No ano que vem, o Brasil sedia a 30ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, a COP 30. Ela acontece em Belém, no Pará, entre os dias 10 e 21 de novembro, e está mobilizando cerca de R$ 75 bilhões em investimentos públicos e privados.
Para além da agenda de investimentos, extremamente necessária para o Estado e para o País, um grande legado que o evento pode deixar é o fortalecimento das pautas que priorizam os projetos de adaptação às mudanças climáticas – tão urgentes quanto os que tratam da mitigação dos impactos das emissões de gases do efeito estufa (GEE).
“A tragédia do Rio Grande do Sul mostra o quanto precisamos avançar na pauta de adaptação e ir além do foco em mitigação, que tem sido a agenda das nações desenvolvidas nas últimas conferências do clima”, afirma João Francisco Adrien, Head ESG Agro, Itaú BBA.
As reuniões da COP, historicamente, se focam em três grandes pilares: mitigação, adaptação e implementação, ou seja, os países negociam quais medidas têm que ser promovidas para a redução da emissão de gases que causam o efeito estufa, como enfrentar os impactos do aumento da temperatura global e como financiar a transição energética.
Isabel Garcia Drigo, diretora de Clima, Uso da Terra e Políticas Públicas do Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora), lembra que os extremos climáticos, a partir de agora, serão cada vez mais frequentes e que as medidas de mitigação e adaptação para que as cidades, a agricultura e a pecuária sejam mais resistentes aos impactos são urgentes.
“Esse não é um alerta para agenda da COP30, é alerta imediato”, afirma Isabel. “Na COP 30, o Brasil deveria poder mostrar que já adaptou suas regiões mais vulneráveis”.
As diretrizes gerais de adaptação climática para todo o planeta, além da transição energética, tendem a ser os principais temas da COP30, segundo pontuou recentemente a diretora do Departamento de Clima do Ministério de Relações Exteriores, Liliam Chagas de Moura.
O Brasil é um dos países mais vulneráveis às mudanças climáticas, principalmente quanto aos efeitos negativos na agricultura, na geração de energia hidrelétrica e nas populações mais fragilizadas, como as atingidas pela seca e por deslizamentos de terra.
Por isso, é do interesse do Brasil assegurar que o tema da adaptação seja colocado de forma predominante na agenda e que seja inserido nas políticas públicas nacionais e internacionais, para que consiga angariar recursos para assegurar a realização dos investimentos necessários para a adaptação às mudanças do clima.
“A COP30 tem que ser reconhecida como a COP da adaptação”, defende Adrien. Ele lembra que será em 2025 o momento no qual os países irão apresentar os resultados das metas firmadas no Acordo de Paris (COP21) e as novas metas climáticas a serem alcançadas em 2030 e 2035.
Segundo Liliam, há espaço para o Brasil definir prioridades que, se aceitas pelos demais países, farão com que a COP30 seja reconhecida como uma das conferências nas quais foram tomadas decisões históricas e transformadoras no enfrentamento da mudança do clima.
“A agenda prioritária de países em desenvolvimento, os mais afetados pelas mudanças do clima, não é reduzir emissões, mas sim investir na adaptação para minimizar os impactos já causados pelos maiores emissores de GEE do mundo, que são os países desenvolvidos”, afirma Adrien.
Se a COP 30 pode deixar um legado, ele será a demonstração dos avanços que o Brasil tem feito na implementação de uma transição no uso do solo para modelos produtivos que são redutores dos gases do efeito estufa, na visão de Isabel, do Imaflora.
“O Brasil já tem um conjunto de políticas públicas e ferramentas para isso [reduzir as emissões de GEE], mas a implementação é muito lenta”, diz Isabel. “Na COP 30, teremos podemos mostrar esses modelos já funcionando para o planeta.”
Investimento
As expectativas são de que o Pará receba cerca de R$ 75 bilhões em investimentos, considerando dinheiro público e privado em decorrência das obras e iniciativas necessárias para a realização da COP 30.
Uma delas é o Parque da Cidade, espaço que vai receber os eventos e que está com 30% das obras concluídas. Outras sete obras estruturantes também estão sendo executadas, somando mais de R$ 3 bilhões. São projetos que vão beneficiar cerca de um milhão de pessoas e gerar 5 mil empregos.
