Se uma das regras do sistema capitalista é “seguir o dinheiro”, o agronegócio no Brasil, que tem praticamente sustentado o crescimento econômico do país, parece estar sendo acompanhado de perto por investidores e empresários, até mesmo de outros setores.
O volume de fusões e aquisições fechados neste ano no setor são uma amostra dessa tendência. Levantamento feito pela PwC, uma das maiores empresas de consultoria e auditoria do mundo, revela que em 2023, de janeiro a setembro, foram 65 transações do gênero realizadas dentro da cadeia do agronegócio.
Segundo o levantamento, houve um crescimento de 30% no número de operações no setor, enquanto outros segmentos apresentaram quedas de até 23% neste ano.
Cerca de dois terços destas operações aconteceram no segmento de máquinas e sementes, segundo a PwC. Também se destacam os M&As em tecnologia, com cerca de 16%, consumo, com pouco mais de 5%, e químicos, com 3,5%.
“O nível de profissionalização do setor, os seguidos recordes de produção e o financiamento privado devem contribuir para o crescimento de fusões e aquisições no Brasil”, afirma o sócio da PwC Brasil, Leonardo Dell’Oso .
Dell’Oso ressalta que as empresas nacionais têm puxado esse aumento no volume de fusões e aquisições, substituindo a tendência de predominância de capital estrangeiro dos últimos anos.
“Isso sinaliza a potência do agronegócio brasileiro, que segue em franca expansão. Embora o capital estrangeiro seja importante, isso mostra que não há dependência de capital externo”, avalia o especialista.
Outra consultoria que acompanha de perto a movimentação de fusões e aquisições no agronegócio brasileiro é a Redirection International, com escritórios em Curitiba, Nova York e Londres.
Em estudo recente, a Redirection projeta que os M&As no segmento de máquinas devem continuar em ritmo acelerado, já que o crescimento nas vendas deve ser de 22% até o fim de 2026.
Segundo o levantamento, o número de máquinas vendidas deve passar de 71 mil unidades em 2023 para quase 86,5 mil em 2026.
A Redirection aponta o crescimento da população e da demanda por alimentos, o aumento da rentabilidade e da inovação no campo, a escassez de mão-de-obra e a expansão da agricultura de precisão e da mecanização como fatores que devem impulsionar a venda de máquinas.
“Com o início do ciclo de redução na taxa de juros, os investimentos em ativos fixos devem ser intensificados e, com isso, o mercado projeta um crescimento em torno de 10% a partir do segundo semestre deste ano”, ressalta Adam Patterson, sócio da Redirection.
Patterson aponta outros segmentos que têm bastante potencial para impulsionar o número de fusões e aquisições, como de defensivos e fertilizantes.
Participação do agro ainda é baixa
Outro ponto levantado pelo sócio da Redirection é a ainda baixa participação do agronegócio no total de fusões e aquisições no Brasil.
“O agro responde por menos de 10% das operações. Mas com certeza o setor pode ganhar novos patamares em breve, em especial quando pensamos no avanço tecnológico e nas maiores exigências de investimento em ESG”, diz Patterson.
Ele lembra que, de modo geral, o agronegócio no Brasil ainda é bastante pulverizado, com muitos pequenos produtores rurais. “Movimentos de profissionalização e internacionalização devem contribuir para elevar o número de fusões e aquisições nos próximos anos”.
Ele afirma que, atualmente, cerca de 70% dos negócios agropecuários no Brasil são tocados por empresas familiares. “A necessidade de avançar em escala e de mecanização para atingir esse novo patamar facilita movimentos de consolidação”, afirma o sócio da Redirection.
No segmento de insumos, por exemplo, Patterson lembra do objetivo traçado pelo governo brasileiro de depender cada vez menos de itens importados, especialmente da Rússia, além da demanda cada vez maior por biológicos.
Segundo dados da CropLife Brasil, entidade que representa a indústria de insumos, as vendas de produtos biológicos crescem 30% em 2023, com expectativa de fechar o ano com avanço de 35%, movimentando cerca de R$ 4 bilhões.
Uma publicação da Embrapa Soja de 2022 sobre bioinsumos projeta que o setor alcançará o volume de R$ 16,9 bilhões em 2030, como destaca a Redirection em outro relatório voltado para este segmento.
“Ainda há a expectativa para a regulamentação da cadeia produtiva e a profissionalização do setor nos próximos anos, principalmente devido à implantação do Programa Nacional de Bioinsumos, lançado em 2020, o que deve fomentar o desenvolvimento industrial neste segmento”, afirma Vinicius Oliveira, economista e sócio da Redirection.