O produtor rural brasileiro já está pronto para digitalizar seu processo de compra de insumos, equipamentos e outros produtos de uso em sua propriedade?
Pergunte a Diego Arruda, diretor de Negócios para o Brasil da Agrofy, e a resposta não será exatamente conclusiva.
“Estamos no meio de uma mudança de cultura do agricultor. Alguns ainda preferem estar presencialmente com o fornecedor do insumo. A digitalização começou há pouco tempo e vem crescendo com a chegada das novas gerações”, afirma.
Não por acaso, Arruda tem guiado a empresa, que nasceu em 2015 na Argentina com a proposta de replicar no agro o modelo de marketplace popularizado em outros segmentos pelo Mercado Livre, por uma rota intermediária: o “figital”.
Seu desafio é aumentar as taxas de conversão das empresas que estabeleceram suas lojas no marketplace. Para isso, tem reforçado a ideia de, em um primeiro momento, reproduzir a jornada tradicional de compra do produtor, mas introduzindo o digital na primeira etapa: a pesquisa e a comparação de preços sobre o produto desejado.
“Ele provavelmente vai finalizar a compra no offline, mas já chegará ao revendedor de sua preferência sabendo muito mais sobre o que quer”, explica.
A Agrofy, com sede na cidade de Rosário, na Argentina, conta atualmente com mais de 150 mil produtos listados. São itens oferecidos por algumas das principais redes de suprimentos agrícolas, totalizando 6.000 marcas – das quais mil estão na plataforma do Brasil.
Estão ali desde grandes empresas de diferentes segmentos como Toyota, MSD e John Deere como revendas regionais de insumos, startups de tecnologia e empresas de serviços voltados às propriedades rurais.
Assim como no Mercado Livre, elas pagam mensalidades para manter seus estabelecimentos no shopping virtual e expor seus produtos e serviços – que vão de sementes e fertilizantes a peças para máquinas agrícolas, tratores e carros, além de imóveis.
O mercado brasileiro, aliás, vem ganhando espaço no faturamento da companhia, que atua também na Colômbia, Chile, Bolívia, Peru, Uruguai e Paraguai - totalizando oito países na América Latina.
O desembarque por aqui foi em 2018 e as taxas de crescimento foram de 400% e 200% no primeiro e segundo ano de atuação, respectivamente.
O resultado de 2022 é uma amostra do peso da operação brasileira: o volume de compras pela plataforma no Brasil cresceu 78% em relação a 2021, acima da média de 68% da região.
O País também foi responsável por 40% - ou US$ 11,2 milhões – do volume de negócios gerados pela Agrofy no ano passado, que somou US$ 28 milhões considerando os oito países de atuação.
O ritmo de expansão no Brasil, aliás, já tinha resultado, em 2021, em um aporte de US$ 30 milhões em recursos de multinacionais do setor como Yara, Syngenta e Bunge – no total, a empresa criada em 2015 já levantou cerca de US$ 64 milhões de investidores internacionais.
O destino dos recursos foi a expansão da própria plataforma, além da ampliação de serviços no país, incluindo atendimento telefônico para a apoiar o fechamento de negócios e a implementação de produtos financeiros, como o Agrofy Pay e Agrofy Crédito, que por enquanto só funcionam na Argentina.
“Nosso marketplace gera 40 mil oportunidades de negócios mensais e a meta para 2023 é consolidar o volume de tráfego e aumentar as taxas de conversão, que estão entre 5% e 8%”, afirma Arruda. O serviço de vendas por telefone, por exemplo, representa 87% dos acessos à plataforma no Brasil.
Outro investimento é um serviço de informações para o mercado que tem o objetivo de posicionar a empresa entre os principais marketplaces do agronegócio nacional, ao lado de plataformas como Orbia e Lavoro.
Arruda, da Agrofy, vê como diferencial o fato de a plataforma não estar ligada diretamente a um grande player da indústria – como Orbia com a Bayer, por exemplo.
No entanto, esse é um formato que traz desafios também, pois há ainda no agronegócio uma preferência por comprar de fornecedores fixos, que sempre atenderam o agricultor no formato “olho no olho”.
A Orbia, por exemplo, nasceu como um programa de fidelidade na Bayer, no qual ao comprar produtos, o cliente ganha pontos para trocar por experiências ou participação em eventos.
Para entrar nesse nicho de negócio, a Agrofy fechou esse ano parceria com o Clube Agro, considerado o primeiro programa de relacionamento multimarcas do agronegócio brasileiro, conectando indústria, canais de venda e produtores rurais.
Digitalização já é tendência
Essa maior digitalização da agricultura coincide com um contexto que afetou não apenas o Brasil, mas o mundo: a pandemia de Covid-19.
A realidade do confinamento exigiu adaptações no processo de compra de insumos de todos os tipos, ampliando a oferta no modelo de shopping virtual, dando início a uma renovação no perfil do agricultor, que se obrigou a estar conectado.
De acordo com dados com MPrado Consultoria, os marketplaces representavam 0,12% das vendas de insumos da Europa em 2019. Em 2020, esse percentual saltou para 7%.
Outra pesquisa, da consultoria McKinsey & Company realizada com mais de 2 mil agricultores brasileiros de diferentes culturas ao longo dos últimos três anos também mostra a evolução do uso de ferramentas digitais para comprar insumos agropecuários.
A pesquisa intitulada “A mente do agricultor na era digital”, indicou que 46% utilizavam plataformas digitais para adquirir produtos no seu negócio em 2021, um avanço de 10 pontos percentuais em relação ao ano anterior Já nos Estados Unidos e na Europa também houve crescimento, mas em ritmo mais lento se comparado ao brasileiro.
Em 2021 estima-se que 31% dos agricultores americanos faziam compras online, ante 24% no ano anterior.
Os dados da McKinsey em 2022, no entanto, indicaram uma redução nestes percentuais tanto no Brasil, quanto no exterior, após o fim das restrições da pandemia e há uma tendência de adoção de um modelo que mescla contato digital e presencial.
Não é toa que, de acordo com o Distrito, plataforma que reúne dados de startups de todos os segmentos que atuam no Brasil, há 35 agtechs no País posicionadas como marketplaces,.
Em pesquisa de 2020, a MPrado Consultoria constatou que 23% dos agricultores brasileiros compram em marketplaces. Outros 47% estão dispostos a conhecer e começar a comprar nessas plataformas enquanto 30% ainda se mostram resistentes aos shoppings virtuais para o agro.
“Trata-se de um mercado bilionário, com grande potencial de expansão e que está ainda em pleno processo de amadurecimento”, diz Marcelo Prado, presidente da MPrado Consultoria.
“O sucesso do modelo vai ser híbrido, com integração dos canais digitais e físicos, num modelo omnichanel como o já aplicado no e-commerce tradicional”. Se assim for, ponto para o modelo “figital” da Agrofy.