Num país onde o custo do dinheiro é alto, com a taxa básica de juros da economia a 15% ao ano, fontes de financiamento acabam secando. Nessa equação complexa, um setor que demanda recursos constantemente como o agro pode se aproveitar até de embalagens de plástico para abrir portas para linhas de crédito mais baratas.
É justamente esse o olhar que a UPL do Brasil, subsidiária da gigante indiana de defensivos agrícolas, está adotando, ao reforçar sua parceria com a Campo Limpo, empresa paulista especializada em logística reversa e reciclagem de recipientes plásticos no agro.
Hoje, 60% de todas as embalagens utilizadas pela UPL no Brasil já são recicladas, segundo informou Rogério Castro, CEO da companhia no País. Em algumas categorias, como caixas e tampas, a reciclagem chega aos 100%.
Marcelo Okamura, CEO da Campo Limpo, calcula que cada embalagem de 20 litros que é produzida a partir de uma outra embalagem já utilizada deixa de emitir 1,49 quilos de CO2 na atmosfera.
“A cada mil embalagens compradas pela UPL, além da redução de emissão, é evitado o consumo de 45 mil litros de água”, acrescentou Okamura.
“Temos um compromisso de neutralizar as emissões da UPL no Brasil, e esse projeto é um dos que entram na nossa conta de carbono”, afirma Castro.
“Mas, além disso, ele também nos permite acessar linhas verdes de crédito, com juros bem abaixo do que o mercado tradicional oferece”.
Assim, o investimento em ações ESG tem trazido retornos que vão além do relatório de sustentabilidade da empresa. Nos últimos meses, elas tornaram-se um dos trunfos da companhia para manter os financiamentos da empresa ativos no País.
“Quanto mais eu compro essas embalagens recicladas, mais eu sequestro carbono — e mais eu me qualifico para esses financiamentos”.
Rogério Castro conta que nos próximos meses a parceria com a Campo Limpo passará a ser usada como um dos indicadores ambientais da empresa para captar no mercado.
Em conversa com o AgFeed durante a edição 2025 do Congresso da Andav, revelou, sem dar detalhes do montante captado ou das taxas de juros por questões de confidencialidade, que a empresa possui um contrato firmado com o Rabobank para uma linha de crédito verde.
“Já temos alguns financiamentos com subsídios verdes ativos. Se a gente cumpre os indicadores, recebe esse desconto nas taxas. E todo ano a régua sobe. O projeto da Campo Limpo agora entra como um desses critérios”, diz Castro.
Apesar de a empresa não divulgar seus resultados por país, o resultado global explica a necessidade constante de caixa. No ano fiscal encerrado em março de 2025, o faturamento da empresa atingiu 466,4 bilhões de rupias indianas, o equivalente a US$ 5,3 bilhões na cotação atual.
Na época em que a UPL deu um importante salto no mercado brasileiro em 2019 com a compra da Arysta, os executivos estimavam que o Brasil representava um quinto do faturamento da "nova empresa".
Se essa lógica fosse aplicada para os dias atuais, o Brasil estaria faturando pouco mais de US$ 1 bilhão.
O timing para captações mais baratas não poderia ser melhor. A avaliação de Rogério Castro é que, mesmo com sinais tímidos de retomada, o setor de insumos ainda lida com os efeitos da crise de crédito que derrubou empresas de ponta a ponta da cadeia do agro.
“O mercado não está livre dessa questão da liquidez. Os bancos ainda estão se ajustando. CRAs, Fiagros, o próprio Banco do Brasil tem visto suas ações apanharem. Tudo ainda está se recompondo”, pontua. “Mas a gente passou pelo pior. Eu vejo o copo meio cheio”.
Foi justamente nesse momento um pouco mais crítico que a UPL começou a ver o valor estratégico de um projeto, que nasceu há 10 anos com propósitos puramente ambientais.
“Na época ninguém falava em carbono. Era só uma forma de tornar viável o ecossistema da logística reversa”, lembra Castro. “Eu fui até a fábrica da Campo Limpo, ainda no comecinho, e propus o contrato. A UPL foi a primeira a comprar as embalagens recicladas.”
“É um ganho ambiental, mas também social e econômico. A reciclagem ajuda a pagar o custo da logística reversa no Brasil, que é o mais barato do mundo”, diz Marcelo Okamura, CEO da Campo Limpo.
“Mas isso só existe porque a indústria compra. E a UPL é uma das empresas que mais utilizam nossas embalagens no país”.
Segundo Okamura, a UPL também foi a primeira multinacional a adotar, em algumas linhas, os primeiros projetos de embalagens 100% reciclada. A maior parte das embalagens produzidas pela Campo Limpo hoje conta com 95% de materiais reutilizados e 5% novos.
“Quanto mais empresas como a UPL apoiam, mais conseguimos produzir. E com isso conseguimos zerar a pegada de carbono dessas embalagens.”
O esforço ganha ainda mais importância em um momento de aquecimento da operação da Campo Limpo. A companhia projeta um aumento de dois dígitos no volume de embalagens recebidas em 2025, com projeção de superar as 75 mil toneladas neste ano, mostrando um avanço frente às 68,5 mil toneladas de 2024 e acima da previsão inicial de 72 mil.
O faturamento também deve acompanhar a curva: de uma estimativa anterior de pouco mais de R$ 400 milhões, a empresa prevê faturar mais de R$ 450 milhões, um avanço de pouco mais de 10% em um ano.
“Estamos investindo para ampliar a capacidade de recebimento, de transformação em artefatos, tubos, fios, e na produção de mais resinas”, resume Okamura.
No ano passado, a empresa anunciou um investimento de R$ 20 milhões para construir uma planta de resina - que faz o processamento das embalagens recebidas e transforma o plástico em matéria prima para a produção de novos invólucros.
A unidade industrial será implantada em Taubaté, no interior de São Paulo, e vai se somar às plantas de resina, embalagens e tampas que a empresa já possui na cidade. A Campo Limpo também tem uma outra fábrica, em Ribeirão Preto, que produz somente embalagens.
Resumo
- UPL amplia parceria com a Campo Limpo para usar embalagens recicladas como trunfo na captação de crédito verde,
- Empresa já utiliza material reciclado em 60% de suas embalagens e passará a incluir a iniciativa como indicador em financiamentos com subsídio ambiental, como o firmado com o Rabobank.
- Campo Limpo projeta crescimento acima de 10% em volume e faturamento em 2025, com expectativa de ultrapassar R$ 450 milhões em receita