Durante várias décadas, o sobrenome Grabowsky e a marca Luxor fizeram parte da paisagem urbana brasileira, sobretudo dos destinos turísticos próximos do mar.

Nos anos 1980, a grife criada pela família no início do século 20 e sediada no Rio de Janeiro chegou a ser a segunda maior rede de hotéis do País.

Hoje, Eduardo Grabowsky, da terceira geração do clã, prefere olhar para as riquezas do interior do Brasil. Ele vendeu os ativos hoteleiros em 2007 para a GP Investimentos e, desde então, dedica-se ao family office que administra os recursos obtidos com este e outros negócios.

Em seu portfólio, três fazendas (duas em Mato Grosso e uma em Minas Gerais), somando 13,5 mil hectares, têm lugar de destaque. Reunidas na Luxor Agro, companhia agropecuária criada na década de 1970, elas são o cartão de visitas para um empreendimento ambicioso que começa agora a ganhar tração e que, nos próximos anos, pretende escalar atraindo recurso de investidores.

Na visão de Grabowsky, a Luxor Agro será, em alguns anos, uma referência internacional em operação de sistemas de agropecuária regenerativa para grandes fazendas.

Essa ideia vem sendo gestada há quase uma década, ganhou forma em 2020 e desde o ano passado entrou em uma nova fase: a da implantação, em todas as propriedades da empresa, de um modelo desenvolvido e testado em escala menor.

“Para essa fase de implementação a gente tem um capex necessário, incluindo uma parte de capital de giro para a pecuária, de R$ 120 milhões”, afirma Daniel Baeta, CEO da Luxor Agro.

“Nosso planejamento é que estejamos com todas as áreas já revertidas para esse sistema nos próximos 5 a 6 anos”.

Baeta chegou ao grupo em 2016 para liderar uma nova etapa nos negócios agropecuários da Luxor. Naquele momento Grabowski iniciava um processo de “profissionalização” do negócio de fazendas da família.

Engenheiro civil de formação, Baeta diz que, então, “não sabia nem quantas patas tem um boi”. Mas foi desafiado a aprender e, durante dois anos, fez uma verdadeira imersão no setor.

“Fiz uma espécie de serviço militar. Praticamente me mudei para o Mato Grosso e ficava visitando fazendas, aprendendo sobre gestão da pecuária”, conta.

Encerrado o período de aprendizado, o executivo ganhou a missão de reorganizar a Luxor Agro, seja do ponto de vista de gestão e governança, seja do ponto de vista da produção agropecuária.

Dessa forma, a ideia seria migrar de um ativo voltado sobretudo para um ganho patrimonial, com a valorização imobiliária da terra, para um modelo que agregasse rentabilidade com a exploração racional das propriedades em várias frentes.

“O Eduardo é investidor e sempre teve na cabeça que a melhor forma de a gente perpetuar patrimônio é investindo em negócios e pessoas”, afirma Baeta.

A tese do líder da família Grabowsky é, segundo o executivo, a de que o Brasil tem uma grande vantagem competitiva no agro, sobretudo se conciliada com “uma grande onda de oportunidade que é atrelar a produção agrícola à solução climática”.

“Nossa opção, então, foi investir no que a gente chama de produção com restauração, que acabou convergindo para o que hoje é o conceito de agricultura regenerativa. Na época não tinha esse termo”, diz Baeta.

Assim, de 2017 para cá o foco da Luxor foi se fechando. Primeiro, ao concluir o “serviço militar”, Baeta focou em gestão e governança. Segundo ele, esses eram pré-requisitos para atrair capital para a etapa seguinte, de dar escala a um modelo de operação agrícola que seria desenvolvido internamente.

Baeta conta que o grupo passou mais de quatro anos montando time e criando uma cultura empresarial nas fazendas. Isso incluiu desde a migração dos ativos, que estavam em nome de pessoas físicas, para o guarda-chuvas de uma S.A., além da criação de um conselho de administração com membros externos e reports trimestrais.

Hoje a Luxor Agro tem ERP implantado e avaliação anual das fazendas pela Deloitte. “Nosso objetivo é que, no ano que vem, a gente tenha os balanços auditados das fazendas, o que é raro no agro”, afirma.

Tentativa e erro

Na virada para a década de 2020, os olhares do CEO e sua equipe se voltaram para a criação do sistema produtivo. E então, ao invés de seguir uma receita pronta, a opção foi testar soluções até encontrar aquelas que pudessem ser replicadas em grandes áreas,

“A gente gastou bastante tempo e dinheiro e testou alguns designs, alguns modelos em uma das nossas fazendas, de 1.200 hectares. E errou bastante”, relata Baeta.