Os preparativos incluem ainda ampliação do número de leitos disponíveis para hospedar os cerca de 50 mil visitantes esperados para o evento. Para atender esse público, sete galpões foram cedidos pela Companhia Docas do Pará (CDP) ao governo do Estado para que sejam recuperados e transformados em um complexo de lazer e gastronomia.
Mas o principal foco dos investimentos é a infraestrutura. Somente o Novo PAC, o Programa de Aceleração do Crescimento, irá disponibilizar R$ 38,7 bilhões para o financiamento de obras nas áreas de transporte, saúde, educação, energia, habitação e saneamento.
As obras de saneamento, aliás, são a principal demanda da cidade-sede. Com 1,5 milhão de habitantes, Belém tem apenas 17,12% das residências atendidas por serviço de coleta de esgoto, sendo que apenas 3,6% desse esgoto é tratado, segundo o Instituto Trata Brasil. O acesso à água potável atinge 76,8% dos moradores, enquanto a média no estado do Pará é de 48,22%.
Essa realidade, inclusive, exige que bares e restaurantes de Belém façam adequações para padrões sanitários internacionais, o que exige investimentos em modernização e renovação de equipamentos. Segundo a Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), o Pará possui cerca de 35 mil estabelecimentos comerciais (bares e restaurantes), que empregam aproximadamente 1.148.404 pessoas, cujo faturamento, em 2022, foi de R$ 396 bilhões.
Por meio de parceria com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), o Pará viabilizou a contratação de R$140 milhões em crédito para o setor de turismo - hotéis, bares e restaurantes para estimular a modernização das instalações.
O BNDES também aprovou no início do ano financiamento no valor de R$ 3 bilhões para a execução de plano de investimentos multissetorial de melhoria da infraestrutura urbana e para ampliação do acesso a equipamentos e serviços públicos na região metropolitana de Belém.
Em outra iniciativa, o banco aprovou R$ 40 milhões para a restauração do Conjunto dos Mercedários, equipamento cultural que poderá ser usado como instalação durante a COP 30.
Na semana passada, uma nova leva de investimentos para a COP foi anunciada pelo ministro da Casa Civil, Rui Costa, durante uma cerimônia no Palácio do Planalto, em Brasília, quando foram apresentados três convênios envolvendo os governos federal e do Pará e a prefeitura de Belém, que somam cerca de R$ R$ 1,3 bilhão em recursos.
Do total, R$ 310,8 milhões serão investidos na modernização da infraestrutura viária de Belém e na implantação do Parque Linear Doca, na avenida Doca de Souza Franco. Outros R$ 325,5 milhões serão utilizados para a implantação de um parque, que contará com projetos de paisagismo, rede de esgoto, pavimentação e iluminação pública, e R$ 42 milhões para projeto de gestão de resíduos sólidos, com ações de inovação e biotecnologia.
A Itaipu Binacional, sozinha, investirá R$ 1 bilhão. Os recursos terão como destino outras obras de infraestrutura, como a execução de 50 quilômetros de rede coletora de esgoto, 4,8 mil ligações de tubulações, implantação de vias marginais do Canal Água Cristal, e a instalação de equipamentos de controle de tráfego.
“As recentes tragédias decorrentes das enchentes no Rio Grande do Sul servem como alerta para as consequências devastadoras do desequilíbrio climático, ressaltando que a empresa e governo têm o dever de liderar o movimento em direção ao futuro mais sustentável”, disse o diretor-geral brasileiro da Itaipu Binacional, Enio Verri.
O governador do Pará, Helder Barbalho, concorda que situações climáticas como a que assola o Rio Grande do Sul são o reflexo de alterações no clima.
Segundo ele, a COP 30 – que ele chama de COP da Floresta – será o momento de construção conjunta de soluções que possam preservar o meio ambiente ao mesmo tempo em que permita o desenvolvimento de atividades econômicas que respeitem a natureza. Afinal, a Amazônia é um bioma essencial para o combate à mudança do clima.