Em agosto foi publicada a Lei Federal nº. 15.090/2025, conhecida como a Lei Geral do Licenciamento Ambiental (LGLA), com o objetivo de uniformizar regras, simplificar procedimentos, reduzir a burocracia e tornar o processo de licenciamento ambiental mais célere.

A LGLA estabelece um marco regulatório nacional para o licenciamento ambiental, aplicável a todos os entes da federação, atualmente disperso em normas federais, estaduais e municipais.

A despeito da nobre intenção da LGLA e dos 21 anos de discussão para que finalmente fosse promulgada, determinados pontos da lei têm gerado bastante debate no que se refere a seus impactos e eficácia.

Um dos temas que têm gerado muita discussão e incertezas se refere às atividades que se encontram dispensadas de licenciamento ambiental, nos termos dos arts. 8º e 9º, da LGLA, como é o caso das atividades agropecuárias.

O art. 9º, da LGLA, dispensa de licenciamento ambiental: (i) o cultivo de espécies de interesse agrícola, temporárias, semiperenes e perenes, o que abrange desde lavouras de subsistência até grandes monoculturas comerciais; (ii) a pecuária extensiva e semi-intensiva; (iii) a pecuária intensiva de pequeno porte; e (iv) a pesquisa de natureza agropecuária que não implique risco biológico.

A justificativa para a dispensa de licenciamento das atividades agropecuárias reside no fato de que referidas atividades já se encontram reguladas por instrumentos específicos, como é o caso do Código Florestal (Lei nº. 12.651/2012), do Cadastro Ambiental Rural – CAR, das autorizações para supressão de vegetação, do Decreto nº. 6.514/2008, que trata das infrações e sanções administrativas ao meio ambiente, da Lei nº. 9605/98, que tipifica as condutas lesivas ao meio ambiente, da Lei nº. 14.785/23 e do seu decreto regulamentador, que dispõem sobre o regime jurídico dos agrotóxicos, dentre tantas outras normas e regulamentos de natureza ambiental.

A nova lei reconhece que as atividades agropecuárias, quando exercidas em conformidade com a competente legislação, constituem atividades de baixo risco e impacto ambiental, a dispensar controle autorizativo prévio.

No que se refere à dispensa de licenciamento ambiental das atividades agropecuárias, a LGLA inova com relação às Resoluções CONAMA nºs. 01/86 e 237/97, que preveem a necessidade de licenciamento ambiental para projetos agropecuários acima de 1.000 hectares ou menores, em se tratando de áreas significativas em termos percentuais ou de importância do ponto de vista ambiental, assim como para os projetos agrícolas, a criação de animais e os projetos de assentamentos e de colonização.

Na esteira da legislação federal, as legislações estaduais e municipais, observadas as peculiaridades locais, também preveem a necessidade de licenciamento ambiental para referidas atividades, em um emaranhado de normas, que acabam gerando grande insegurança jurídica.

Assim é que a nova lei pretendeu dar uma uniformidade à questão, tão cheia de regras próprias e nuances, mas o que se verifica é que, na prática, ao menos com relação às atividades agropecuárias, a LGLA acabou por trazer incertezas e quiçá agravar a situação.

Isso porque, a dispensa de licenciamento ambiental para as atividades agropecuárias não é absoluta, havendo necessidade de preenchimento de determinados requisitos.

Nos termos do § 1º, do art. 9º, a propriedade rural precisa se encontrar regular, ou seja, com CAR homologado pelo órgão estadual competente e sem déficit de vegetação em reserva legal e/ou Área de Preservação Permanente (“APP”) ou se encontrar em regularização, por meio da adesão a Programa de Regularização Ambiental (PRA) ou da assinatura de Termo de Compromisso.

O que se verifica, portanto, é que se a propriedade rural não se encontrar em processo de regularização, ou seja, caso seu proprietário não tenha aderido ao PRA ou firmado Termo de Compromisso, enquanto o CAR da propriedade não tiver sido homologado, a dispensa de licenciamento não se faz possível.

Assim, e a despeito da intenção de desburocratização das atividades agropecuárias, a efetividade da LGLA esbarra na necessidade de validação do CAR, que tem sido um ponto de estrangulamento da regularização ambiental no Brasil.

Estima-se que desde a implantação do CAR, em 2012, apenas 3% das propriedades rurais brasileiras tiveram as suas análises concluídas, diante da complexidade técnica da matéria e da ausência de técnicos nos respectivos órgãos.

Diante de tal fato o que se tem é que as atividades agropecuárias, ainda que em tese, nos termos da LGLA, se encontrarão dispensadas de licenciamento ambiental, na prática, àquelas atividades cujas propriedades rurais não preencherem os requisitos da nova lei terão que se encontrar devidamente licenciadas, sob pena de se encontrarem em situação irregular, com impactos sobre a obtenção de crédito rural, obtenção de financiamentos, comercialização de produtos, acesso a programas governamentais, etc.

Importante destacar que a dispensa de licença ambiental não dispensa o empreendedor da obtenção, quando exigível, de licença ambiental, de autorização ou de instrumento congênere, para a supressão de vegetação nativa, para o uso de recursos hídricos ou para outras formas de utilização de recursos ambientais.

Enfim, a LGLA cria grande insegurança jurídica, pois ao mesmo tempo que dispensa de licenciamento ambiental as atividades agropecuárias que se encontram em conformidade com a legislação ambiental, condiciona tal dispensa a variável fora do controle do produtor, afeta à capacidade do Estado de análise e processamento do CAR.

Louise Emily Bosschart é sócia da área de Direito Ambiental do Santos Neto Advogados