Se antes o Brasil era conhecido como grande consumidor de novelas mexicanas, hoje o movimento se inverte: é o México que tende a absorver cada vez mais produtos brasileiros.
Não são exatamente as nossas novelas – uma vez que as duas grandes produtoras de novelas dos dois países, Televisa e Globo, são concorrentes no mercado externo – mas sim, produtos como carne bovina, frango, suínos e outras commodities.
De olho em mitigar perdas do setor produtivo nacional, após o governo dos Estados Unidos tarifar em 50% produtos importados do Brasil, o vice-presidente Geraldo Alckmin e outros representantes do Executivo brasileiro como o ministro da Agricultura e Pecuária, Carlos Fávaro, e a ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, viajaram ao México nesta semana para fortalecer laços com o país.
“Tenho convicção absoluta que (a abertura de mercado) minimiza em muito os impactos do aumento de tarifas”, disse o ministro Fávaro.
Em um cenário sem os Estados Unidos no jogo, o México ganha importância nas remessas de produtos afetados pelo tarifaço, caso da carne bovina, que continua sendo taxada em 50% e não entrou na lista de exceções do governo americano.
Assim, neste mês, o México ultrapassou os Estados Unidos em volume de compras de carnes vindas do Brasil, só sendo superado pela China, que continua sendo o líder e principal mercado comprador.
De acordo com dados compilados pela Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec), entre os dias 1º e 25 de agosto de 2025, o Brasil exportou 10,2 mil toneladas de carne bovina brasileira para o México, igual a uma receita de US$ 58,8 milhões.
No mesmo período, os embarques de carne bovina para os Estados Unidos somaram 7,8 mil toneladas, volume correspondente a US$ 43,6 milhões.
Ao todo, de janeiro a julho deste ano, o Brasil já havia embarcado 67.659 toneladas de carne bovina ao México, volume equivalente a US$ 365 milhões. E a perspectiva é de que esse montante dobre até o fim de 2025, segundo disse Roberto Perosa, presidente da Abiec, à revista Exame.
Para se ter uma ideia das alterações rápidas, no acumulado dos sete primeiros meses do ano, o mercado mexicano havia sido o quarto maior destino da exportação da proteína brasileira, atrás apenas de China, Estados Unidos e Chile.
O Brasil exporta carne bovina para o México desde 2023 e a tendência é de que mais 14 frigoríficos estejam aptos para exportar para o país, segundo o secretário de Comércio e Relações Internacionais do Ministério da Agricultura e Pecuária, Luís Rua.
"Haverá uma auditoria em setembro, a agência sanitária do México irá ao Brasil e esperamos que em breve que esses 14 (frigoríficos) sejam aprovados", disse Rua à agência de notícias Reuters.
Esses frigoríficos sob análise pertencem às empresas JBS, BRF, Marfrig, Minerva, Distriboi, Frisa, Agra, Iguatemi, Prima, Meat Snack e Better Beef, segundo informações divulgadas inicialmente pelo jornal O Estado de S.Paulo.
O aumento para as exportações ao México, que de fato se tornou uma alternativa, não implica necessariamente em substituição completa dos Estados Unidos. "Os EUA são um grande e importantíssimo mercado para o Brasil. Por isso, seguimos dialogando com o governo brasileiro e com os importadores americanos para que essa relação comercial se restabeleça plenamente, como sempre foi”, disse Perosa, da Abiec, à Reuters.
Frango e Suíno
A agenda da comitiva brasileira se encerra nesta quinta-feira com um evento promovido pela Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), reunindo autoridades brasileiras e mexicanas.
O objetivo, segundo a associação, é ampliar o diálogo técnico e institucional com autoridades sanitárias e importadores sobre o papel das normas da Organização Mundial de Saúde Animal (OMSA/WOAH) na construção de um comércio internacional mais previsível e seguro.
A inclusão do evento na agenda sinaliza a crescente importância do México para o mercado de aves e suínos, para além do tarifaço imposto pelos Estados Unidos.
Houve expansão mesmo com a interrupção de compras por parte dos mexicanos, entre maio e junho passado, após a confirmação de um caso de gripe aviária em uma granja comercial em Montenegro (RS), no dia 15 de maio.
A Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) já esperava que o fluxo de exportações de frangos e suínos para o México continuasse positivo ao longo deste ano, após a renovação de continuidade de uma medida do governo mexicano, o programa Pacic, por mais um ano, até o fim de 2025.
Essa iniciativa zera as tarifas no México para produtos da cesta básica, trazendo isenção temporária de impostos de importação sobre itens essenciais, o que favorece a entrada do produto brasileiro.
“As boas relações entre os países e a sólida parceria construída entre produtores brasileiros e importadores mexicanos indicam que o fluxo de carne de frango e de carne suína do Brasil ao México deverá seguir em ritmo positivo ao longo de 2025, gerando resultados positivos para as duas nações”, já antevia o presidente da ABPA, Ricardo Santin, no início do ano.
Acordos
A missão, que está se encerrando nesta quinta-feira, dia 28 de agosto, foi composta pelos já citados Alckmin, Fávaro e Tebet, e também pelo presidente da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (ApexBrasil), Jorge Viana, e pelo presidente da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), Edegar Pretto, além de outros integrantes do governo e do setor empresarial.
Na bagagem, os representantes do governo brasileiro estão trazendo dois importantes acordos assinados com o Executivo mexicano.
Um deles é uma declaração de intenções sobre cooperação bilateral envolvendo intercâmbio tecnológico para o setor de biocombustíveis, prevendo avanço no desenvolvimento de combustíveis sustentáveis para aviação (SAF), que podem utilizar matérias-primas diversas como etanol, óleo de soja, sebo bovino, macaúba, entre outros produtos.
O outro acordo é um memorando de entendimento sobre cooperação em matéria de promoção de investimentos e fortalecimento de capacidades, formalizado entre a Secretária da Economia do México e a ApexBrasil.
A intenção, segundo o governo federal, em nota, é fortalecer as relações de amizade, entendimento e desenvolvimento econômico que unem o Brasil e o México com o objetivo de impulsionar um quadro de interação que facilite o intercâmbio de bens, serviços e investimentos, bem como a geração de novas oportunidades de negócios.
O memorando prevê ainda a criação de um grupo de trabalho com representantes das áreas técnicas de ambos os países que irá identificar as áreas de interesse comum, planejar, implementar e atualizar o plano de trabalho que norteará o grupo.
O governo mexicano descartou, no entanto, um acordo de livre comércio com o Brasil. "Não estamos pensando em um acordo de livre comércio (...), mas sim em um acordo de colaboração”, disse a presidente do México, Claudia Sheinbaum, nesta quinta-feira.
No ano passado, as exportações brasileiras para o México totalizaram US$ 7,8 bilhões, com destaques para vendas de automóveis de passageiros (US$ 715,4 milhões), carnes de aves e suas miudezas (US$ 563,7 milhões) e veículos para transporte de mercadorias (US$ 507 milhões).
Resumo
- O México se tornou um mercado estratégico para o Brasil. Após o “tarifaço” dos EUA, passou a ser o segundo maior comprador de carne bovina brasileira, ficando atrás apenas da China.
- As exportações de frango e suínos para o México também cresceram em 2025, com apoio do programa Pacic, que zera tarifas sobre produtos da cesta básica e facilita a entrada da proteína brasileira.
- Durante a missão oficial, Brasil e México firmaram acordos de cooperação em biocombustíveis e promoção de investimentos, mas governo mexicano descartou um tratado de livre comércio.