Uma rápida consulta aos dados sobre Fiagros na B3 chama a atenção para uma sigla: FZDA11. O código identifica o fundo Fazenda Xingu Fiagro FII, que começou a ser negociado em setembro passado pela gestora 051 Capital.
Ele se destaca por aparecer no topo das listas das maiores valorizações nos últimos meses. Lançado a R$ 104,03 por cota, atingiu sua máxima histórica em 30 de junho passado, quando bateu os R$ 165. Atualmente, o valor unitário é de R$ 154.
Com isso, são quase 60% de apreciação em dez meses. Na performance mensal de junho, segundo a B3, 28,9% positivo – o segundo da lista (PLCA11) teve 5,18% de valorização no mês.
A fotografia reflete um momento, mas pouco revela do que está por trás da sigla. Nisso, também, o FZDA11 se diferencia. Entre os mais de 30 Fiagros listados na B3 atualmente, é o primeiro a investir exclusivamente na aquisição de terras agrícolas.
Não é mais o único porque a própria 051 Capital lançou recentemente outros dois, o FZDB11 e o FLEM11. No total, a gestora captou mais de R$ 800 milhões para os três. Através deles, adquiriu 24,3 mil hectares produtivos, hoje avaliados em R$ 1,54 bilhão.
“Nossa visão é a de que o mercado de terras agrícolas no Brasil não está devidamente representado no mercado de capitais”, afirma Bernardo Arruda Reis, head da área de agronegócio na 051.
“A gente estima que o valor de mercado desses imóveis hoje esteja entre R$ 4 trilhões e R$ 8 trilhões, mas é irrelevante a sua presença em fundos ou mesmo como parte de empresas agrícolas listadas”, diz.
Ex-sócio e diretor da agtech mineira Prodap – adequirida no ano passado pela dsm-firmenich --, Reis atua há mais de 20 anos no setor. Em 2020, foi convidado por Luciano Brochmann, CEO e fundador da 051, para encontrar uma alternativa para investimentos da gestora no agronegócio.
A 051 Capital nasceu como um family office para gerir os recursos de Brochmann, ex-sócio da XP e integrante de uma família que já atuava no setor, com produção de soja, eucalipto e pecuária em fazendas no Mato Grosso do Sul, Paraguai e Uruguai.
Aos poucos, Brochmann atraiu outras famílias para a gestora, que acabou se tornando um multi-familly office. Hoje são 16, com ativos que somam R$ 3,5 bilhões sob gestão.
Muito desse recurso estava alocado em ativos imobiliários urbanos – sobretudo lajes corporativas nos grandes centros – quando veio a pandemia e passou a haver um nível maior de vacância nos edifícios voltados a escritporios.
Foi então que surgiu a tese de buscar imóveis rurais e Reis foi incorporado ao time da 051. Com um mandado de R$ 150 milhões nas mãos, ele foi literalmente a campo.
Em pouco mais de um ano, quase 110 fazendas foram avaliadas. A intenção inicial era investir em propriedades com pastagens degradadas e convertâ-las para produção agrícola, obtendo ganhos com a valorização imobiliária.
Logo ficou claro, segundo Reis, que o potencial não era tão promissor, sobretudo porque essas áreas, geralmente localizadas em fronteiras agrícolas de Tocantins, Sul do Pará ou Maranhão, costumavam carregar passivos ambientais.
Um ajuste na estratégia, então, lvou a 051 a focar em terras agrícolas consolidadas, com zero passivo. E, sobretudo, em que fosse possível fazer a aquisição com desconto, de alguém que estivesse precisando vender.
Não foi tarefa fácil em anos de prosperidade para o agronegócio, com commodities valorizadas trazendo bons resultados para os produtores rurais.
Outro desafio do mandato era encontrar propriedades que pudessem ser arrendadas com um retorno de 6% ao ano, tendo como base a cotação da soja a R$ 150 reais – contratos de arrendamento costumam ser feitos com base entre 3,5% a 4,5%.
