Em 2024, o Brasil exportou um recorde de 50,5 milhões de sacas de café. Dois terços, ou 66%, saíram pelo Porto de Santos. Foi a menor participação do maior complexo de terminais marítimos da América Latina em 15 anos no envio do chamado “ouro negro” ao exterior.

A commodity que impulsionou, há mais de um século, o crescimento do porto tem perdido espaço no line up das embarcações por causa dos gargalos logísticos. Os problemas vão desde a profundidade do canal entre Santos e Guarujá, até a necessidade de uma nova pista de descida do Planalto Paulista ao litoral.

Mas o maior gargalo é a necessidade de um novo terminal de exportação de contêineres, equipamento utilizado para a exportação de café. Com o estrangulamento logístico em Santos e em outros portos brasileiros, 1,8 milhão de sacas, o equivalente a 5,5 mil contêineres, deixaram de ser exportadas no ano passado, segundo Conselho Nacional dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé).

Uma receita cambial de US$ 555 milhões, ou R$ 3,3 bilhões, deixou de entrar na balança comercial brasileira, se considerado o volume e as cotações médias do dólar e do café de dezembro de 2024.

Somam-se a isso despesas de armazenagem, estadia e logística no porto, estimada em R$ 51 milhões pelo Cecafé entre junho e dezembro do ano passado, período desse levantamento.

No início de 2025, período de entressafra do café e de exportações menores, o sufoco poderia ter dado uma trégua. Mas não foi o que ocorreu.

Segundo o Cecafé, de janeiro a abril, 737,7 mil sacas, ou 2,2 mil contêineres deixaram de embarcar pelos portos brasileiros por questões logísticas, 78% do total em Santos, 20% por portos do Rio de Janeiro e 2% por Vitória (ES).

“Mesmo em meses fracos de exportação, com média de 3 milhões de sacas por mês, não deveríamos estar vivendo esse suplício. São R$ 26 milhões jogados fora só este ano”, disse ao AgFeed Eduardo Heron, diretor técnico do Cecafé.

Para tentar sensibilizar representantes do porto, o Cecafé realiza, esta semana, um roadshow pelo Sul de Minas, principal região produtora e exportadora do País. Além de técnicos da entidade exportadora, a equipe da Autoridade Portuária de Santos estará na visita a três municípios mineiros.

“A ideia é mostrar todo o moderno panorama do processamento do café, desde a produção, até a estufagem, a colocação no contêiner e todo o trânsito aduaneiro. Todo esse processo da colheita a deixar o café pronto para o embarque é feito no interior e não é de conhecimento da autoridade portuária”, explicou Heron.

Serão visitas a três municípios mineiros, a começar por Varginha. Lá, os representantes da Autoridade Portuária de Santos conhecerão o processo inteiro, segundo o diretor do Cecafé, com visitas a uma propriedade em pleno período de colheita, beneficiamento no local, o rebeneficiamento em armazéns, o preparo para exportação nas cooperativas, a separação dos grãos por tamanho e qualidade, estufagem em contêineres e o processo final para a exportação no Entreposto Aduaneiro do Interior (EAD).

Nos dias seguintes, as visitas serão em Alfenas, com a ida a uma propriedade rural, e em Guaxupé, sede Cooxupé, maior cooperativa exportadora de café do mundo. Assim como Varginha, Guaxupé sedia um terminal aduaneiro para processo total de exportação antes do embarque, o Recinto Especial de Despacho de Exportação (Redex),

“A visita técnica é um avanço no nosso diálogo e esperamos que a autoridade, ao conhecer a eficiência do processo naquela região, avance no processo logístico”, afirmou Heron.

A maior demanda do setor cafeeiro - e também dos exportadores de algodão - é pela licitação, ainda este ano, do Tecon 10, o novo terminal para a movimentação de contêineres no porto.

Segundo Edilberto Ferreira Beto Mendes, diretor de operações do Porto de Santos, caso a licitação seja feita, o volume deve elevar em 50% a capacidade de escoamento por meio de contêineres no complexo exportador do litoral paulista.

No entanto, o processo está ameaçado pelas regras da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq). A agência reguladora impediu a participação de grupos que já operam em Santos, o que deve levar companhias a recorrer ao Judiciário para estarem no certame.

“O leilão precisa sair este ano para que o Tecon possa operar em 2028. Ano que vem é ano eleitoral, nada acontecerá e, caso a disputa seja judicializada, corremos o risco de sair desse colapso só na virada da década”, lamentou Heron, do Cecafé.

Em entrevista ao AgFeed, Beto Mendes, disse que tem “atuado muito próximo do Cecafé e dos produtores” e que o presidente da Autoridade Portuária de Santos, Anderson Pomini, “tem nos orientado a ter uma sinergia muito forte, porque o grande problema que muitas vezes afeta o café, o algodão também, e produtos que possam estar saindo por container”.

Ainda de acordo com o executivo, além da demanda, da necessidade de licitação do Tecon 10 e da disputa com outros produtos para a exportação, o gargalo para o setor cafeeiro sofre também com o efeito cascata de atrasos de outros navios em outros portos brasileiros.

“Estamos tratando isso com muita seriedade, temos a visita marcada para conhecer todo o processo e juntos com o Cecafé, estamos buscando todas as alternativas”, concluiu Beto Mendes.

Resumo

  • Deficiências na infraestrutura nos portos fizeram com que País deixasse de exportar 1,8 milhão de sacas no ano passado
  • A maior demanda do setor cafeeiro é pela licitação, ainda este ano, do Tecon 10, o novo terminal para a movimentação de contêineres no porto
  • Processo está ameaçado pelas regras da agência reguladora Antaq, que impediu a participação de grupos que já operam em Santos