A COP 30 terminou em Belém cercada de expectativas, discursos fortes e uma mobilização social rara para uma conferência do clima. Mas, quando se olha apenas para o que foi oficialmente aprovado nos documentos finais, o resultado é mais modesto do que a narrativa geral sugere.

A conferência avançou politicamente em temas importantes, mas do ponto de vista regulatório e vinculante, entregou muito pouco. Por isso, o Brasil terá de seguir com o trabalho doméstico se quiser transformar suas ambições climáticas em resultados concretos.

O único avanço estrutural da COP veio do Artigo 6.4 do Acordo de Paris, que teve seus padrões metodológicos adotados e ganhou sua primeira metodologia oficial. Isso significa que o mecanismo de créditos da ONU passa a ter base normativa real para funcionar.

E esse ponto importa para o Brasil, em especial porque a decisão preserva integralmente o dispositivo que permite reconhecer políticas nacionais obrigatórias (i.e., como o Código Florestal) como instrumentos válidos de mitigação quando integrados à NDC.

Em outras palavras, abre-se espaço para que APP e Reserva Legal, presentes no mercado regulado de carbono brasileiro (SBCE), tenham diálogo facilitado no contexto de mercado de carbono global (i.e., ITMOS, mercado voluntário e mercados regulados). Foi a entrega normativa mais consistente e promissora da COP 30.

Fora esse avanço, o panorama muda completamente. O Artigo 6.2, que permitiria transações bilaterais de créditos entre países, continua travado. Não houve acordo sobre contabilidade, transparência, mecanismos de registro ou ajustes correspondentes. Sem esses elementos, nenhum país consegue operar o 6.2 com segurança jurídica — e isso inclui o Brasil.

No financiamento climático, outro pilar central do Acordo de Paris, a COP 30 passou longe de qualquer definição robusta. A promessa de triplicar os recursos de adaptação até 2035 entrou no texto apenas como orientação política, sem base de cálculo, sem metodologia e sem caráter obrigatório.

Os principais artigos financeiros do Acordo — aqueles que tratam de previsibilidade, obrigações de países desenvolvidos e transparência — não avançaram. A conferência repetiu solicitações administrativas e pedidos de relatórios, mas não criou instrumentos ou compromissos novos.

A adaptação teve um resultado semelhante. Belém aprovou uma lista de 59 indicadores que servirão de referência para elaboração de políticas. Mas esses indicadores são voluntários, não padronizados e ainda precisam passar por um processo de dois anos para serem refinados. Hoje, não servem como métrica comparável, nem orientam investimentos de forma direta. O passo foi importante no plano político, mas ainda não gera aplicações práticas.

O “Mutirão de Belém”, documento político central da COP 30, trouxe a linguagem mais forte da conferência, mencionando transição energética, justiça climática, combate ao desmatamento e proteção de povos indígenas. Mas sua força é essencialmente simbólica: nenhuma dessas menções aparece como decisão operacional, e nenhum compromisso ganhou formato de regra, meta ou mecanismo.

Os roadmaps propostos pelo governo brasileiro, tanto para combustíveis fósseis quanto para desmatamento, não foram incorporados ao texto final por falta de consenso entre países.

No comércio internacional, tema que afeta diretamente o agronegócio brasileiro, praticamente não houve evolução.

Medidas unilaterais como o EUDR europeu, o CBAM e outros requisitos ambientais que impactam o agro não foram tratados em negociações formais. As chamadas Unilateral Trade Measures (UTMs) foram mencionadas somente de forma política, sem qualquer critério técnico ou procedimento que permita enquadrá-las ou questioná-las no âmbito da UNFCCC.

Na prática, continuam sendo discutidas na OMC, não na COP, igualmente, não houve indicação de trabalho conjunto entre UNFCCC e OMC.

Sistemas agroalimentares, que vinham ganhando destaque desde a COP 27, perderam espaço em Belém. O tema não recebeu decisões relevantes e ficou restrito a referências indiretas e eventos paralelos do setor produtivo e academia, com o sucesso do Agrizone. Entretanto, do ponto de vista formal e vinculante, isso representa um recuo em relação ao que o setor vinha construindo em Sharm el-Sheikh, Dubai e Baku.

No saldo final, a COP 30 reforçou o protagonismo político do Brasil e elevou a visibilidade da agenda climática nacional.

Mas, quando o foco recai sobre aquilo que realmente se transforma em regra, orçamento ou mecanismo, o cenário muda: Belém entregou pouco em termos normativos.

O avanço real está no Artigo 6.4, que abre uma janela estratégica para integrar o Código Florestal ao mercado de carbono. O restante da agenda (i.e., financiamento, adaptação, mitigação e comércio) continuará dependendo de decisões futuras.

Para o agro brasileiro, isso deixa uma mensagem clara: o futuro da regulação climática relevante para o setor não virá das COPs no curto prazo. Virá do trabalho doméstico, com o SBCE, política florestal, adaptação, pagamento por serviços ambientais, rastreabilidade, as soluçoes às exigências comerciais internacionais de sustentabilidade e agenda de mudanças climáticas na UNFCCC.

Belém ajudou a construir a narrativa, mas a implementação continuará sendo feita no Brasil.

Leonardo Munhoz é sócio especialista em Direito Agroambiental na VBSO Advogados