Se a disposição para plantar milho na safra 2023/2024 já não era grande entre os produtores rurais, agora está ficando cada vez menor, em meio ao atraso no plantio da soja, o que já reflete (ou deverá refletir) nos preços das duas commodities.

Dados das principais consultorias agrícolas do País têm confirmado o ritmo mais lento da semeadura da soja este ano, em em função principalmente da falta de chuva em estados como Mato Grosso e Rondônia.

A maioria estima que o plantio esteja em 50% da área estimada de soja, enquanto o normal para esta época seria já ter semeado entre 57% e 60%. O cenário também é influenciado pelo excesso de chuvas no Paraná que causou alagamentos nas lavouras e já obriga alguns produtores a fazer o replantio de determinadas áreas.

O sócio-diretor da MD Commodities, Ismael Menezes, destaca que este cenário já provocou alta de cerca de R$ 10 por saca de soja nas últimas semanas, o que deixa a dúvida entre os produtores rurais: será esta uma tendência de alta para os preços ou é apenas uma oportunidade pontual para vender, em função de um problema climático?

A resposta está nos modelos climáticos. As principais áreas produtoras de soja e milho estão sob a influência do El Niño, que costuma provocar mais chuva no Sul e clima seco na metade Norte do Brasil.

"O que preocupa é que os modelos estão bastante divergentes, assim como ocorreu no início da safra americana este ano, o que também trouxe muita volatilidade nos preços, por isso os próximos 40 dias é que vão trazer respostas mais claras, é viver um dia após o outro", afirmou Menezes.

De qualquer forma, o analista alerta que as chances do produtor brasileiros ver altas expressivas como tinha na safra 2021/2022, de olho no tão almejado R$ 200 por saca na soja, são extremamente baixas.

Ismael Menezes fez a palestra de abertura do Congresso Brasileiro de Crédito Agrícola realizado esta semana, na capital paulista, onde o principal alerta foi: “mesmo que o Brasil tenha uma quebra de 20 milhões de toneladas de soja ainda assim será a segunda maior safra da história”.

O cenário mais provável é de que haja uma regularização das chuvas na segunda metade de novembro, o que tende a manter preços estáveis, "com algumas oportunidades de alta pontuais”, mas sem motivo para uma valorização significativa.

E a avaliação do analista está baseada principalmente nos números da América do Sul, como um todo. No ano passado a soma da produção de Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai foi de 191 milhões de toneladas, nas contas da MD Commodities.

Como este ano as previsões climáticas são favoráveis para estes países, com expectativa de que o Paraguai, por exemplo, colha 10 milhões de toneladas de soja e a Argentina chegue próximo a 48 milhões de toneladas, bastaria o Brasil produzir 130 milhões de toneladas que a América do Sul já empataria em produção, ou seja, teria o mesmo cenário de oferta da última safra, que já não foi boa em termos de preço ao agricultor.

Mas aí vale lembrar que o potencial produtivo da safra brasileira 2023/2024 foi calculado inicialmente em 170 milhões de toneladas. E como disse Menezes, se houver uma quebra de 20 milhões de toneladas, ainda assim "é muita soja”, para uma demanda que não cresce no mesmo ritmo.

O Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) está prevendo que a demanda chinesa caia dos 102 milhões de toneladas de soja este ano para 100 milhões de toneladas em 2024, número que muitos ainda consideram otimista demais. Nem mesmo o maior uso de soja pela indústria de combustíveis nos EUA deve modificar este cenário, "porque os estoques devem ser maiores”.

"O comprador se sente muito confortável ainda, por isso é prematuro pra matar a safra brasileira. Nos EUA foi assim, deixou de chover no inicio do plantio mas depois o clima normalizou e produção foi boa”, lembrou o analista.

O recado ao produtor é que que venda aos poucos, aproveitando as oportunidades, inclusive esta dos últimos dias, mas sem deixar de fazer a gestão de risco, segundo Menezes.

Preço do milho pode subir

O atraso no plantio da soja traz como principal consequência o risco de comprometer a janela ideal para semear o milho safrinha, em algumas áreas. A "safrinha” ou segunda safra é a maior do País e costuma determinar a direção dos preços e prêmios do cereal.

O produtor já vinha desestimulado com os preços baixos do milho na maior parte do ano e agora tende a reduzir o plantio para não correr o risco climático e ter as lavouras em desenvolvimento no período que a seca já se iniciou no Centro-Oeste.

Por isso, a MD revisou novamente para baixo a estimativa de produção de milho. Agora é esperada uma redução de 11% na área plantada da segunda safra, além de queda na produtividade. Se isso ocorrer a produção da safrinha teria uma queda de quase 20 milhões de toneladas em relação ao potencial , ficando em 91 milhões de toneladas.

No milho Ismael Menezes prevê preços estáveis ou mais baixos na Bolsa de Chicago, mas uma forte elevação dos prêmios de exportação do produto brasileiro, o que poderá trazer preços melhores ao agricultor por aqui.

"Quem ainda tem milho vai negociar bem agora no fim do ano, mas é preciso ficar atento porque se o preço subir muito, alguns produtores voltarão a decidir por plantar safrinha, mesmo correndo o risco de ter perdas pelo clima", ressaltou.

Quinta-feira de projeções

A Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) divulgou seu levantamento mensal de safra nesta quinta-feira. E revisou para cima a expectativa para a soja, que deve chegar a 162,4 milhões de toneladas em 2023/2024, um crescimento de 5,1% em relação ao período anterior.

A Conab ponderou que apesar das chuvas irregulares neste início de safra, o aumento na área plantada contribuiu para a projeção de uma colheita maior.

No caso do milho, foi prevista uma produção total de 119,1 milhões de toneladas, uma redução de 9,6% na safra em comparação com o recorde do ciclo anterior.

A safra total de grãos e oleaginosas do Brasil foi estimada em 316,7 milhões de toneladas pela Conab, uma queda de 1,5% em relação à temporada anterior.

Também foi divulgado hoje o relatório de oferta e demanda do USDA que manteve a previsão para a safra de soja do Brasil em 163 milhões de toneladas. A MD Commodities aposta em 159 milhões de toneladas na safra 2023/2024.