Não há a menor dúvida de que o agronegócio tem sido, nas últimas décadas, o motor da economia no País. Desenvolvemos uma agricultura tropical empresarial, fortemente fundada em desenvolvimento tecnológico. Isso tem nos gerado ganhos de produtividade crescentes e consequente diminuição de custos, tornando não só nossos agricultores, mas toda a cadeia, extremamente competitiva.

No entanto, da mesma forma, ninguém tem dúvida de que, no plano microeconômico, é um setor extremamente arriscado. A atividade agrícola está exposta a riscos inerentes a ela como, por exemplo, o risco biológico e o risco climático.

O agro exportador ainda está exposto a uma enorme volatilidade nos preços das commodities, além da variação do câmbio. Portanto, um mal gerenciamento de crédito para quem financia esse setor pode ser fatal.

As revendas de insumos agrícolas são um exemplo clássico. Uma parcela significativa delas gerencia muito mal o crédito ao produtor rural. Não à toa, várias delas têm enfrentado dificuldade.

Historicamente, as revendas são fundadas em municípios do interior do Brasil, por ex-executivos das áreas comerciais de multinacionais e/ou produtores rurais locais. Esses profissionais e empreendedores, em geral, têm formação e vocação fortemente direcionadas para vendas, além de contarem com um forte networking regional.

Por essas características, eles tendem a negligenciar algumas boas práticas gerenciais, entre as quais a concessão de crédito. Por mais que exista análise de crédito na empresa e até mesmo a utilização de ferramentas tecnológicas nesse processo, na hora da decisão, pesa a opinião do dono.

Revendas, assim como outras empresas da cadeia, financiam o produtor rural pelo prazo-safra, da mesma forma que os bancos. Portanto, deveriam ter o mesmo rigor na concessão de crédito que eles.

As instituições bancárias aprovam crédito sempre visando a relação retorno/risco. Ou seja, quanto maior o risco estimado mais deve ser cobrado pela operação. Ressalta-se aqui que a margem de revendas (o retorno) é baixa.

A concessão de crédito para o produtor rural deve ser feita com ordem, método e disciplina. É preciso analisar a dívida total desse cliente com o mercado (bancos, tradings e concorrentes) e projetar seu fluxo de caixa futuro, para conhecer sua real capacidade de pagamento. É importante verificar se foi feita aquisição de terras a prazo, ponto muitas vezes ignorado.

Outro erro comum é supervalorizar as garantias reais. Garantias como alienação fiduciária de terras, por exemplo, são importantíssimas, mas lembre-se de que elas nem sempre são líquidas, sobretudo se houver uma ocorrência generalizada na região (uma seca, por exemplo).

De acordo com a análise, deve ser estabelecido um limite para cada cliente. Por fim, de posse das informações, é saudável que a decisão final seja por meio de um comitê de crédito.

No ato do faturamento, as garantias e contratos devem ser todos registrados. Se houver pendências elas devem ser cobradas e monitoradas. O produtor precisa também ser monitorado continuamente (desempenho da safra, inadimplência com terceiros, protestos etc.).

Olhando para o balanço da empresa concedente do crédito, vale sempre lembrar que o que interessa é o resultado, não o faturamento. Parece óbvio, mas é comum encontramos nesse setor empresas cujas metas e os incentivos para os colaboradores estão atrelados à venda. Estabelecer os incentivos corretos para a equipe é fundamental para preservar a saúde financeira do negócio.

Concluindo, às vezes é preciso dizer não. Lembre-se, você nunca vai quebrar por causa de um empréstimo que você não fez.

Manoel Pereira de Queiroz é sócio sênior da Mapa Capital, presidente do Conselho Curador da Fundação de Estudos Agrários Luiz de Queiroz (FEALQ), membro do Conselho da Fundação Agrisus e do Conselho Superior do Agronegócio da FIESP (COSAG).