Ressonância magnética na agroindústria? Para a Fine Instrument Technology (FIT), empresa com sede em São Carlos (SP), a resposta é sim.
Por mais que a tecnologia esteja normalmente associada a exames de saúde, a companhia aposta em transferir a mesma aplicação para fazer análises de qualidade e de controle de processos na produção de óleos e gorduras vegetais.
O CEO e sócio da FIT, Daniel Consalter, doutor em física que já está na empresa há mais de 15 anos, explicou ao AgFeed que o produto desenvolvido pelo grupo, o SpecFit, faz análises para vários produtos originados no agro - carnes, cevada, malte, algodão, amendoim, milho e soja - mas que a principal atuação da empresa está na palma, em especial com as indústrias processadoras do óleo da planta.
“Apesar do Brasil não ser o principal destaque nesse produto, ele é relevante no consumo. Hoje atendemos 90% do mercado brasileiro de óleo de palma e, fora do País, já respondemos por metade do market share da América Latina”, contou o CEO.
Por aqui, a empresa tem como clientes a Agropalma, a BBF (Brazil BioFuels), BBB (Belem Bioenergia Brasil) e Denpasa no óleo de palma. No óleo de algodão atende a Icofort e na indústria de bebidas tem a Ambev como cliente, que utiliza o equipamento para controlar o processo de produção do malte ao mesmo tempo em que garante que a matéria-prima é de qualidade.
Na América Latina, atende as colombianas Daabon e Palmeiras Colômbia e a equatoriana La Fabril. Fora do continente, tem atuação nos Estados Unidos, Europa e Ásia.
Atualmente, a empresa está em processo para expandir sua atuação internacional no principal mercado do óleo de palma: o Sudeste Asiático, onde estão países como Tailândia e Malásia, que abrigam as maiores empresas globais do segmento e onde a empresa já tem clientes. O CEO afirmou que a empresa tem participado de feiras internacionais nesses países para estreitar a relação com o mercado local.
Consalter revelou ao AgFeed que a meta para 2025 é fazer a empresa voltar a crescer. Depois de faturar R$ 10 milhões em 2023, ele conta que, num processo de ajuste e com alguns problemas relacionados à Capex, viu a receita cair no ano passado, e projeta pelo menos “empatar” a arrecadação com 2023 neste ano.
Hoje, o faturamento da companhia está dividido em 50% de vendas internas e o restante tem como origem a exportação, com maior exposição ao setor agro. Fora dele, faz análises para tecidos, polímeros e até rochas.
No modelo de negócio, a FIT vende o equipamento às indústrias e, num modelo Saas (software as a service), consegue entregar programas que ajudam o cliente a controlar o processo feito através da análise.
“Ele tem o equipamento próprio mas com nossos softwares ele consegue fazer filtragens, selecionar fornecedor. Hoje, em parceria com uma empresa da Malásia, entregamos uma IA que prediz manutenções nos equipamentos que ele usa na extração, por exemplo”, explica o CEO.
Ele cita que tudo é personalizável na FIT, a depender da demanda industrial que a empresa recebe. Consalter conta que quando recebeu a demanda da indústria de cerveja, sua equipe adaptou tanto o hardware quanto o software para solucionar o que era proposto.
Desde sua fundação em 2005, a empresa conseguiu alguns financiamentos via Fapesp e Finep, que segundo Consalter, somaram mais de R$ 5 milhões. Também atraiu a NT@Agro, firma de investimentos que tem como acionistas Marcos Molina, fundador e presidente do conselho de administração da Marfrig, e Olavo Setubal Jr., um dos herdeiros do banco Itaú, e Antonio Maciel Neto, ex-CEO de empresas como Ford, Suzano, Caoa/Hyundai e Grupo Itamarati.
De acordo com o site da NT@agro, 30% do capital social da FIT ficou com a empresa de investimentos.
A primeira investidora-anjo da empresa foi Silvia Azevedo, farmacêutica formada na UFRJ que até hoje é atuante na firma, participando da sociedade ao lado dos investidores e de Daniel Consalter.
A FIT nasceu, segundo Consalter, na ideia de comercializar equipamentos de ressonância magnética para consultórios médicos e hospitais. Logo nos primeiros anos de vida, com apoio da Finep, a empresa buscava fazer escalar o equipamento, e foi aí que Consalter entrou na empreitada, como pesquisador bolsista.
“Por uma série de razões e pela complexidade do setor, a ideia de atuar com equipamento médico não deu certo. Decidimos primeiro ir para São Carlos, onde há muitos especialistas na área da ressonância e foi lá que conhecemos a Embrapa e resolvemos pivotar”, conta Consalter.
Na época, a estatal, mais precisamente a Embrapa Instrumentação, já atuava com ressonância para análises de algumas cultivares. O primeiro SpecFit nasceu de uma parceria com a empresa de pesquisa.
Num primeiro momento, a empresa atuava vendendo o equipamento para outros pesquisadores. “Nossa primeira venda foi para a UFRJ, que precisava fazer análises de rochas. Quando incorporamos o desenvolvimento da Embrapa, fomos de cara para o óleo de palma”.
Nos próximos anos, Consalter vê a FIT entrando em novos mercados que ele considera promissores. Ele cita a indústria de amendoim numa crescente, mas principalmente quer fazer parte do mercado de biocombustíveis.
Ainda sem clientes, mas já conversando com o setor, ele cita produtores de biodiesel e também produtores de óleo de macaúba. “Tem cliente e tem negócio, ao mesmo tempo que temos a solução”.
“O óleo de macaúba ainda não existe em escala industrial, mas deve receber investimentos, principalmente olhando para a produção de bioquerosene de aviação. Queremos estar desde o começo desse mercado”, diz.
Consalter acredita que a tecnologia de ressonância magnética se apresenta como substituto sustentável de métodos de análises potencialmente impactantes para o meio ambiente.
Isso porque a análise feita com essa tecnologia não destrói a amostra e não gera resíduos pois não utiliza processos que usam produtos químicos, como titulações com substâncias ácidas ou básicas, reações que utilizam catalisadores como o mercúrio ou a cromatografia gasosa.
“A ressonância magnética se tornou ainda mais relevante para a indústria de óleos vegetais a partir do momento em que a ‘agenda verde’ ganhou grande valor no Brasil e no mundo”, diz.
Resumo
- FIT usa ressonância magnética para digitalizar análises de qualidade e controle de processos na produção de óleos e gorduras, como de palma, algodão, soja e até cervejas.
- Empresa aposta na palma como carro-chefe e projeta retomar crescimento em 2025 após queda de faturamento em 2024. Em expansão, mira Sudeste Asiático.
- Com tecnologia própria desenvolvida junto à Embrapa e modelo SaaS, FIT já recebeu mais de R$ 5 milhões em fomento e tem entre sócios a NT@Agro, de Marcos Molina e Olavo Setubal Jr.