carne bovina, que por sua vez, é agro.
"A empresa de fora do mundo agro toma uma dívida usada como lastro do CRA para incentivo fiscal, uma dívida mais barata para financiar a cadeia. Antes, a cadeia era irrigada com recursos mais baratos e isso não poderá ser feito", disse na ocasião.
Segundo Ralph Annicchino, da RB, a mudança de regulamentação, no caso da corretora, trouxe oportunidades na ponta tomadora do recurso – no caso do agro, produtor ou empresa agrícola de pequeno porte.
“Antes dessas alterações, o mercado focava em grandes empresas em cada mercado. Falava-se de AgroGalaxy e não no fornecedor delas. Ao mesmo tempo, existem produtores rurais fortemente capazes de honrar pagamentos e fornecer garantias suficientes para o investidor”, disse o sócio.
Esse pequeno tormento no mercado também muda, segundo Annicchino, a relação com os investidores e as taxas de retorno desses produtos.
Segundo ele, o investidor que compra CRAs ou Fiagros fica mais receoso, mas não deixa de olhar oportunidades. Essa percepção de risco mais alto no setor acaba elevando as taxas de retorno, ele explica.
“O investidor vai precificar, fazer análise de risco da carteira, que em muitas vezes vai pagar um percentual a mais pelo custo do capital investido”.
Na RB, os produtos estruturados são distribuídos dentro de uma base de clientes profissionais e qualificados, além de family offices.
“Estamos nos posicionando cada vez mais como uma casa de renda fixa perante os clientes e ao mercado. Originando, estruturando e distribuindo, sejam CRAs, CRIs ou fundos, que são universos que se correlacionam”, afirmou.
A RB Capital nasceu em 2008 pela cisão da Rio Bravo Investimentos. Em 2021, vendeu sua securitizadora para private equity americano Jaguar Growth Partners e agora passou por mais um spin-off.
A empresa agora é dividida em duas: a RB Asset e a RB Investimentos. O spin-off das estruturas ocorreu após a saída, em março deste ano, do grupo japonês Orix, que tem cerca de US$ 400 bilhões globalmente e detinha 64% da RB Capital.
Os sócios fundadores, que sempre estiveram no controle do negócio, mesmo como minoritários, e outros executivos recompraram a sua participação. Os valores não foram revelados.
O movimento serviu para fazer uma separação societária da holding, algo que, segundo os sócios, já existia do ponto de vista operacional.