Após um ano recheado de extremos climáticos por todo o Brasil, com enchentes no Rio Grande do Sul e secas nas regiões Centro-Oeste e Sudeste, a seguradora espanhola Mapfre, um dos principais nomes do seguro rural no Brasil, está se preparando para entrar no mercado de seguros paramétricos a partir do ano que vem.

A ideia da companhia é estudar modelos e formas de atuação a partir do começo de 2025 e chegar a um projeto-piloto definitivo já no fim do primeiro semestre do ano que vem, segundo antecipou Fabio Damasceno, diretor técnico de Seguro Rural da Mapfre, ao AgFeed.

"O que a gente está vendo agora é modelagem: o que pode ser segurado? Quais são os parâmetros? Quais são as correlações?", afirma Damasceno.

As incertezas da própria seguradora refletem o estágio inicial do seguro paramétrico no Brasil, que, apesar de incipiente, apresenta potencial de aplicação não só na agricultura, mas também em outros setores da economia como construção civil e varejo.

“O seguro paramétrico ainda tem mais perguntas do que respostas, no meu ponto de vista, mas como a Mapfre é uma das líderes de mercado, a gente não pode ficar sem discutir esse tema”, diz Damasceno.

Menos conhecido e utilizado que o seguro rural, essa modalidade trabalha com séries históricas de métricas, índices e parâmetros para aferir, caso a caso, os impactos de extremos climáticos nas apólices.

O modelo tem diferenças em relação ao seguro rural, o tipo de proteção mais usado hoje no campo.

Enquanto que, no caso dos seguros rurais tradicionais a precificação é feita com base em dados climáticos de uma região ou até de um estado, o paramétrico utiliza ferramentas digitais e de inteligência artificial para trabalhar com dados de cada propriedade ou mesmo de uma área específica que o produtor pretende cobrir.

Já para o pagamento da indenização, o modelo tradicional demanda a aferição dos prejuízos no campo, enquanto o seguro paramétrico trabalha com índices climáticos como níveis de chuva, temperatura e velocidade do vento.

Se chover muito em uma região, por exemplo, e os parâmetros de chuva para o período e para aquela localidade forem atingidos – conforme contrato prévio entre seguradora e segurado – a indenização sai de imediato, sem a necessidade de aferir a perda real.

A Mapfre ainda quer estruturar o modelo de negócio, que poderá contar com a parceria de startups. "A gente tem conversado com algumas delas e é interessante, porque nenhuma delas entrega o pacote completo, mas todas têm coisas interessantes", afirma Damasceno.

"Provavelmente a gente deve trazer algo como uma plataforma, um tipo de desenvolvimento mais aberto. Então, crio o produto e, a depender da cultura ou da solução, eu posso trabalhar com diversos parceiros", acrescenta o executivo.

Nos próximos meses, a Mapfre quer resolver várias dúvidas, que vão da formatação do produto em si à forma de apresentar essa modalidade, praticamente desconhecida, ao produtor.

A correlação entre os parâmetros fixos usados como a quantidade de chuva, por exemplo, e as perdas reais sofridas pelo produtor é um desafio importante a ser superado, na avaliação de Damasceno.

"Imagine explicar para o produtor que ele está contratando um seguro paramétrico que, durante um período específico, irá indenizá-lo caso chova menos de 100 milímetros. Para cada milímetro abaixo dessa média, ele receberia um valor. O problema é que, se chover exatamente 100 milímetros, o seguro não será acionado, mesmo que o produtor tenha sofrido perdas significativas", afirma o executivo.

Neste ano, a Mapfre registrou uma queda de quase 30% na quantidade de prêmios de seguro agrícola devido às condições de mercado, segundo Damasceno.

“A Mapfre trabalhou quase que sozinha em 2022 e 2023. Já em 2024, o cenário mudou, com menor demanda do seguro agrícola e aumento da competitividade, inclusive com entrada e retomada de players que estavam meio adormecidos”, afirma.

A seguradora projeta que a quantidade de prêmios do seguro agrícola volte a crescer no ano que vem, mas essa retomada não dependerá dos resultados obtidos com o projeto de seguro paramétrico, segundo Damasceno.

"Será muito mais um piloto para 2025 do que uma estratégia de crescimento para o seguro agrícola", afirma.

Assim como a Mapfre, outros grupos estão testando o modelo. Em reportagem recente, o AgFeed mostrou que uma das maiores empresas agrícolas do País, a SLC, está rodando um teste com o seguro paramétrico em propriedade da companhia no Oeste da Bahia.

Segundo Frederico Logemann, head de Inovação do grupo, até agora a companhia nunca havia contratado seguros rurais, mas decidiu avaliar a precificação desse modelo na região em que registra importantes instabilidades climáticas.

“Nesse momento o pessoal está fazendo as simulações, os cálculos, pegando um pouco das nossas estatísticas, do histórico, para talvez, junto com alguma seguradora, precificar um seguro para a SLC, para uma fazenda em específico”, afirmou Logemann no final de novembro.

Um dos setores pioneiros no uso dos seguros paramétricos foi o sucroenergético. A Colombo Agroindústria, tradicional produtora de açúcar e álcool no interior de São Paulo, foi a pioneira na contratação de apólices dessa modalidade, no que foi seguida por outros produtores de cana–de-açúcar.

Mais recentemente, o paramétrico passou a ser contratado também por agricultores para as culturas de soja e milho, além de pecuaristas.

O AgFeed mostrou, também em novembro passado, o caso da Fazenda Manacá, uma das mais tradicionais criadoras de gado Angus do Brasil, que contratou um seguro paramétrico para cobrir eventuais prejuízos em sua lavoura de milho destinada à produção de silagem para os animais.

A carteira de seguro rural da Mapfre está concentrada principalmente na região Sul do Brasil, com 58,9% de exposição, seguido por Sudeste (26,4%), Centro-Oeste (10%), Norte e Nordeste (4,7%). A ideia é aumentar a presença no Centro-Oeste nos próximos anos.

Para o ano que vem, a seguradora planeja também melhorar a experiência de contratação digital, tornando o processo mais rápido e mais integrado, com novos portais que serão entregues a partir do primeiro trimestre de 2025.

“Hoje, a contratação de seguro de um trator demora alguns minutos. A gente quer trocar isso para alguns segundos, para o cliente ter um preço, uma jornada sem sustos. Ainda há muita dúvida na hora da contratação”, afirma Damasceno.