A cada dia que passa, fica mais próxima a data de entrada em vigor da lei antidesmatamento da União Europeia, a já famosa EUDR (sigla em inglês para European Union Deforestation Regulation), que passa a valer a partir do próximo dia 30 de dezembro.

Dessa forma, produtores rurais do Brasil e de todo o mundo terão de prestar contas aos importadores da União Europeia sobre se os produtos que estão enviando ao bloco foram produzidos ou não em áreas de desmatamento recente.

De olho em atender a essa demanda dos produtores em reconhecer que sua produção está em linha com o que pede a União Europeia, a companhia suíça de auditoria e certificação SGS, uma das maiores empresas de verificação e consultoria do mundo, com presença em mais de 100 países, está se preparando para fornecer uma "certificação EUDR" aos agricultores.

"Estamos montando todo o sistema para fornecer essa certificação", antecipa Julio Natalense, gerente de desenvolvimento de negócios de sustentabilidade para a SGS na América Latina, em entrevista ao AgFeed.

A ideia é que essa certificação passe a ser oferecida aos clientes quando a EUDR entrar em vigor. Por enquanto, o que existe é uma pré-asseguração em relação ao que pede a lei antidesmatamento.

"O que a gente está executando agora é fazer a auditoria no cliente para garantir que ele está preparado para cumprir com a EUDR", explica Natalense.

A verificação se torna necessária pela quantidade de exigências que a lei antidesmatamento europeia faz aos agricultores brasileiros e do resto do mundo.

Produtores de soja, cacau, carne bovina e outras culturas terão de comprovar para os importadores do bloco que sua produção não teve origem em áreas desmatadas desde 31 de dezembro de 2020.

E, para isso, terão de apresentar aos importadores dados de geolocalização do local de produção, além de informações sobre o fornecedor, a descrição e quantidade dos produtos adquiridos.

O problema é que a União Europeia não estabeleceu um formato padrão a ser seguido por todos os produtores, lembra Natalense.

“Tem muitas discussões, se vai ter algum banco de dados público, se o governo vai fornecer algum tipo de informação que seja certificável, se todas essas imagens vão estar em um local. Toda essa discussão está em andamento.”

Em uma outra frente, também ligada à temática ESG, a SGS lançou globalmente o programa Impact Now, em dezembro do ano passado, com o objetivo de apoiar empresas na implementação de ações sustentáveis.

O programa busca transformar discursos e metas de sustentabilidade – muitas vezes com um horizonte de médio e longo prazo, com metas para 2030 ou 2050, em ações concretas, verificando planos, indicadores e métricas.

“Para que se atinjam metas em prazos tão longos, é preciso que você demonstre claramente quais são os seus planos, quais são os indicadores que estão sendo seguidos, quais são as métricas que estão sendo verificadas, para garantir que isso, num espaço tão longo lá no futuro, realmente vai trazer resultados”, diz Natalense

O Impact Now oferece desde uma avaliação inicial de pontos de melhoria até a certificação final por um auditor independente, em um pacote de mais de 40 serviços distribuídos entre quatro pilares: clima, natureza, circularidade e asseguração ESG, explica o executivo da SGS.

Biocombustívies

Uma frente importante da SGS no Brasil são as certificações para o setor de biocombustíveis, afirma Natalense.

A empresa foi uma das primeiras empresas acreditadas pela Bonsucro, grupo internacional de governança sem fins lucrativos que nasceu em 2008 para promover a cana-de-açúcar sustentável, para fazer a certificação que atesta que a produção e cadeia de cana são sustentáveis.

Grandes companhias do setor como Raízen e Jalles Machado já obtiveram essa certificação.

Natalense lembra que, em um sistema semelhante ao da certificação Bonsucro, a SGS também trabalha com a International Sustainability and Carbon Certification (ISCC), sistema de certificação de sustentabilidade aplicável globalmente.

O executivo destaca que, dentro do ISCC, há o ISCC CORSIA, sistema de certificação voluntária de sustentabilidade para o combustível sustentável de aviação (SAF, na sigla em inglês), que é reconhecido pela Organização da Aviação Civil Internacional (ICAO).

O ISCC CORSIA assegura que os SAFs produzidos e utilizados na aviação internacional sejam elegíveis para o CORSIA (sigla em inglês para Esquema de Compensação e Redução de Carbono para Aviação Internacional), garantindo que o cálculo das emissões de gases do efeito estufa foi feito de forma rigorosa e utilizando rastreabilidade na cadeia de suprimentos.

“As certificações europeias querem garantir que não tenha aquela competição entre comida e alimento e combustível, que uma comodidade está sendo utilizada, mas não está desfavorecendo a produção de alimentos para a produção de combustíveis. Essa certificação ajuda nesse cálculo e ajuda a dar “tranquilidade” também”, explica Natalense.

Ainda no campo dos biocombustívies, a SGS opera dentro do RenovaBio (Política Nacional de Biocombustíveis), programa do setor sucroalcooleiro.

A companhia atribui às usinas o Certificado da Produção Eficiente de Biocombustíveis, documento que habilita o produtor ou importador de biocombustível a emissão de Crédito de Descarbonização (CBIO) em quantidade proporcional ao volume de biocombustível que foi produzido ou importado e comercializado.

“Fomos uma das primeiras certificadoras aprovadas para o RenovaBio e temos uma base importante de todos os produtores nacionais aí que realizam as auditorias conosco”, diz Natalense.

Entre os clientes, estão empresas como Raízen, Cargill, Caramuru, Oleoplan, entre outras, conforme consta em documentos divulgados no site da companhia.

História curiosa

A SGS foi criada em 1878, na França, por Henri Goldstuck, um imigrante vindo da Letônia que desembarcou no Porto de Rouen, na região da Normandia, após se demitir do emprego no país-natal, onde fazia a supervisão do carregamento de aveia ensacada em um terminal portuário.

A partir daí, a história ganha ares de fantasia – por ter acontecido há muito tempo, é quase impossível comprovar se os fatos procedem – mas é interessante de toda forma.

Perambulando pelo terminal de Rouen, Goldstuck teria percebido que haviam muitas perdas nos sacos de grãos que chegavam ao porto, seja por avarias na horas de descarregar ou por serem roubadas.

Ele viu que isso acontecia com uma carga de aveia de seus antigos empregadores na Letônia e enviou uma carta relatando o problema. Foi contratado, então, para fazer o trabalho de inspeção das cargas que chegavam à Rouen, fazendo a vistoria da quantidade e da qualidade dos grãos na chegada.

“Ele viu essa necessidade de alguém, um auditor independente, de uma terceira parte, para assegurar as cargas que estavam sendo transportadas nos portos”, explica Natalense.

Os negócios cresceram rapidamente e, ainda naqueles fins do século XIX, a SGS já tinha escritórios em diferentes partes da França.

Durante a 1ª Guerra Mundial, a empresa mudou sua sede para a Suíça, e rapidamente espalhou pelo mundo. Hoje, a empresa contabiliza uma rede de 2,5 mil laboratórios em 115 países e mais de 99,5 mil colaboradores espalhados pelo globo. No Brasil, está desde 1938 e hoje conta com mais de 3,5 mil colaboradores diretos, com presença em 17 estados da federação.

Resumo

  • A SGS está montando um sistema para ajudar produtores a comprovar conformidade com a lei antidesmatamento da União Europeia
  • Exigências da chamada EUDR entram em vigor na virada do ano para produtos exportados para o mercado europeu
  • No Brasil, a companhia também atua em certificações de biocombustíveis como Bonsucro e RenovaBio, além do ISCC CORSIA, voltado ao SAF