Enquanto grande parte das empresas estreitam sua relação com o meio ambiente e com o agro por meio de créditos de carbono, uma startup argentina, criada há quase 10 anos em Córdoba, descobriu um mercado parecido em outro ativo da natureza: a água.

A proposta da Kilimo é conectar empresas multinacionais com agricultores que, usando um software da startup, podem reduzir o uso de água na irrigação em suas fazendas. Essa economia gera um “benefício volumétrico da água”, num conceito parecido com o crédito de carbono.

Atualmente, a empresa atende mais de 2 mil agricultores em sete países da América Latina e, segundo suas próprias métricas, já ajudou produtores a economizarem 72 bilhões de litros de água. O objetivo é chegar aos 100 bilhões de litros até 2025.

Para escalar sua solução, a startup acabou de levantar US$ 7,5 milhões em uma rodada do tipo Série A, liderada pela Emerald Technology Ventures, empresa suíça que investe em startups com teses ligadas à redução de emissões.

A rodada ainda contou com a participação do The Yield Lab Latam, Salkantay Ventures, Kamay Ventures e iThink VC. Antes, a empresa já havia levantado cerca de US$ 4,5 milhões.

Jairo Trad, CEO e co-fundador da Kilimo, explicou ao AgFeed que a ideia com os recursos é expandir o mercado em três novos países: Brasil, Estados Unidos e Espanha.

No Brasil, a empresa atende uma fazenda de laranja da LDC, mas o CEO afirmou que está em vias de anunciar um projeto com “uma grande empresa conhecida nacionalmente”.

“Estamos contratando uma equipe no Brasil para começar a escalar de forma mais rápida. O Brasil é um mercado super interessante, mas a conversa da sustentabilidade é dominada pelo carbono. Acreditamos que há muita oportunidade também na água”, afirmou.

A companhia atua em duas frentes: para os produtores rurais, fornece uma plataforma que o ajuda a gerenciar uso de água e energia nas propriedades rurais em troca de um resultado financeiro por essa economia.

Nesse software, que utiliza dados de clima e satélites acoplados a uma IA, os agricultores recebem recomendações de quando e como irrigar sua lavoura.

Em outra ponta, gera créditos para empresas que possuem metas ligadas à economia de recursos hídricos. A Kilimo possui como clientes a Microsoft, Intel, Coca-Cola e Google.

Trad explica que o produtor contrata o serviço e, após um ano, a Kilimo mede o quanto de água ele economizou. Isso gera uma “poupança”. “Eles ganham dinheiro para economizar água”.

O recurso financeiro vem da ponta das empresas, que contratam a Kilimo para garantir que esses agricultores da base estejam de fato economizando água.

Ao mesmo tempo em que a empresa encontrou um modelo que valorizasse o uso da água, percebeu que muitas multinacionais estavam investindo em segurança hídrica. Na prática, estavam dispostas a incentivar financeiramente boas práticas.

A diferença para um crédito de carbono é que, por estarem atuando com água, a economia hídrica tem que ser feita próxima das empresas. “Não dá para uma empresa de fora do Brasil economizar água em Minas Gerais. É preciso investir num benefício volumétrico no mesmo lugar onde a empresa atua. Esse é um dos principais desafios nossos”.

Equipe da Kilimo: Rodrigo Tissiera (co-fundador), Andrea Ramos (VP de Adaptação Climática), Jairo Trad (CEO e co-fundador), Juan Carlos Abdala (CTO e co-fundador) e Tatiana Malvasio (co-fundadora)

Jairo Trad explica que criou a empresa com seus sócios por avaliar que havia uma oportunidade em torno do manejo da irrigação. “Notamos que administrar a irrigação corretamente seria algo valioso”.

Esse é o primeiro investimento da Emerald na América Latina. Segundo Helge Daebel, head da Emerald e que agora fará parte do conselho da startup, o VC viu uma oportunidade de “construir uma ponte entre o consumo de água e a adoção de tecnologia em um espaço difícil e as corporações expostas aos riscos hídricos locais”.

Já a Yield Lab Latam investiu pela primeira vez na empresa há seis anos e repetiu a dose nesta rodada. Santiago Murtagh, sócio da Yield Lab Latam e membro do conselho da Kilimo, afirmou que está “dobrando o investimento” pois a equipe demonstrou um timing apurado para engajar os players da cadeia do agro.

“Vimos seu compromisso com os seus objetivos e uma adaptação rápida ao ambiente latino-americano e às práticas da indústria agrícola em constante evolução”, afirmou Murtagh, em comunicado.

A empresa começou a atuar em culturas de grãos na Argentina, principalmente no trigo e na soja irrigada. Hoje, o CEO estima que cerca de 20% de todos os pivôs de irrigação argentinos são clientes da Kilimo.

Depois de alguns anos, a empresa expandiu a atuação para culturas de maior valor agregado, como uvas, cereja, laranja e limão.

“Começamos a crescer em países como México, Chile e Peru e também no Brasil. A água para irrigação é basicamente gratuita para os agricultores, e isso faz com que eles não tenham incentivos para serem mais eficientes”, conta.