Um pouco acima da Estação Espacial Internacional. Um pouco abaixo dos equipamentos de empresas como a Starlink, de Elon Musk, ou da Planet, que tem mais de 200 satélites em operação.
É assim que José Damico, fundador e CEO da SciCrop, define o ponto do espaço de onde, até o final deste ano, pretende coletar informações das lavouras brasileiras.
Ali, orbitando a cerca de 500 quilômetros de distância da Terra, a empresa espera posicionar o primeiro de uma série de satélites próprios, desenhados e produzidos para colher imagens que alimentarão seus algoritmos.
Assim, permitirão análises precisas sobre o que acontece acima (e até abaixo) do solo das propriedades rurais.
“No mundo todo o satélite é o principal e mais importante sensor para geração de dados para a agropecuária, assim como para as indústrias de óleo e gás, mineração e até o comércio”, afirma Damico.
“Queremos ter autonomia total na coleta de dados e esse é um caminho imprescindível nesse sentido”.
A missão de lançamento – que deve ser realizada pela Space X, de Ellon Musk – já vem sendo preparada há mais de um ano. É um investimento que pode chegar a R$ 12 milhões, dependendo da complexidade dos equipamentos embarcados no satélite. Um desafio e tanto para uma startup, seja pelo custo, seja pela complexidade da operação.
No campo financeiro, Damico espera anunciar noas pr´poximas semanas a conclusão de uma operação que trará os fundos necessários para financiá-la. Já no campo tecnológico, ele demonstra estar pronto para ir ao espaço.
Assumidamente um nerd, o cientista de dados Damico tem se dedicado a entender o universo dos satélites desde 2015, quando ele e o sócio Renato Ferraz deram os primeiros passos na SciCrop, que define como uma empresa de inteligência de dados voltada para o agronegócio.
Enquanto dedicavam-se a desenvolver algoritmos proprietários para funções que vão do roteamento inteligente de colhedoras à predição de safras, ele passou a estudar a melhor forma de coletar os dados para gerar informações mais precisas ais clientes.
A SciCrop possui hoje um repositório de 330 algoritmos de otimização de processos e predição voltados para o agronegócio.
Eles estão reunidos em uma ferramenta chamada de AgroAPI, na qual empresas podem buscar soluções para uma série de situações corriqueiras no campo, como detecção de áreas de plantio ou análise de custos de produção.
Atualmente, a receita da empresa vem do licenciamento dessas APIs para utilização nos sistemas de outras companhias e serviços consultivos baseados na tecnologia.
Entre os clientes estão grupos como Nestlé, Cargill, BP Bunge, Tereos, Cofco, Suzano, Klabin, Santander e Enforce, do grupo BTG. Segundo o CEO, a Scicrop tem recursos em caixa para manter seu funcionamento por dois anos.
Na lista dos investidores iniciais da empresa está a família Mendonça de Barros. A sede da Scicrop fica no mesmo prédio da MB Associados, na região da Faria Lima, em São Paulo, e os consultores têm voz ativa no cotidiano da startup.
Todas as segundas-feiras Damico tem na agenda reunião com Alexandre e José Roberto Mendonça de Barros, economistas com amplo conhecimento do agronegócio. “Não são meramente conselheiros, me ajudam ajuda com experiência”, afirma.
Sonho em órbita
A Scicrop tem conseguido avançar em diferentes mercados, mas Damico entende que só faz sentido manter a atual estrutura de desenvolvimento e custo se der o próximo passo.
É aí que o satélite – ou os satélites, já que o plano engloba chegar a um número próximo de dez em um prazo mais longo – entra no jogo.
“Hoje temos o maior depositório de códigos-fonte para coleta e tratamento de dados de satélite no Brasil”, afirma.
Segundo ele, são mais de uma centena, que seriam um grande diferencial se a empresa tivesse a capacidade de gerar e analisar suas próprias imagens.
Na operação atual, a Scicrop utiliza imagens fornecidas por várias redes de satélites como as das agências espaciais americana, europeia, japonesa e brasileira, além de privadas de empresas como Planet e Capela.
Mas, de acordo com Damico, como elas não estão focadas nas necessidades do agro brasileiro, nem sempre conseguem entregar os dados mais precisos.
O empreendedor afirma que a órbita escolhida para o satélite da Scicrop vai favorecer a obtenção de imagens no seu principal mercado, o Centro Oeste brasileiro.
O equipamento a ser lançado está em fase de homologação, processo burocrático que está sendo realizado pela Alba Orbital, empresa escocesa responsável também pela construção do satélite.
Toda a tecnologia desejada pela Scicrop estará condensada em uma peça de cerca de 300 gramas de peso, quase nada perto dos tradicionais satélites estacionários que têm o tamamnho de um carro e podem superar 1 tonelada.
“Tem o tamanho de um estojo escolar”, compara Damico. “Nesse negócio, cada grama influi no custo e em aspectos de controle orbital”.
Deve operar em baixa orbita, a 500 km da terra, e terá corpo com dois painéis solares, antena e lente e a previsão é que seja capaz de gerar uma imagem de qualidade de qualquer ponto do território brasileiro a cada 30 horas.
A Scicrop também está investindo para que o gerenciamento seja feito a partir de duas estações em terra, criando redundância para garantir que o delicado aparelho funcione da forma desejada e não seja sugado pelas forças gravitacionais, levando o investimento da empresa para o espaço.