A Rural Ventures, empresa de venture capital, levou a sério o mantra “ano novo, vida nova”, geralmente é usado para projetar resoluções e metas para os novos meses que entrarão no calendário.
Logo no início de 2024, vai colocar no mercado um fundo para aportar em agtechs e foodtechs. Assim, a empresa, que funciona até agora numa espécie de Club Deal, terá seu primeiro veículo de investimento com esse formato, com meta de captar entre R$ 50 milhões e R$ 60 milhões, para serem investidos em cerca de 20 startups.
Conforme revelou ao AgFeed um dos sócios da empresa, Fernando Rodrigues, R$ 10 milhões já foram captados. A ideia é continuar a captação com pessoas próximas da gestora, que já entendem do mercado de agtechs.
“A criação do fundo é um processo novo, que também ‘zera a pedra de 2023’. Internamente chamamos de segundo fundo, considerando um primeiro as atuais investidas. Pelo nosso tamanho de empresa, não fazia sentido uma estrutura mais complexa de gestão e administração”, explicou Rodrigues.
O movimento de criação do fundo também marca o primeiro grande passo da gestora após a entrada do novo sócio. Após mais de 17 anos na XP, André Amorim, um dos responsáveis pela criação do modelo de agentes autônomos da corretora, se juntou à Rodrigues, que também é ex-XP, para liderar o negócio.
Amorim contou ao AgFeed que a ideia é que esse fundo funcione numa espécie de track record, dando experiência à empresa para estruturar e gerir um próximo veículo, que teria a ambição de colocar pessoas físicas dentre os investidores.
“Esse produto ainda não existe. Daremos abertura para investidores pessoa física investir num setor recheado de investidores institucionais. Vamos trazer a pessoa física para mais perto da tecnologia do campo”, explicou o novo sócio.
O objetivo, segundo os sócios, é colocar esse próximo fundo numa plataforma de distribuição que fique acessível para investidores do varejo tanto comprarem cotas diretas quanto via algum outro fundo, que compre parte do fundo da Rural Ventures.
“O primeiro fundo, do início do ano que vem, será captado com pessoas próximas da Rural Ventures. O segundo será maior e deve conectar numa plataforma onde pessoas físicas e Fiagros tenham acesso. Para termos a maturidade de lançar esse produto, estamos lançando o primeiro”, disse Rodrigues.
Segundo Rodrigues, a ideia com os fundos da Rural Ventures é ajudar as novas investidas a repetir o bom desempenho das atuais startups no portfólio da empresa.
Ele revelou ao AgFeed que a AgroBoard, agtech que tem como foco o desenvolvimento de soluções digitais para gestão de risco de commodities agrícolas e que foi investida pela Rural Ventures neste ano, elevou seu faturamento de R$ 2 milhões para R$ 5,5 milhões neste ano após o aporte.
“Uma valorização interessante de um ano para o outro, somado a um aumento na equipe de 8 para 35 pessoas. Grande parte desse impulso foi dado pela Rural Ventures, com conexões e ajudando no go-to-market”, afirmou Fernando Rodrigues.
Além do aporte, A Rural Ventures procura ajudar as investidas a conquistarem novos clientes e promover uma rede de networking entre outras startups e gigantes do agro.
Uma nova investida
Antes do lançamento do fundo, a empresa anunciou também um novo aporte, que não teve seus valores divulgados, na startup umgrauemeio, companhia que atua na detecção de incêndios em florestas e plantações por meio de imagens de satélite, câmeras e inteligência artificial.
Rodrigues contou que tudo começou em julho deste ano, quando o CEO da startup, Rogerio Cavalcante, participou do podcast Rural Ventures, apresentado pelo próprio Fernando Rodrigues e por Kieran Gartlan, sócio e responsável pela operação no Brasil da The Yield Lab.
Depois de meses de conversa, o contrato foi assinado no início de dezembro. O fato de a startup ter um negócio de impacto e efetividade real, somado ao fato de que ela já gera caixa, atraiu a Rural Ventures.
“Na COP 28, muitos foram críticos à real efetividade dos créditos de carbono. Vemos na umgrauemeio um impacto real, que ajuda o planeta e também traz resultados para os investidores”, disse.
“Nossa agricultura já é verde, faz plantio direto e é naturalmente regenerativa. O problema é não queimar mais nada, e a umgrauemeio atua nisso. Não queremos que nada mais pegue fogo. Com isso, conseguimos mitigar a emissão de CO2”, acrescentou Rodrigues.
A ideia da startup é, basicamente, tentar agir rápido contra algumas das principais causas de emissões de gases de efeito estufa. Uma delas, das mais danosas, é a queima de árvores em incêndios florestais, problema recorrente em países com grandes áreas de reservas nativas ou matas plantadas, como o Brasil, Austrália e Canadá.
Na detecção dos incêndios, o sistema da umgrauemeio atua com câmeras instaladas em torres, com visão 360º. Elas fornecem dados para uma inteligência artificial que detecta, em segundos, qualquer fumaça num raio de no mínimo 15km. Isso corresponde, segundo o CEO, a uma área em torno de 70 mil hectares. “Num sistema de detecção satelital, demora de uma a seis horas”, relembra o CEO.
A empresa instala esse hardware, que funciona num esquema de mensalidade para os clientes. Quando algo é detectado pelas câmeras, as informações necessárias são enviadas por aplicativos de mensagens para o produtor ou brigadas conterem o problema.
Assim, o primeiro objetivo da umgrauemeio foi o desenvolvimento de um sistema capaz de usar tecnologia de ponta, como sistemas de inteligência artificial e câmeras sofisticadas de vídeo, para monitorar grandes áreas e gerar alertas ao primeiro sinal de fumaça.
“Começamos como uma empresa de detecção de incêndio, mas hoje somos mais do que isso”, afirmou Cavalcante. Criada em 2016 e remodelada em 2019, a umgrauemeio atualmente cobre, segundo o CEO, cerca de 17 milhões de hectares em 12 estados e conta com clientes de peso.
Na silvicultura, tem parcerias com a Suzano e a Irani, do ramo de papel e celulose. No segmento da cana-de-açúcar, a Raízen.
Cavalcante voltou há alguns dias de Dubai, onde participou da COP 28 com estande da umgrauemeio. O evento, considerado “espetacular” pelo CEO, serviu para mostrar que existe muito interesse dos estrangeiros em uma ferramenta já validada no Brasil, principalmente com países da África e Ásia.
Apesar disso, o foco principal da startup está no mercado nacional, por enquanto. “Vemos espaço para crescer. Fala-se muito da descarbonização, mas um meio mais rápido e eficaz de reduzir as emissões é evitar incêndios, que são bombas de CO2 na atmosfera”, afirmou Rogério Cavalcante.