Com o crédito agrícola seletivo e caro - mas com demanda por parte do setor -, a gestora paulistana GCB trilha um caminho por estradas vicinais.
Diferente das emissões tradicionais de CRAs, estruturadas sob a norma 160 da CVM, típica de grandes empresas e volumes de recursos elevados, a gestora aposta em uma outra legislação, a norma 88.
Regulada pela mesma norma que rege o crowdfunding de investimentos, a CVM 88 permite ofertas menores, com menos custo e menos burocracia do que a 160. Na prática, viabiliza operações que não caberiam no modelo tradicional e abre espaço para que empresas médias acessem o mercado de capitais.
Ao AgFeed, Victor Moura, diretor de DCM (Debt Capitak Markets) da GCB, citou que a casa é a mais atuante na norma em todo mercado. Com 16 anos de vida, a gestora criada por Gustavo Blasco já concedeu mais de R$ 3 bilhões em crédito e administra R$ 2,5 bilhões em ativos sob custódia.
Com uma longa estrada no crédito imobiliário, a empresa passou a olhar para o agro no último ano, e já soma três CRAs emitidos, somando algo em torno de R$ 50 milhões.
A mais recente operação nesse portfólio é o CRA de R$ 30 milhões do grupo Avanço Agropecuária, que cultiva soja e milho e mantém uma operação de pecuária em Mato Grosso e no Matopiba. O crédito foi estruturado para alongar passivos e financiar a safra de uma companhia que dobrou de tamanho nos últimos anos e já opera mais de 10 mil hectares.
A emissão, com remuneração de CDI + 6,00% ao ano, marca um passo importante na estratégia que a GCB promete escalar: alcançar R$ 500 milhões em CRAs emitidos nos próximos anos, sempre com tíquetes menores e voltados a empresas que historicamente ficavam fora do mercado de capitais.
Victor Moura cita que a norma 88 cumpre um papel que a 160 não consegue: permitir que operações de R$ 10 milhões a R$ 40 milhões se tornem viáveis.
“Quando você faz uma operação para a CVM 88, os custos fixos e variáveis caem. A burocracia é menor, e isso abre espaço para empresas que jamais conseguiriam acessar o mercado pela 160”, disse ao AgFeed.
O CRA da Avanço é o mais recente e de maior volume da casa dentre as três emissões. As outras duas envolvem a captação de R$ 11 milhões para a Sojal, revenda que atua em Paragominas (PA), e outro de R$ 2,7 milhões para o grupo agrícola Rio Bonito, de Avaré (SP).
Victor Daher, sócio-diretor da Avanço Agropecuária, cita que antes de conhecer a proposta da GCB, captava via instituições financeiras tradicionais, como Banco do Brasil, Banco do Nordeste, Itaú e Rabobank.
Segundo ele, o crédito nessas instituições tem se tornado cada vez mais burocrático, com exigências de garantias cada vez maiores.
“Começou a apertar o cenário. Conversamos com vários parceiros e decidimos partir para o mercado de capitais. Emitimos esse CRA e devemos fazer novas operações no futuro. Chega um determinado momento que o bancão não atende mais”, disse, se referindo ao crescimento do grupo nos últimos anos, que passou de 5 mil hectares para 10 mil hectares de plantio nesta safra.
Nesse tamanho, a Avanço deixou de ser um pequeno produtor, mas ainda está longe das dimensões dos grandes grupos agrícolas do País. “Captamos para reperfilar o perfil da dívida, alongar, e outra parte para custear a safra”, acrescentou.
Daher cita que a margem da temporada deve ser mais apertada, com preço da soja deprimido e custos aumentando. Otimista com o preço da soja nos próximos anos - não no curto prazo -, cita que o produtor tem que trabalhar custos, eficiência e “baixar o perfil da dívida”.
Hoje, além dos 10 mil hectares de plantio, conta com 2 mil cabeças de gado numa integração lavoura-pecuária (ILP). Os animais ocupam uma área plantada com brachiaria depois da colheita da soja, fazendo uma espécie de “safrinha de boi”, onde os dejetos dos bovinos servem de adubo para o cultivo seguinte da oleaginosa.
Nas fazendas, Daher cita que o plantio já está finalizado no Mato Grosso, e no Maranhão, o plantio está em 20% nesta semana. As chuvas estão normais, segundo ele. “Vai ser uma safra dentro da normalidade”, projeta.
No ano passado, quando plantou 9,7 mil hectares, a produtividade média da soja ficou na casa das 55 sacas por hectare, impactadas por um período um pouco mais seco nas propriedades do Nordeste. Nesta safra, a expectativa é de 65 sacas por hectare.
Segundo Victor Moura, da GCB, a gestora pretende atingir R$ 1 bilhão em operações estruturadas nos próximos dois anos. Além dos R$ 500 milhões dos CRAs, a ideia é ter um montante equivalente nos CRIs. Hoje, nos títulos imobiliários já são R$ 250 milhões estruturados.
Ele cita que vê essa divisão equilibrada entre o imobiliário e o agro porque considera os setores “mais robustos para crédito estruturado”, tanto pela previsibilidade quanto pela segurança das garantias.
“É um caminho sem volta. O produtor médio vai migrar cada vez mais para o mercado de capitais, porque o Plano Safra não atende o volume de expansão que eles precisam”, afirma Daher.
Resumo
- Gestora GCB já emitiu três CRAs somando cerca de R$ 50 milhões e projeta chegar a R$ 500 milhões nos próximos anos
- Operação mais recente é o CRA de R$ 30 milhões da Avanço Agropecuária, do Maranhão, com CDI+6%, para alongar dívida e financiar a safra
- GCB aposta na CVM 88 para viabilizar tíquetes de R$ 10 milhões a R$ 40 milhões, alcançando produtores médios que enfrentam crédito bancário mais caro e burocrático