A invasão já começou, mas por enquanto é só um teste. Mas deve ser para valer ainda neste primeiro semestre – o dia D, a princípio, está marcado para o fim de abril, em plena Agrishow, em Ribeirão Preto.
Os invasores formam um exército de agents, criados e treinados com uso de inteligência artificial. Alguns deles já desembarcaram em propriedades rurais brasileiras, onde estão sendo preparados para o momento de efetivamente entrarem em ação.
Quando esse momento chegar, esses agents de IA – como são chamadas as novas ferramentas tecnológicas que permitem a interação entre sistemas computacionais e pessoas – terão como missão impulsionar os negócios da Sol by RZK em uma nova fase de sua estratégia de conquista de territórios no campo.
Nos últimos cinco anos, empresa de conectividade do grupo paulista RZK – que atua em áreas que vão da agropecuária à concessão de serviços públicos, passando por distribuição e locação de máquinas agrícolas, incorporação imobiliária e energia e tem receita estimada em mais de R$ 3 bilhões anuais – seguiu à risca um plano de ocupação do interior brasileiro.
Ergueu cerca de 450 antenas para levar conexão 3G e 4G para áreas rurais brasileiras e oferecer serviços para produtores. Foram mais de R$ 130 milhões investidos para cobrir uma área estimada hoje em 12 milhões de hectares e onde, segundo um levantamento da empresa, haveria mais de 60 mil negócios agropecuários.
A segunda etapa dessa estratégia é buscar o retorno desse investimento, oferecendo novos serviços que permitam extrair mais valor da estrutura já implantada.
Para isso, a companhia atuou secretamente no último ano na formatação das suas novas “armas”, juntamente com forças aliadas
“A gente trabalhou o ano todo em parceria com a AWS (empresa de serviços de tecnologia da Amazon) para construir um motor de inteligência com capacidade de consumir dados de fontes públicas e privadas, mastigar tudo isso e conseguir botar insights para fora”, afirma Rodrigo Oliveira, CEO da Sol by RZK, em entrevista ao AgFeed.
A formatação do que devem ser os “agentes da Sol” foi uma missão colaborativa, que contou também com contribuições de parceiros de negócios como alguns dos principais bancos e seguradoras brasileiros, fabricantes de máquinas e equipamentos, entidades do setor.
“Hoje, 90% das propriedades rurais já têm algum tipo de conectividade, nem que seja só pra emitir nota fiscal. Então, a criticidade da conectividade vem diminuindo no setor”, diz Oliveira
“A gente investiu muito na construção de pontes e rodovias para tirar os dados do campo. Mas o que está sendo feito com esses dados na prática?”.
Foi a partir dessa pergunta que o grupo começou a buscar soluções que, a partir dos dados do agro, gerassem ganhos para o próprio agro.
“Mas não necessariamente só aquele ganho da produtividade, da quantidade de saco de soja produzido na fazenda”, afirma.
Oliveira avalia que hoje a inundação de dados disponíveis aos produtores que investiram em digitalizar suas operações nos últimos anos acabou, muitas vezes, levando esse investimento com a correnteza.
Ele conta que visitou muitas fazendas em que havia centros de operações agrícolas, com dashboards mostrando uma imensidão de infomações, e perguntada ao produtor: “Ok , amigo, para que você usa esse dado?”
“Eu fiz essa pergunta algumas vezes. E o nível de utilização efetiva, mesmo com um dashboard bonito ali, era baixíssimo. Ainda era para controle de erro, não era para otimização de performance”.
Então, a missão colocada sobre a mesa junto aos aliados foi desenvolver tecnologia para traduzir isso e botar isso na frente de uma forma inteligível para quem está no meio.
“E aí foi que nasceu o conceito de tecnologia do estilo dos agents. E está começando, é um hype novo no mundo da tecnologia”, diz.
“Os agents de inteligência artificial são assistentes, são entidades que conseguem consumir dados, interpretar dados, aprender com eles e entregar isso para você de uma maneira inteligível”, defino.
Nos últimos meses de desenvolvimento, essa ideia se transformou nos primeiros protótipos, que foram ganhando ares de produtos e que agora passam por testes de campo em propriedades de clientes.
Os agentes da Sol se propõem, segundo Oliveira, a interagir com os produtores e seus funcionários de maneira direta, na linguagem adequada a cada um.
“O agent conversa com o produtor com uma voz que parece humana e, com o motor de inteligência artificial ali na conversada, se o ele mandar um WhatsApp, um áudio, vai receber uma resposta do jeito que ele entende e no canal que ele utiliza no seu cotidiano”.
Ao mesmo tempo em que Sol e Amazon desenvolviam o cérebro da IA, os demais parceiros ajudavam a “treiná-la”, inserindo da base grandes volumes de informações. Com isso, os bancos ensinavam a ferramenta sobre crédito, as seguradoras sobre seguro, as indústrias sobre as áreas de atuação de seus produtos.
