A origem da logfintech Strada, incluindo fusões e alianças entre gigantes do agro, dá a dimensão do potencial do negócio, que promete solucionar uma das maiores dores do agro: gerenciar a logística.
A história começa pela Carguero, plataforma de soluções logísticas criada em 2019 pelas tradings Amaggi e Louis Dreyfus, com investimento de R$ 50 milhões, que depois também passou a ter como sócias a ADM e a Cargill.
Porém, na prática, a Strada só nasceu em 2022, após uma fusão – e um longo processo de avaliação dos órgãos antitruste - entre a Carguero e a Tip Bank (ou Dalablog), empresa de pagamentos para fretes rodoviários.
“Falamos que nós somos uma logfintech, que nasceu da fusão de uma logtech e uma fintech, em que o grande valor que temos é justamente ser uma rede de inteligência conectada com todos os stakeholders da logística rodoviária de cargas para poder receber informação, processar informação e devolver em forma de valor para o nosso cliente”, explicou o CEO da Strada, Rodrigo Koelle, ao receber o AgFeed na sede da empresa, no Cubo Itaú, em São Paulo.
Koelle é engenheiro agrônomo formado pela Esalq/USP e trabalhou por mais de 22 anos na Cargill, morando em diferentes polos agrícolas do País, como Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Goiás, e aprendendo, “em campo”, literalmente, os desafios da logística do agronegócio.
Acompanhou de perto o M&A que resultou na criação oficial da Strada em dezembro de 2022 e, por isso, meses antes se desligou da Cargill – onde estava liderando a área de logística na América Latina - para depois assumir a função de CEO da nova empresa.
“A Strada participa do primeiro momento da jornada de transporte, quando o dono da carga, que é o embarcador, precisa transportar uma mercadoria, até o momento que aquela mercadoria é entregue no seu destino final e o pagamento do frete é realizado. E em tudo o que acontece no meio do caminho, estamos envolvidos”, descreveu.
Essa é a principal característica do negócio. Entre os clientes não estão apenas as grandes tradings que precisam trazer matéria prima e entregar seus produtos na exportação ou ao comprador dos itens industrializados.
A Strada considera “na jornada”, como clientes, o embarcador, aquele que precisa transportar a carga, e faz uma oferta (cotação) do que está disposto a pagar, a transportadora, que publica a carga para os motoristas (terceiro cliente), utilizando o aplicativo da logfintech, e inclui também nesta lista os postos de combustíveis, que integram uma parte deste processo, no pagamento e comprovação dos serviços, em alguns casos.
Ao longo desse caminho, o serviço de conectar contratantes e contratados para transportar uma carga via rodoviária é apenas um dos produtos oferecidos.
Para o embarcador, por exemplo, um serviço comum é o rastreamento da carga, para que ele acompanhe quando saiu e quando vai chegar no destino, fazendo também a gestão de lotes, para que se busque eliminar ineficiências no processo – o que influencia o preço do frete, segundo Koelle.
Outra solução comum entre as “logfintechs” tem sido o suporte financeiro, com a possibilidade de estender prazos de pagamento aos envolvidos ou antecipar recebíveis para transportadores, que precisam normalmente pagar o caminhoneiro bem antes da data que recebem das tradings, por exemplo.
Koelle ressalta ainda, como um diferencial da Strada, o fato de ser homologada pelas seguradoras para gestão de risco, um serviço também bastante demandado pelas transportadoras, para evitar os tradicionais sinistros, como roubo de cargas.
No caso dos motoristas clientes, a Strada também oferece serviços como, por exemplo, uma parceria com a Visa, que permite receber o pagamento pelo cartão ou mesmo ter o vale pedágio depositado na conta digital.
O “quarto cliente”, o posto de combustível, também é envolvido no processo de diferentes maneiras. “No caso de um produtor rural, que comprou uma carga de farelo para alimentação das aves, por exemplo. Quando o motorista chega lá, como ele comprova que terminou a viagem? Ele vai para um posto e o posto recolhe a sua documentação”, explicou Koelle.
Atualmente, são 1,2 mil postos cadastrados no sistema da empresa, segundo o CEO. Na base, estão cadastrados 200 mil motoristas.
O executivo diz que, ao contrário de outras empresas do setor, a Strada não está restrita somente a autônomos ou transportadoras. Participam das transações tanto motoristas CLT, que trabalham para as transportadoras, como aqueles terceirizados ou mesmo cooperativas de carga. “O nosso negócio é a jornada”.
A empresa não divulga o faturamento, mas segundo o CEO, atingirá o breakeven em 2024, sem a necessidade de aportes adicionais para seguir crescendo.
Rumo aos R$ 10 bilhões
Em 2022, primeiro ano de operação, a Strada transacionou em sua plataforma R$ 3,8 bilhões em fretes. No ano passado, mais que dobrou o volume, chegando a R$ 8,2 bilhões. Já em 2024, a previsão é de crescimento, porém em ritmo menor.
“Este ano a empresa deve transacionar ao redor de R$ 10 bilhões. Só não é mais por conta da redução do valor do frete., que afetou bastante o setor, principalmente nesse final de semestre. Vimos valores 20% abaixo da expectativa em relação ao ano passado”, ponderou.
