O discurso sobre a quebra do equilíbrio climático do planeta sobe de tom a cada ano. De “crise climática”, passou-se à “emergência climática” e de “aquecimento global”, para “ebulição global”.
E não é para menos. As previsões sobre as consequências das mudanças do clima, inequivocamente provocadas pela ação da humanidade, bateram à nossa porta antes da hora, com ondas e calor, tempestades, alagamentos, secas e vendavais nunca antes experimentados.
Enquanto os Estados discutiram na COP 28, realizada nos Emirados Árabes Unidos, os rumos da governança global do clima frente aos alarmantes resultados do último relatório publicado pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) em 20 de março deste ano, coube às empresas o questionamento acerca de seu papel nesse cenário.
É inegável a necessidade da diversificação de atores na governança global do clima, dentre os quais há que se destacar o papel da iniciativa privada para atingir os objetivos comuns relacionados às mudanças climáticas.
Para Elinor Ostron, ganhadora do Prêmio Nobel de Economia no ano de 2009 com tese que permanece atual, ainda que haja esforços globais, caso estes esforços não sejam apoiados e encampados regionalmente e localmente, não irão funcionar. Para a autora, os benefícios globais somente podem ser gerados por ações locais.
E é neste ponto que se concentra o papel das empresas, no agir local.
Pelo fato de as empresas terem alcançado, em muitos casos, patamares de poder econômico superior ao de alguns Estados nacionais, fica evidente que podem arcar economicamente com a responsabilidade por seus atos e, inclusive, agir de modo a alterar, como menciona Clodomiro Bannwart Júnior, estudioso sobre a ética empresarial, “qualidade de vida e o bem-estar social das pessoas que dela dependam”.
Evidente também que, em razão do processo de conscientização da sociedade a respeito das questões ambientais, em especial da finitude dos recursos naturais e dos impactos que as atividades produtivas geram no meio ambiente, a cobrança e responsabilização das empresas, no que tange à sua interação com o meio ambiente, aumentou significativamente.
Ricardo Abramovay, professor titular da FEA/USP, afirma que é cada vez mais importante o “capital reputacional” das empresas e que isso é percebido pelas organizações da sociedade civil, que passam a cobrar comportamentos não predatórios das empresas.
Assim, mudar a maneira como as empresas agem, caminhando para ações que visam o desenvolvimento sustentável, não seria apenas vital para a preservação do planeta, mas também a salvação da própria empresa, conforme ensina Élisabeth Laville, pioneira no estudo da sustentabilidade na França.
Em contrapartida, de acordo com o relatório “Better Business, Better World”, elaborado pela Comissão de Desenvolvimento Sustentável da ONU, há cerca de 12 trilhões de dólares em oportunidades de negócios até 2030 e a efetivação dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável pode gerar cerca de 380 milhões de novos postos de trabalho até 2030.
Não por coincidência, o Brasil, que tem pretensão de liderar os debates globais sobre a proteção do meio ambiente, teve a delegação com maior participação de empresas na COP desse ano. A imprensa registrou a presença, entre outros, do Itaú, Vale, JBS, Ambipar e Gerdau.
O objetivo das empresas foi levar ao debate da COP as necessidades dos setores econômicos e gerar oportunidades de financiamento de projetos que estejam de acordo com as políticas de sustentabilidade e combate às mudanças climáticas.
Luciana Nicola, diretora de Relações Institucionais e Sustentabilidade do Itaú Unibanco afirmou, em entrevista para o Estadão, que daqui para frente as empresas devem estar engajadas em ações, pois não há mais tempo.
Vai ao encontro do discurso empresarial o Plano de Transformação Ecológica, que vem sendo desenvolvido pelo Ministério da Fazenda e tem como objetivos (i) promover o aumento da renda por meio da geração de empregos verdes; (ii) reduzir a pegada ambiental e a emissão de gases de efeito estufa; (iii) promover o desenvolvimento equitativo por meio da difusão de benefícios e distribuição de renda.
O Plano, que ainda não foi oficialmente lançado pelo Ministério da Fazenda, conta com seis eixos – finanças sustentáveis, adensamento tecnológico, bioeconomia, transição energética, economia circular e infraestrutura verde e de adaptação.
Os seis eixos serão desenvolvidos por meio de instrumentos financeiros, fiscais, regulatórios, administrativos, operacionais e de monitoramento e fiscalização, o que significa que haverá muita oportunidade de crédito e financiamento, além de incentivos fiscais para os empreendimentos que se engajarem na agenda em prol do combate às mudanças climáticas.
Parece, afinal, que a adequação das empresas a um modelo de economia verde e de baixa emissão de carbono pode, além de garantir que a vida humana não desapareça da terra, ser também um bom negócio.
Ianara Cardoso de Lima, especialista em Direito Ambiental e mestre em Direito Negocial, é sócia da área cível no escritório Diamantino Advogados Associados.