Quase todo esse processo foi financiado com recursos próprios da Luxor Agro, que atualmente tem receita anual de cerca de R$ 100 milhões.

Mas com a evolução dos trabalhos e a proposta de atrair capital, a empresa gerou interesse de investidores, que hoje contam com 10% de participação na companhia – os outros 90% continuam nas mãos do family office dos Grabowsky.

Um deles é o Meraki Impact, fundo de investimentos impacto com sede na Holanda mas gerido por Fernando Russo, hoje conselheiro da companhia.

Na propriedade, que fica no município de Pontes de Lacerda, no extremo oeste do Mato Grosso, primeiro o grupo descobriu, como diz o CEO, “bastante coisa que não funcionava”.

“Nosso maior aprendizado no início foi entender que mudar o jeito de fazer agricultura não é simplesmente mudar os insumos e as práticas agrícolas. Isso é só uma das partes”, diz.

“A gente fez perdeu algum tempo tentando mudar as práticas sem mudar os outros dois pilares, que são pessoas e paisagem, até a gente conseguir entender isso e criar uma metodologia que nos permitia olhar e falar: ‘Quando eu pegar uma grande fazenda, é isso que a gente vai fazer’”.

Essa compreensão guiou os investimentos feitos nos anos seguintes. O primeiro, começando pelas pessoas, foi criar na fazenda uma infraestrutura que permitisse atrair profissionais qualificados para trabalharem ali.

“Como é que eu mando um cara usar um insumo biológico, plantar uma árvore, se a casa dele é ruim?”, questiona ele. “Para a gente mudar o jeito que a gente opera, tem que mudar a vida dessas pessoas, tem que trazer mais gente para essa fazenda”.

O segundo pilar, chamado de paisagem, envolve a elaboração de um plano de uso e ocupação, que consiste em um design para identificar, na propriedade, onde estarão corredores ecológicos, agroflorestas, cursos d’água, pastagens e lavouras.

“Não adianta a gente ter ilhas de reserva. Imagina que eu tenho uma agricultura orgânica, mas o rio que passa embaixo está todo degradado... Não tem a conexão na paisagem”.

Com os dois primeiros pilares equacionados, a Luor partiu para o terceiro, com a adoção gradativa de melhores práticas agropecuárias.

Essa chamada “fase 1” do empreendimento durou até 2024. E então, com a chegou a hora de levar o método criado em uma escala menor para outros 12,3 mil hectares nas demais propriedades do grupo.

Pecuária com agrofloresta

Desde o ano passado, portanto, Luxor Agro passou a trabalhar na implantar seu modelo na maior propriedade do grupo, na mesma região da fazenda onde ele foi testado.

Ali, a companhia mantém cerca de 9 mil hectares de pastagens, que abrigam mais de 10 mil cabeças de gado de corte para recria e engorda em regime de terminação intensiva a pasto.

Nele, gado é rotacionado no pasto e ainda recebe suplementação nutricional com grãos, em grande parte produzidos em outros 3 mil hectares cultivados em sistema de integração lavoura-pecuária (ILP). A produção atual inclui soja, milho e sorgo.

“A gente está fazendo um sistema em que algo entre 15% a 20% do pasto vão virar floresta”, explica Baeta. “É um sistema agroflorestal em que 80% do pasto continuam com a pastagem, agora mais biodiversa, e o restante vem com o elemento florestal, que tem castanhas como o baru e madeira de curto e longo prazo”.

Com esse modelo, que melhora o manejo e traz sombreamento para o rebanho, Baeta acredita ser possível dobrar a produção pecuária e ter ganhos expressivos com as atividades extrativas.

O design do projeto prevê cerca de 4 mil hectares para o modelo de pecuária com agrofloresta e 4 mil hectares de ILP.

Daqui a sete anos, segundo seus cálculos, a área de floresta teria potencial para gerar um resultado semelhante ao da pecuária, que, por sua vez, sairia de uma lotação atual de cerca de 1,2 cabeça para uma meta de 2,5 a 3 cabeças por hectare.

“Então, o resultado praticamente multiplica por quatro”, estima. “Mas o sistema é gradual e super complexo. E é preciso dinheiro, necessitamos da solução financeira para melhorar a minha infraestrutura e a minha capacidade de manejo até chegar lá”.

Hoje, a empresa vende por volta de 6 mil animais por ano para grandes frigoríficos, como Minerva e JBS. O ciclo ideal para o grupo, de acordo com Baeta, é de dois anos de recria e engorda.