Segundo Koelle, são 5 mil caminhões “que passam pelo ecossistema”, todos os dias. O dobro de motoristas interage solicitando cargas e, nos cálculos dele, há 5 vezes mais caminhoneiros “olhando as solicitações”. No mês de abril, por exemplo, foram mais de 1 milhão de visualizações de oferta de carga.
Outras empresas vêm ganhando mercado nas demandas de logística do agro e oferecendo algumas soluções parecidas com a Strada, como o AgFeed já mostrou em casos como a GoFlux e a nstech.
Rodrigo Koelle garante, no entanto, que a Strada possui diversos diferenciais para seguir buscando sua “consolidação no agro”, com a liderança no setor. E menciona, principalmente, a robustez e o volume que é capaz de transacionar.
Atualmente, 70% das transações têm como origem as operações das tradings e sócias ADM, Amaggi, Cargill e Dreyfus, o que por si só já garante um grande volume a ser transportado.
“Acho que o primeiro grande argumento é que o nosso ecossistema é muito robusto. Além de ter todo o crivo, que o embarcador que está lá de fato. Aquela carga não é fantasma, ela não é duplicada. E o transportador é um cara que passou por toda uma análise, temos um ecossistema com muito volume”, reforçou.
As cargas das transportadoras próprias das tradings hoje passam 100% pela Strada, segundo Koelle. É a chamada “primarizada”. Já o que é feito com terceiros, cada trading faz seu volume na plataforma, “umas mais, outras menos”.
A principal meta do CEO da Strada é inverter a fatia atual, fazendo com que os outros clientes, além das tradings, passem a representar os 70%. Ele acredita que isso será possível em até 5 anos, mas já confia que no final de 2024 terá percentuais maiores para os demais clientes do agro. “Há várias conversas encaminhadas com outras tradings, esperamos ter novidades no segundo semestre”.
Foco no agro e novos produtos
O plano da Strada, pelo menos para este ano, é seguir com foco absoluto no agro e somente mais adiante investir em outros segmentos, disse o CEO.
“Quando eu falo de consolidar no agro, eu quero ser a solução de preferência de todos os principais embarcadores do agronegócio”, afirma.
Hoje 85% das cargas transacionadas na Strada são de soja, milho ou farelo. O restante inclui produtos como fertilizantes, óleo envasado, café e subprodutos da soja. Koelle diz que somente em 2025 pretende voltar a ter mais foco em expandir a presença na indústria de transformação.
Sobre novos produtos, o executivo disse ao AgFeed que uma das novidades a ser lançada em breve é um seguro de cargas com acidentes pessoais, para os motoristas, que chegará com “custo competitivo”.
Ao mesmo tempo, a empresa segue avaliando como poderia agregar valor ao utilizar ainda mais inteligência de dados, gerando recomendações ou índices que levassem os elos da cadeia a ter mais eficiência.
Enquanto isso, um dos caminhos é também estabelecer parcerias com outras empresas de tecnologia. Koelle diz que a Strada já está conectada com empresas que fazem cotações de frete, por exemplo. Há também ferramentas específicas que as ferrovias utilizam para o agendamento de descarga.
“Hoje no Brasil são basicamente duas empresas que operam as ferrovias, já estamos conectados com a Rumo e estamos nos conectando com a VLI”, contou.
Ele diz não precisa desenvolver ferramentas para aquelas funções que não fazem parte do core da Strada. “Vejo muito compartilhamento com empresas, com logfintechs que estão no mercado”.
Incertezas no mercado de fretes
O ritmo de crescimento menor não é influenciado somente pela queda no preço do frete. Segundo o CEO, os problemas climáticos na safra, com a quebra em Mato Grosso e agora as enchentes no Rio Grande do Sul também agravam este cenário.
“Nenhum especialista conseguiu prever essa queda de 20% nos fretes que está ocorrendo no primeiro semestre”, alertou. O executivo avalia que o cenário foi influenciado pela menor comercialização da safra por parte dos produtores rurais e por uma desaceleração na demanda chinesa, que reduziram a necessidade por transporte – pressionado o preço do frete.
Daqui para frente ele diz que o resultado da colheita da segunda safra de milho é um dos fatores importantes para definir a tendência.
“Se a produção for grande o suficiente para atrapalhar sistema logístico, que ainda terá volumes de soja pra escoar, haverá aumento de frete. Se não atrapalhar, o valor não deve subir tanto. Mas ainda é muito incerto para dizer”.
Sobre o Rio Grande do Sul, Rodrigo Koelle descreve o cenário desafiador do momento, já que há muitos pontos de impedimento nas rodovias. Por outro lado, ele conta que a Strada está usando o ecossistema para divulgar cargas de transporte solidário e diz que “está dando muito certo, ajudando a levar alimentos e doações”.
Segundo Koelle, muitos motoristas, para não descer com o caminhão vazio, fazem contato com os interessados, acabam acertando o custo do combustível e pegam estas cargas. “Estamos fazendo essa conexão e está dando certo porque são motoristas sérios que tem compromisso social”.