O preço do leite vem subindo e em abril teve a sexta alta consecutiva, de 5,1%, chegando à média de R$ 2,45 o litro, segundo o Cepea (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada), da Esalq/USP. No ano, a valorização real acumulada é de 18,7% - com os valores deflacionados pelo IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo, do IBGE).
A alta é bem-vinda para os produtores, que chegaram a verificar queda de 23% nos preços no acumulado de 2023, que chegou à mínima de R$ 1,96 em outubro do ano passado, quando o aumento das importações de leite de países como Argentina e Uruguai cresceu. Mas até quando a recuperação vai se manter?
A tendência de alta continua em maio, mas pode não se sustentar a partir de junho, pois as importações continuam sendo um fator de pressão sobre o mercado, segundo o Cepea.
Dados da Secex (Secretária de Comércio Exterior) mostram que, de janeiro a abril, as compras externas somaram quase 774 milhões de litros em equivalente leite, 15% a mais que no mesmo período do ano passado.
“O movimento de alta dos preços pode perder força a partir de junho”, diz o Cepea. O motivo é a combinação de alguns fatores, como recuperação da oferta do leite cru e o incremento da margem do produtor nos últimos meses, que deve favorecer a captação.
Outro ponto que está na análise do Cepea é que os laticínios vêm relatando dificuldades em realizar o repasse da alta do preço praticada no campo aos derivados. Na prévia de maio do IPCA-15, o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) identificou um aumento de 1,94% no leite longa vida.
“Canais de distribuição seguiram pressionando as negociações com as indústrias para obter preços de lácteos mais baixos, o que resultou em variações pouco expressivas nas cotações do UHT, da muçarela e do leite em pó em abril”, diz o Cepea.
Com margem reduzida na venda dos derivados, especialmente os mais “comoditizados”, os laticínios podem ter dificuldades em manter o ritmo de altas nos preços pagos aos produtores a partir do segundo semestre.
José Luiz Bellini, analista do Centro de Inteligência do Leite da Embrapa, lembra em análise recente que com duas guerras em andamento no mundo (Rússia X Ucrânia e Israel X Palestina), desempenho fraco das grandes economias globais e juros elevados, as perspectivas para a cadeia láctea em 2024 não são otimistas.
“Depois de um ano difícil, 2024 ainda não será o ano da recuperação e continuaremos observando a exclusão de produtores menos eficientes e de pequenos laticínios, como tem ocorrido nos últimos anos”, diz Bellini.
Produção menor
A produção menor é outra explicação para a alta dos preços registrada até abril. O Índice de Captação Leiteira (ICAP-L), calculado pelo Cepea, registrou recuo de 0,37% entre março e abril e acumula recuo de 7,8% no ano.
O menor investimentos dentro da porteira, que ocorre desde no final do ano passado, além do avanço da entressafra no Sudeste e no Centro-Oeste e o atraso da safra do Sul, devido ao clima adverso, tem prejudicado a oferta do leite cru.
Com isso, a disputa entre laticínios e cooperativas por fornecedores para garantir o abastecimento de matéria-prima se acirra, sustentando o movimento de alta dos preços.
“Esse cenário deve se manter em maio, reforçado pelas altas consideráveis nos preços do leite spot e pela especulação de agentes de mercado, tendo em vista os impactos negativos das enchentes do Rio Grande do Sul sobre a atividade pecuária leiteira do estado”, afirma o Cepea.
No Rio Grande do Sul, que é terceiro maior produtor de leite do País, os impactos nas propriedades ainda estão sendo estimados, mas estimativas traçadas pela Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) a partir de dados de produtores locais são de que não haverá desabastecimento no estado.
O analista de Socioeconomia e Desenvolvimento Rural da Epagri/Cepa, Tabajara Marcondes, também credita à crise no Rio Grande do Sul a persistência de alta prevista para o mês de maio, pois o estado responde por aproximadamente 13% do leite cru adquirido pelas indústrias no Brasil.
Além dos problemas no Rio Grande do Sul, a CNA, no seu Panorama Agro de maio, também apontou a sazonalidade da produção como um dos fatores que explicam a alta de preços até abril e que indicam a mesma tendência para maio.
Em Minas Gerais, a projeção é de alta de 4,9%, com o preço alcançando R$ 2,5478 por litro, enquanto no Paraná, a estimativa é de 7,8%, a R$ 2,6420/litro. Santa Catarina projeta alta de 4,2%, com o litro de leite a R$ 2,4114 e no Rio Grande do Sul, o Conseleite gaúcho estima aumento de 5,9%, a R$ 2,4368 por litro.
O Brasil produz por ano 34 bilhões de litros de leite e possui o segundo maior rebanho leiteiro do mundo, atrás da Índia, mas é uma produção que está estagnada segundo análise do Centro de Inteligência do Leite da Embrapa que aponta ainda que os principais exportadores para o Brasil, Uruguai e Argentina, apresentam produção mais eficiente e competitiva em comparação à brasileira.
Os vizinhos do Mercosul produzem leite com preços ao menos 10% menores que os nacionais, segundo estudo apresentado pela Câmara Setorial do Leite.
“Para sermos competitivos temos que ser eficientes para baixar custos e termos uma logística eficaz”, afirma Airton Spies, consultor da Aliança Láctea Sul Brasileira, para quem é necessária uma redução de 20% dos custos de produção para que o Brasil possa, como fazem Argentina e Uruguai, começar a exportar leite.