“O agent possibilita que o produtor que não tem o agrônomo dele tenha um agrônomo, que tenha um advisor financeiro. E para o banco que não tem capilaridade, chegar em muitos produtores, conhecer esses produtores. O agent arredonda essa história e utiliza o máximo da tecnologia”.
O superpoder dos agentes será, segundo os desenvolvedores, a capacidade de absorver conhecimentos profundos sobre as mais diferentes áreas de interesse do produtor e simplificá-los na forma de transmitir a que está na operação das fazendas.
Roberto Santos Bravo, head de tecnologia da Sol, define esse conhecimento como “metacontextual”.
“O agent vai ver a parte da operação, ele vai ver a parte do seguro, ele vai ver a parte do impacto e será um especialista para cada uma dessas partes. Então, será um agente especializado em silo, especializado em safra, em máquinas...”
Ao mesmo tempo, ele terá acesso e conhecimento sobre os dados “hiperlocais” da fazenda, de sua região, para combinar, em suas análises com a grande massa de conhecimento que foi treinado.
Bravo traz um exemplo simples, segundo ele, de uma ação prática desses agents no universo das máquinas.
“Basicamente, eles leem todos os documentos possíveis que já existem de manuais das máquinas de todas as grandes marcas. Ele entende isso, conhece os dados de telemetria da fazenda e, a partir disso, consegue explicar para cada operador o que ele precisa fazer para garantir que a máquina esteja cumprindo os requisitos para garantia da máquina”, diz.
“Também conseguem explicar o que tem que fazer para estar dentro do contrato de seguro e gerar alertas: ‘Olha, a cada seis horas, você precisa fazer uma limpeza, a sua aceleração tinha que estar de tal forma...”
Um ponto destacado da ação dos agentes é justamente essa proatividade, gerando insights e alertas para os diferentes níveis da operação, do proprietário ao operador, a partir de um conjunto de informações hoje disponíveis, mas não acessadas, como dados de manuais de máquinas ou de contratos de seguro. “Na prática, ninguém lê”, pontua Oliveira.
“A gente joga tudo isso dentro de uma máquina que lê, entende, correlaciona e entrega as informações de forma simples e proativa e ela vai e dizer: ‘Olha, meu amigo, você vai sair para operar hoje, faça isso e isso ou você pode ter um problema’”.
No QG da Sol by RZK, em São Paulo, a tática aplicada com os agentes é tratada pela sigla MRV. “Eles monitoram, reportam e verificam informações com muito mais precisão”, diz Bravo.
“Com isso, vamos conseguir atender uma escala muito ampla de produtores, desde o produtor que está em um momento muito básico da jornada até aquele que já entendeu as ferramentas, mas não consegue trabalhar com elas de maneira contínua”, completa Oliveira.
O CEO da companhia não revela quem são as empresas que já formam o corpo de aliados no treinamento do seu exército de agentes. Diz que estão entre as maiores do País nos segmentos, sem revelar identidades.
A única pista nesse sentido é sobre a presença da fabricante de máquinas John Deere, uma parceira da Sol desde os primeiros movimentos para o desenvolvimento e a comercialização de seus produtos de conectividade.
“A John Deere continua sendo uma parceira e investe muito nessa avenida de IA. Tem um sistema fantástico e a gente tem uma relação muito boa nessa troca de ideias de como pegar um sistema de máquina e levar isso pro mundo de um ecossistema de tecnologia”, diz Oliveira.
O que ele não esconde é a alta expectativa da companhia com o impacto que seus agentes podem gerar no mercado e, consequentemente, no modelo de negócios da empresa.
Oliveira diz que, desde seu início, em 2020, a proposta da Sol by RZK não era ser um a empresa de infraestrutura de telecomunicações, cujo trabalho se esgotava com a construção das torres.
Elas eram, na verdade, o início de um plano de venda de serviços, que agora deve ganhar ainda mais corpo. Tanto que a companhia não cobrava diretamente a instalação das estruturas, mas oferecia contratos de longo prazo (mínimo de cinco anos) para a utilização da conectividade que elas levavam.
Agora, acredita, é hora de acelerar essa estratégia. “A iniciativa dos agents vai ser o nosso carro-chefe já durante esse ano”, afirma. “A gente deve virar os canhões para isso, para colocar essa tecnologia em uso para os clientes fortemente já a partir do momento do lançamento”.
A ambição é terminar 2025 com os novos produtos como “nosso grande motor de crescimento, com pelo menos 60% dos nossos contratos vindo desse negócio de inteligência de dados”.
No ano passado, o braço de tecnologia da empresa recebeu aportes superiores a R$ 10 milhões.
Os investimentos em conectividade devem continuar, mas ele antecipa que, a partir de agora, uma boa parte dos recursos irá para o desenvolvimento e a implantação dessa tecnologia em campo.
Em um primeiro momento, a companhia mapeou um universo de aproximadamente 200 produtores, que já integram a carteira de clientes, como aqueles com potencial para contatarem os agentes e coloca-los em ação. Será só o início de uma invasão?