A bolsa brasileira encerra a semana em um patamar nunca visto antes. Em níveis recordes, o índice Ibovespa (Ibov) avançou pouco mais de 1% desde o começo do ano, e atingiu os 135.608 pontos ao final do pregão desta sexta-feira, 23 de agosto. Há poucos dias, atingiu sua máxima histórica, e ultrapassou os 136 mil pontos.
O ambiente mais positivo para o mercado de ações tem ajuda considerável do agronegócio. Considerando as 84 ações que compõem o Ibov, três entre as cinco com o melhor desempenho no acumulado de 2024 são de empresas de proteína animal.
BRF, JBS e Marfrig perdem apenas para a Embraer, que lidera as altas do índice. “Vemos um cenário muito positivo para a proteína animal. O mercado norte-americano está com uma oferta muito baixa. Há uma substituição de carne bovina por frango e carne suína. O consumo dessas carnes lá fora está muito bom, com grande avanço das exportações”, explica o head da Ativa Research, Pedro Serra, em entrevista ao AgFeed.
Tal cenário leva a BRF a exibir salto de 88% no ano até o pregão de 21 de agosto, enquanto a JBS dispara quase 55% e a Marfrig avança 53%, segundo levantamento realizado por Einar Rivero, da Elos Ayta Consultoria, para o AgFeed.
Serra destaca que o desempenho da BRF, o segundo melhor do Ibovespa no ano, vai de encontro com o atual cenário para a carne de frango e pela dinâmica do consumidor brasileiro.
“A BRF se aproveita do cenário favorável para frango e para processados. Como os produtos ficam mais acessíveis em momentos de renda da população reduzida, ela ganha com esse cenário”, observa.
A analista do BB Investimentos, Geórgia Jorge, acrescenta que o “momento excepcional” vivido por essas empresas ainda combina a redução do custo dos grãos, o que favorece as margens para proteína de aves e suínas e a redução do preço do boi gordo devido à elevação dos abates.
“Por sua vez, favorece as margens de proteína bovina, que também tem demanda interna aquecida”, diz Jorge BB ao AgFeed.
O boi gordo da JBS
Em relação à JBS, o analista da Ativa comenta que, em meio ao cenário positivo para seus mercados de atuação, exceto nos Estados Unidos, a companhia tem entregado bons resultados, o que anima investidores. Segundo ele, diante a entrega de resultados pela companhia, o mercado financeiro revisa os lucros com melhores perspectivas a cada trimestre.
De abril a junho, a empresa dos irmãos Batista registrou receita de R$ 100 bilhões pela primeira vez em sua história, além de reverter o prejuízo registrado um ano antes, ao lucrar R$ 1,7 bilhão. Após um “trimestre memorável”, segundo a XP, bancos estão elevando o preço-alvo dos papéis JBSS3.
“Acreditamos que o terceiro trimestre tem todas as condições para dar continuidade às tendências positivas, com melhorias sequenciais nas margens da companhia, com a Seara sendo um ponto positivo”, comentou o banco Citi em relatório sobre a gigante de proteína animal.
Em tempos de dólar perto dos R$ 5,60, a variação cambial tem ajudado nos ganhos da JBS, uma vez que 70% das receitas são geradas nas operações fora do Brasil.
Marfrig e Minerva em momentos diferentes
Outra ação que tem brilhado no Ibovespa é a Marfrig, na esteira do comportamento das ações de sua controlada, a BRF.
Na análise do Bank of America (BofA), apesar de lucros mistos, o cenário é positivo para a empresa, uma vez que a desalavancagem contínua da holding deverá desbloquear valor para as ações por meio dos dividendos da BRF e da venda de ativos para a Minerva Foods, operação que aguarda a aprovação do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).
Descolada de seus pares, as ações da Minerva exibem alta tímida no ano, de quase 6% até a quarta-feira. O analista da Ativa Research pondera que, além da estrutura da empresa, que trabalha com pouca diversificação e tem limitação geográfica, os papéis sentem o peso da compra dos ativos da Marfrig.
“Era esperado um desempenho melhor na estrutura de capital em termos de pagamento de dividendos e de reestruturação de dívida. A Minerva fez uma aquisição gigante, que acabou pressionando a estrutura de capital e se alavancou. O mercado não gostou disso. Com esse peso, ela não tem conseguido acompanhar o ritmo dos seus pares na Bolsa”, avalia Serra.
Tendência é de alta
Enquanto grandes bancos ajustam suas apostas para o Ibovespa até o fim do ano, com expectativa de novos recordes acima do patamar de 140 mil pontos, o profissional da Ativa vê um cenário de alta mais lenta para as ações de proteína animal.
“Os valores estão ficando muito apertados. BRF, JBS e Marfrig estão subindo acima do que o mercado esperava, que ainda deverá revisar os lucros das companhias até o fim do ano”, diz. Georgia Jorge, do BB, acredita que essas companhias devem reportar resultados fortes nos próximos dois trimestres, dando suporte ao bom desempenho das ações.
Contudo, para 2025, Pedro Serra projeta ambiente um pouco mais instável. Segundo ele, o ciclo bovino deve começar a se deteriorar, o que afetará a margem bruta das companhias que atuam com a proteína animal.
“Temos um cenário que, embora esteja favorável para frangos, devemos começar a ver o preço médio sendo um pouco mais pressionado (no ano que vem). Logo, deve pressionar as receitas e as margens da BRF”, pondera.
O outro lado
Por outro lado, considerando apenas as empresas do agronegócio listadas, que formam a carteira Iagro, as ações da M. Dias Branco lideram as quedas, de 27%.
Fora do índice Ibovespa, os papéis da fabricante de massas e biscoitos não tiram o ímpeto de valorização do índice Agronegócio em 2024, de 4%.
Na contramão das empresas de proteína animal, a M. Dias Branco vem sendo diretamente impactada pela valorização do dólar em relação ao real, o que deu um gosto amargo aos resultados da companhia no segundo trimestre, que viu o lucro e a receita caírem na comparação com o mesmo período de 2023.
Além disso, a analista do BB Investimentos ressalta um descasamento entre os preços dos produtos vendidos e os custos, em meio à dinâmica mais lenta de repasse do aumento dos gastos diante a alta também de seu principal insumo, o trigo.
Ações mais ligadas ao mercado de grãos mostram humores distintos dos investidores no acumulado de 2024. O papel da SLC cai 2%, a ação da 3Tentos sobe mais de 10%, BrasilAgro opera no zero a zero, Camil sobe 18% e Boa Safra recua cerca de 15% de janeiro até agora.
Dentre as empresas do setor sucroenergético, Jalles Machado acumula baixa de 11%, São Martinho sobe 3% e Raízen cai 19%. Por fim, o papel da Kepler Weber sobe 9%, Vittia recua 30% e AgroGalaxy cai mais de 60%. Listada em Nova Iorque, a ação da Lavoro já recuou 42% desde o primeiro pregão de janeiro.