Além disso, a Luxor Agro mantém na fazenda um projeto ainda pequeno, com cerca de 1,5, mil cabeças de vaca para cria, com objetivo de desenvolver uma metodologia também para essa etapa do ciclo pecuário.

Café tipo exportação

Na propriedade mineira do grupo, os desafios e a escala são bem diferentes. Com 300 hectares, a fazenda é destinada à produção de cafés especiais, da variedade arábica, em modelo agroflorestal.

“A gente está convertendo a fazenda de monocultura de café para um sistema que integra árvores com funções ecossistêmica, como fazer sombreamento e atrair inimigos naturais para as pragas da cultura.

Durante alguns anos, a Luxro Agro fez testes para identificar as melhores espécies para conviver com o cafezal. No princípio, experimentou algumas plantas produtivas, como macadâmia, abacates e bananas. Mas o aprendizado mostrou que elas não funcionavam adequadamente quando a escala começava a crescer.

“A gente precisa trazer mais complexidade e mais biodiversiddade para esse sistema”, afirma Baeta. “Mas isso precisa ser economicamente viável. E a nossa conclusão é que esse aumento de complexidade, quando vai para uma fazenda de 300 hectares, não é viável”.

A solução, então, foi simplificar o design produtivo, integrando plantas com funções ecológicas para o próprio café, mas que não exigiam tanto manejo quanto as frutíferas.

A opção principal acabou recaindo sobre o o guacuruvu, que, entre as árvores nativas brasileiras, é a que apresenta crescimento mais rápido, chegando a 3 metros por ano.

“É uma leguminosa fixadora de nitrogênio, que traz a fauna para dentro do café, mas não tem uma função comercial”, diz o gestor.

Outras espécies, com diferentes funções, também foram agregadas.

Hoje a produção de café arábica da Luxor Agro já ocupa 100 hectares da propriedade e é comercializado, com a marca Flora, diretamente a na Europa, no Japão e na Austrália.

“São empresas que já conseguem entender e pagar um prêmio de impacto, não só pela qualidade do café, mas pelo projeto”, ressalta Baeta.

Fora de Minas, ele revela estar animado com testes de produção da variedade robusta nas propriedades do Mato Grosso. “Seria para integrar lá com o nosso sistema, porque o café, diferentemente da soja e do galo, já tem um prêmio de qualidade e de impacto.

O desafio de mudar de fase

Baeta admite que há muito chão pela frente para ver realizada a missão que Grabowsky lhe encomendou. A fase 2 do projeto da Luxor Agro ainda está no seu segundo ano e a empresa busca parceiros que ajudem a financiar sua implantação.

O executivo afirma que já tem conversas com investidores que demonstraram interesse no modelo e em seu potencial de crescimento.

“Hoje eu diria que realizamos cerca de 10% do que a gente tem de projeto de restauração”, avalia.

Mas ele já começa a olhar para as próximas etapas. Com o avanço da implantação da metodologia de agropecuária regenerativa do grupo, ele acredita que, antes mesmo do prazo de cinco anos para atingir toda a área das fazendas próprias, será possível expandir o sistema para propriedades vizinhas, iniciando a fase 3 do projeto.

“Nosso modelo de negócios funciona em hubs”, detalha. “Uma vez que tenho uma infraestrutura centralizada pronta, com time, maquinário, capacidade de armazenagem nas fazendas e conhecimento local, o retorno marginal de anexar áreas no entorno dessas fazendas é muito bom”.

Uma vez equacionado o financiamento da fase 2, a ideia da Luxor Agro agora será desenhar projetos para trazer novos investidores para o entorno desses hubs que estão sendo formados.

“São cinco ou seis anos para implantar nas próprias fazendas, mas não precisa acabar de fazer pra começar a expandir. Se em um ou dois anos já estiver com isso tracionado e em velocidade de cruzeiro, já consigo fazer outros projetos em paralelo”, garante.

E, em um prazo mais longo, a proposta é partir para a criação de outros hubs em outras regiões do Brasil, abrindo a fase 4 do plano. Então, será um negócio ainda mais ambicioso, cujo modelo começa agora a ser desenhado.

Daniela Baeta, CEO da Luxor Agro (em primeiro plano): "serviço militar" no agro

Vista aérea do projeto de pecuária da empresa, com árvores sendo plantadas no perímetro dos piquetes de pastagem

Sistema ILP na propriedade do grupo: grãos para complementar alimentação do rebanho

Infraestrutura da fazenda, com casas para trabalhadores: pessoas são pilar fundamental do projeto

Produção de café arábica em sistema agroflorestal em Minas Gerais