No oceano dos Fiagros, o mar agitado não está para sardinhas. O mercado dos fundos agro se prepara para um 2025 marcado por desafios macroeconômicos e novas adaptações regulatórias e, com isso, o olhar das gestoras devem se voltar mais para os tubarões, grandes investidores com estruturas profissionais.

Além da alta da Selic, que tira o apetite para investidores em títulos que não sejam de renda fixa e de pouco risco, a queda generalizada das cotações dos fundos listados ainda deixa um ponto de atenção no mercado.

Assim, segundo especialistas ouvidos pelo AgFeed nas últimas semanasm, a aposta para este ano estará em estratégias voltadas mais para investidores institucionais do que pessoas físicas. Por outro lado, a nova regulamentação proposta pela CVM para o sgmento também pode mexer no jogo e, quem sabe, dar um aquecimento ao mercado.

Conforme o AgFeed apurou, as gestoras deverão apostar em arranjos estruturados, combinando crédito, garantias robustas e maior fidelização entre indústrias e distribuidores.

Bruce Phillips, head de agro da Fator, por exemplo, acredita que o mercado de Fiagros será composto por “arranjos criativos” em 2025. Com o investidor pessoa física deixando de destinar recursos a fundos do agro listados na Bolsa, dado o cenário de baixa que eles enfrentam, ele concorda que o foco pode estar em investidores profissionais.

“O mercado agro nunca foi para amadores, ainda mais agora com muitas RJs, preço de commodities em queda e revendas estocadas”, afirma.

“O setor passou por um ‘Eldorado’, e teve muita entrada de investidores pessoa física. Entendemos que, pelo menos nos próximos dois anos, isso não deve se repetir, principalmente com juros altos. Mesmo com a Selic caindo para um patamar entre 9% e 10%, a pessoa física não volta tão rápido para lá”, acrescenta.

Phillips vê a gestora focada em fundos exclusivos de crédito para o agro, como antecipação de recebíveis ou desconto de duplicatas para revendas, sementeiras e produtores rurais.

Segundo ele, a Fator distribui essas cotas para investidores institucionais, em tesourarias de banco e family offices. “Temos pouca penetração nos investidores pessoa física”.

A Fator possui um Fiagro listado e distribuído na Bolsa, com R$ 100 milhões de patrimônio, que deve ficar do mesmo tamanho em 2025. “Não enxergamos nenhum crescimento para ele no ano que vem por conta da situação econômica do País. Está difícil captar na PF em estruturas que não são de renda fixa hoje”, afirmou Phillips.

No começo de dezembro passado, o banco estruturou um FIDC que busca captar R$ 500 milhões com a Ponto Rural, distribuidora de insumos paranaense. A ideia é captar com fornecedores da empresa, como Corteva, Ourofino e Cibra. Num primeiro tranche, a Ponto Rural já captou mais de R$ 90 milhões.

“Trouxemos os maiores fornecedores desta revenda e conseguimos convencê-los a investir numa cota mezanino. Na contrapartida, essas indústrias possuem um compromisso com a Ponto Rural de vender um percentual a mais do que ela investiu em produtos. É uma forma da indústria fidelizar mais a revenda e ter o compromisso comercial de que vão vender mais que no ano passado”, explica Phillips.

Nesse momento, a Fator está captando um novo fundo voltado para o setor agropecuário, estruturado no formato multi-excedente e multi-sacado, que permite diversificar os recebíveis entre diferentes indústrias do agro e seus clientes.

A operação conta ainda, segundo Phillips, com uma apólice de seguro de crédito emitida por uma grande seguradora, cobrindo o risco de inadimplência e oferecendo aos investidores uma alternativa com menor exposição ao risco. Já foram captados R$ 20 milhões e a alocação prevista é de R$ 100 milhões.

Case de sucesso

Luiz Cláudio Caffagni, especialista em crédito, gestão de risco, derivativos e seguros no agronegócio, ressalta que mesmo diante de um ano difícil em 2024, os Fiagros são um “case de sucesso”.

“Hoje os Fiagros estão com mais de R$ 40 bilhões em patrimônio líquido. Os fundos imobiliários demoraram 10 anos para chegar nesse patamar”, ressalta.

Considerando números de 2024 até outubro, o maior crescimento foi justamente dos Fiagros do tipo FIDC, que permitem essa antecipação de recebíveis numa estrutura.

De janeiro até o décimo mês do ano -assado, esse tipo de Fiagro avançou seu patrimônio líquido em 53% e atingiram R$ 5,8 bilhões, segundo dados da Anbima compilados por Caffagni a pedido do AgFeed.

Por segmento, os Fiagros do tipo FII, que compram CRAs, ainda são maioria e contam com um PL de R$ 18 bilhões. Esse tipo de fundo, contudo, cresceu 6% durante o ano.

“Acho que o Fiagro do tipo FIDC é o que vai começar a crescer cada vez mais. Se o Fiagro-FII compra CRA e os CRAs estão restritos, abre espaço para uma estrutura de crédito que é feita em conjunto, por exemplo, com uma revenda”, diz o especialista.

Segundo Caffagni, o mercado de Fiagros pode até crescer em 2025, mas não “será um estouro”.

Na visão de Priscilene Nunes, analista de Fiagros da Ticker Research e Benndorf Research, 2025 deverá mesmo ser um ano difícil para novas emissões na área. “Ninguém vai querer aportar num setor que mostra RJs”, acredita.

Ela tem visto que os investidores pessoa física estão passando por um momento de deixar o setor de lado, muito por conta da queda em uníssono dos Fiagros listados na B3 em 2024.

“Podemos ver um movimento de dinheiro trocando de mãos, com investidores qualificados aportando”, diz.

Ela acredita que a nova regulamentação proposta pela CVM pode, contudo, ajudar o mercado. A possibilidade de diversificação de carteira dos fundos, principalmente com a inclusão de operações de CPRs físicas, pode eliminar taxas e melhorar a gestão dos fundos, segundo Nunes.

“Praticamente todos os Fiagros da Bolsa negociam com deságio e acredito que não vão alcançar o preço justo no curto prazo, com a possibilidade de novas RJs ainda no horizonte. Por outro lado, pode ser um momento pro investidor tomar posição em bons fundos, diversificados e que não tiveram problema de crédito”, avalia Priscilene Nunes.

Já Brunna Viana, head de Agro no AndBank, acredita que, apesar das dificuldades, as emissões vão continuar aquecidas na medida em que investidores buscam diversificar portfólio em buscas de investimentos com isenções fiscais, como é o caso dos Fiagros.

Para isso, ela vê que bancos e gestoras que distribuem Fiagros para clientes terão um papel importante em explicar mais sobre o setor e mostrar que existe joio e existe trigo. “É um setor que cresce muito, com muita participação no PIB, não tem como dar errado. Claro, com uma observação de qual empresa está sendo investida”.

Viana vê que os principais desafios estão na aceitação do cliente, que além do desconhecimento do setor, pode apostar erroneamente em retornos muito rapidamente.

Com a nova regulamentação na mesa, os novos arranjos podem, segundo a head de agro do AndBank, voltar a atrair o interesse dos investidores.

“A união desses arranjos, que vão desde ser sócio de uma empresa, comprar terras e esperar valorização e até investir em crédito, pode tornar ainda mais atrativos os investimentos no agro. A regulamentação torna tudo mais claro e confortável para o investidor”, afirma.