Depois de cinco meses de discussões e negociações no Senado, o texto da Reforma Tributária (PL 68/2024) voltou para a Câmara dos Deputados para sua tramitação final e foi aprovado na noite de terça-feira (17) por 324 votos a favor e 123 contrários.

Um dos pontos de maior expectativa para o agronegócio estava relacionado aos itens da cesta básica, que terão alíquota zero.

Inicialmente, o texto havia deixado de fora da cesta itens como os óleos de milho e canola. No entanto, a redação mantinha o óleo de soja sem tributação, o que gerou preocupações de disparidade no setor.

Após rodadas de negociações entre Abiove e a Frente Parlamentar Agropecuária (FPA), o texto final saído do Senado retirou o óleo de soja da cesta e o colocou juntamente dos demais, onde terão desconto de 60% sobre a tarifa de referência.

De volta à Câmara, os itens da cesta foram mantidos. Longe de ser o cenário ideal para o setor de óleos vegetais, a exclusão desses produtos da cesta acabou sendo considerada uma vitória, já que manteve todos os produtos do segmento no mesmo patamar.

“Com isso, teremos uma situação de isonomia para os óleos vegetais, todos irão disputar o mercado de forma igualitária", pondera o diretor de Tributação e Negócios Jurídicos da Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove), Dalton Cordeiro de Miranda.

Apesar da equiparação entre os óleos, a incidência do imposto, ainda que com descontos, deve deixar o produto mais caro para o consumidor final.

O advogado e sócio de Tax no escritório Pinheiro Neto Advogados, Luiz Roberto Peroba, explica que a redução de 60% na tarifa é substancial, mas os 40% sobre da tarifa de referência "devem gerar um aumento em torno de 10% sobre os preços finais dos produtos, considerando a alíquota padrão em 26,5%", calcula.

Segundo o especialista, o agronegócio foi um dos setores que mais trabalhou e também o que mais conseguiu ser beneficiado pela regulamentação.

“Houve melhor detalhamento das regras e das exceções, o que proporciona um cenário de maior segurança jurídica para o setor", avalia.

Compensação com exportações

Se por um lado o setor de óleo vegetais saiu afetado pela exclusão dos produtos da cesta básica, por outro, a alteração do artigo 82, que trata da suspensão do pagamento do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e da Contribuição Sobre Bens e Serviços (CBS) na venda de produtos agropecuários in natura que sejam industrializados e exportados deve ajudar a compensar a tributação inicial.

Miranda, da Abiove, explica que o texto inicial permitia a suspensão do pagamento dos impostos apenas para as comerciais exportadoras. Já o texto saído do Senado e aprovado pela Câmara, passou a considerar também incentivos para a agroindústria exportadora.

"Não foi uma compensação, mas sim um balanceamento. Tivemos, de uma lado, uma perda na questão da cesta básica e, por outro, um ganho que vai incrementar a agroindústria nacional, gerar mais empregos e incentivos para a indústria de óleos vegetais", avalia.

Na prática, o texto prevê que as indústrias exportadoras terão até 180 dias a partir da compra da matéria-prima para processar e exportar os produtos. Caso esse prazo exceda e a empresa decida destinar o produto processado para o mercado interno, deverá recolher o IBS e CBS referentes às operações no mercado doméstico.

“Esse ajuste no texto é um incentivo para a agroindústria nacional, porque não implica em multas ou sanções, desde que os prazos sejam cumpridos e dá maior garantia para vender tanto no mercado externo quanto no interno", pondera o advogado.

Para Miranda, esse mecanismo de balanceamento deve contribuir para estimular a agroindústria, já que haverá a flexibilidade de atender tanto ao mercado interno quanto ao mercado externo.

“Vemos a perspectiva de aumentar o esmagamento de soja, porque além da reforma que trará esse mecanismo de balanceamento, temos a lei do combustível do futuro, que deve estimular esse setor ainda mais".

Imposto Seletivo

Um dos pontos do texto alterado pela Câmara foi a inclusão das bebidas açucaradas dentro da alíquota adicional do Imposto Seletivo (IS), popularmente conhecido como “imposto do pecado". Esse trecho havia sido derrubado pelos Senadores, mas foi colocado de volta no projeto pelos deputados.

O imposto do pecado foi criado para taxar bens que causem mal à saúde ou ao meio ambiente. A tarifa adicional do IS ainda não está definida, mas será cobrada em adição à alíquota padrão do Imposto de Valor Agregado (IVA) de 26,5%.

“Esses percentuais serão definidos posteriormente em uma lei ordinária", explica a especialista em direito tributário Diana Castro, da Tauil & Chequer Advogados.

Durante entrevista em Brasília horas antes da votação, o relator do texto final, deputado Reginaldo Lopes (PT-MG) justificou o retorno desse e demais itens ao imposto do pecado como uma forma de não onerar a alíquota de referência, o que causaria impactos sobre todos os consumidores.

Devolução de créditos

Um ponto do texto que ainda causa dúvidas para o setor exportador brasileiro é sobre como funcionará o prazo para a devolução de créditos após operações comerciais.

Diana explica que atualmente já existe um mecanismo de devolução de créditos, mas que ele é bastante ineficiente já que as empresas esperam meses, até anos, para ter a devolução, o que acaba impactando na competitividade do negócio.

“A proposta da reforma é que esse período seja reduzido para 90 dias, simplificando o sistema", afirma.

Ainda na discussão relacionada aos créditos, outro aspecto que preocupa os exportadores está relacionado aos casos em que uma empresa possui créditos a receber, mas um deles apresenta algum problema ou irregularidade.

Miranda, da Abiove, explica que, no texto atual, subentende-se que se uma empresa tiver dez créditos a receber e um deles apresentar problemas, todos os demais serão bloqueados. “Ainda não está claro como irá funcionar essa regra de suspensão".

Agora, o PL deverá ser enviado ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para sanção, ou vetos de artigos.