Apesar da dificuldade, Reis conseguiu identificar uma propriedade com cerca de 9 mil hectares produtivos em Balsas (MA), no final de 2021, a Fazenda Xingu.
Durante o perído de procura, a regulamentação dos Fiagros foi concluída, permitindo que a 051 usasse esse modelo para o fundo.
A compra da Xingu foi finalizada em maio de 2022, por R$ 151 milhões. Em abril de 20230, uma avaliação realizada por empresa terceira atualizou o valor para R$ 371 milhões, uma valorização de 144%.
“Hoje vários fundos trazem as terras como garantias, mas são Fiagros de crédito”, afirma Reis. “Os nossos captam recursos financeiros, compram a terra e a colocam dentro do fundo. O cotista desfruta da receita do arrendamento e da valorização imobiliária do ativo ao longo do tempo”
Os fundos da 051 são voltados para investidores profissionais, com liquidez mínima de R$ 10 milhões. No primeiro momento, foram 50 cotistas. Hoje, depois de negociações feitas em mercado secundário, são mais de 200, a maioria de fora do grupo de famílias da 051.
A fórmula foi repetida nos dois novos fundos fechados este ano. Com os recursos, foram adquiridas duas propriedades na região de Luis Eduardo Magalhães, no Oeste da Bahia. Ambas têm área produtiva próxima dos 9 mil hectares – uma delas tem cerca de 4 mil hectares irrigados.
“Já vínhamos com outras terras no pipeline e conseguimos originar bons negócios”, afirma o gestor. As captações foram de R$ 296 milhões e R$ 350 milhões.
A 051 fechou contratos de arrendamento de todas as propriedades com a SLC, principal operadora agrícola do País, até 2036. Para Reis, isso ajuda a dar segurança ao investidor, além de garantir que a propriedade vai receber bons tratos culturais, o que gera valorização futura do ativo.
Áreas de reserva são desconsideradas nas avaliações da gestora para as aquisições, já que ela considera que ainda são incipientes as formas de obter rentabilidade.
Mais duas fazendas já estão sendo negociadas pela empresa, podendo dar origem a um quarto fundo – ou até mesmo um quinto.
Reis afirma que já há negociações avançadas para aquisições. Em um prazo de 30 a 40 dias espera poder ter valores fechados, inciando um processo de due dilligence, realizado pelo escritório de advocacia paulista VBSO.
“Os investidores âncora já estão mapeados e mandatados, para dar segurança na evolução”, diz Reis. Segundo ele, esses investidores asseguiram cerca de 35% do valor necessário, estimado em R$ 300 milhões. A própria 051 entra com algo em torno de 10%.
O restante seria captado com o lançamento, até o fim do ano, de mais um ou dois Fiagros. Caso seja dividido, cada um deles teria patrimônio líquido inicial de R$ 150 milhões.
“Imaginamos um potencial muito grande de crescimento do mercado de fundos imobiliários de terras agrícolas como uma alternativa para pessoas físicas”, afirma reis.
“Para famílias com R$ 1 milhão de liquidez, alocar de 10% a 15% em terra é uma boa reserva de valor em algo que tem potencial de valorização grande nos próximos 30 anos”.
Se é praticamente inviável para um investidor isolado adquirir propriedades com valores tão altos, diz, veículos como os da 051, no mercado secundário, permitem que muitos CPFs participem com cotas.
Reis afirma que um dos principais gargalos desse mercado ainda é a educação dobre o agro. Hoje, diz, não é difícil explicar a tese da 051 para quem é do setor, que entende o desconto na compra e vislumbra a oportunidade.
“Já o investidor urbano não consegue perceber essa assimetria de preço na compra da terra. No varejo, costuma olhar para o retorno do negócio, sem familiaridade com a valorização patrimonial”.
É aí, de acordo com Reis, que estão o maior potencial de ganhos e o ponto de atenção da 051. O pulo do gato está em definir o momento certo para a venda da propriedade. Para isso, é preciso entender as nuances do agronegócio.