As grandes empresas brasileiras que planejam listar ações nos Estados Unidos devem estar preparadas. Os investidores estão cada vez mais exigentes quando o assunto envolve meio ambiente, papel social e governança, temas que são resumidos na sigla em inglês ESG.
A Tyson Foods, uma das maiores processadoras de proteína animal do mundo, vai ter uma assembleia anual agitada, principalmente por esse maior nível de cuidado exigido pelos acionistas.
A reunião está prevista para o dia 8 de fevereiro. E depois de ser questionada por uma entidade que representa a Igreja Batista sobre o uso de trabalho infantil em algumas de suas plantas, a companhia já é cobrada para ter maior vigilância contra o desmatamento de florestas.
O Green Century Capital Management, um dos acionistas da Tyson, apresentou nesta sexta-feira, dia 26, uma proposta a ser deliberada na assembleia. A gestora quer que a companhia assuma o compromisso de zerar o desmatamento em toda sua cadeia de fornecedores até 2025, com verificação independente.
“Os acionistas pedem que a Tyson acelere seus esforços para eliminar o desmatamento, a conversão de vegetação nativa e a degradação de florestas na sua cadeia de suprimentos”, diz o pedido do Green Century.
No documento, um dos números mais importantes apresentados fornece uma noção mais exata desse nível de exigência por parte dos investidores quando o assunto é meio ambiente.
Com dados levantados pela ONG Carbon Disclosure Project (CDP), o Green Century afirma que em 2023, 746 instituições financeiras que têm US$ 136 trilhões sob gestão acionaram quase 15 mil empresas para fornecerem dados sobre sua atuação ambiental.
Os números representam um crescimento expressivo ante 2022, segundo o acionista da Tyson. Naquele ano, foram 263 instituições com US$ 31 trilhões sob gestão, com questionamentos feitos a 1,4 mil empresas.
Ainda neste âmbito, o Green Century lembra que, em 2021, um grupo de 30 investidores que possuem US$ 9 trilhões em patrimônio assumiu o compromisso de eliminar de seus portfólios empresas de commodities ligadas ao desmatamento.
Em sua página na internet, a gestora se apresenta como “líder em investimentos ambientalmente e socialmente responsáveis”. A empresa tem como controladoras diversas ONGs sediadas nos EUA.
Para sustentar seu pedido, a Green Century cita diversos fatores, inclusive econômicos, que mostram a importância dos cuidados com o meio ambiente para o bom desempenho financeiro da Tyson no longo prazo.
O documento destaca principalmente a importância de preservar a biodiversidade. Outro dado da CDP citado no documento diz respeito a um estudo sobre os impactos financeiros da falta de ações contra o desmatamento.
A ONG identificou um impacto negativo potencial de US$ 80 bilhões em 211 empresas se elas não adotarem políticas para combater o desmatamento.
No mesmo estudo, a CDP afirma que os custos totais para responder aos riscos florestais são estimados em US$ 6,7 bilhões, em um universo de 267 empresas. A organização apontou ainda 182 empresas que relataram oportunidades geradas pelo combate ao desmatamento estimadas em quase US$ 51 bilhões.
A gestora afirma ainda que a Tyson vem falhando em mostrar avanços no combate ao desmatamento dentro da sua cadeia de fornecedores.
O principal problema apontado pelo acionista é que a Tyson, em seu mais recente Relatório de Sustentabilidade, não apresentou qualquer sinal de progresso sobre a política anti-desmatamento.
“A companhia cita um plano para atualizar sua Avaliação de Riscos Florestais e atualizar as metas, mas sem citar um prazo para isso”, diz o Green Century.
Pressão atinge concorrentes
No documento, a Green Century cita o Brasil. Segundo a gestora, o país é um dos fornecedores de carne mais importantes da Tyson, e afirma que aqui, os riscos de desmatamento provocado pela pecuária são altos.
“Empresas como JBS, Marfrig e Minerva dominam a indústria pecuária no Brasil, onde o desmatamento ligado a fornecedores indiretos prevalece e as companhias não monitoram essa cadeia indireta”, diz o documento.
No caso da JBS os sinais de resistência ao seu processo de abertura de capital em Nova York, que está em andamento, são cada vez mais frequentes.
No dia 11 de janeiro, senadores dos Estados Unidos enviaram à Securities and Exchange Comission (SEC, a CVM americana) uma carta sustentando que a listagem da JBS traria riscos aos investidores do país.
Os parlamentares dizem que a empresa tem um histórico de “corrupção, abusos dos direitos humanos, monopolização do mercado frigorífico e riscos ambientais”. Além disso, eles citam que a JBS prejudicaria a competitividade de suas concorrentes americanas.
A gigante brasileira de alimentos, em comunicado, afirma que "a dupla listagem das ações da JBS vai criar valor para a Companhia, para seus mais de 270 mil colaboradores em todo o mundo, para as comunidades em que atua, para seus investidores e demais stakeholders".
Para a JBS, "stakeholders genuinamente interessados no desenvolvimento e crescimento da Companhia e de toda a sua rede de valor apoiam a listagem das ações da JBS em Nova York". Segundo a companhia, "a proposta aumentará ainda mais o escrutínio da já robusta governança da JBS, aderindo aos padrões da Securities and Exchange Commission (SEC) e da Bolsa de Valores de Nova York (Nyse)".
Enquanto isso, a Tyson continua anunciando investimentos na expansão de suas operações.
Também nesta sexta-feira, a mídia norte-americana relata um investimento de US$ 355 milhões em uma nova unidade produtora de bacon no estado de Kentucky. A expectativa da Tyson é que a unidade de 37 mil metros quadrados produza mais de 900 toneladas por semana.
Segundo a Tyson, o bacon responde por mais de US$ 1 bilhão em vendas na companhia, e a nova planta deve gerar 450 empregos na cidade de Bowling Green.