No próximo mês de setembro as linhas de produção começam a funcionar na nova fábrica da indústria de máquinas agrícolas Jacto, na cidade de Pompeia, no interior de São Paulo, a 500 quilômetros da capital.

Inicia-se, então, uma fase de testes para que, em janeiro de 2024, a unidade passe a operar plenamente. Será iniciada, então, uma nova fase da trajetória da companhia, criada há 75 anos pelo imigrante japonês Shunji Nishimura e hoje capaz de rivalizar, em mercado e inovação, com as gigantes John Deere, Massey Ferguson, Case, New Holland, entre outras.

“Com a planta nova estaremos com o estado da arte em termos de automatização e sistemas de produção”, afirma ao AgFeed Fernando Golçalves Neto, CEO da Jacto. “Cerca de 80% da operação será totalmente robotizada, com todo o sistema de gestão de suprimentos integrado”.

Um parque fotovoltaico de 5 MW deve gerar energia para abastecer a unidade, tornando-a praticamente autossuficiente nesse sentido.

Gonçalves comemora a conclusão do projeto, anunciado há dois anos e construído a um custo não revelado, como um marco da história da empresa. “Vamos multiplicar nossa capacidade de produção e poderemos atender melhor não apenas os nossos clientes locais, mas os de fora do país”, diz.

O nível de automação da fábrica deve elevar, segundo o CEO, os padrões de qualidade dos produtos, uma exigência cada vez maior de clientes internos e externos. Ele espera anunciar nas próximas semanas uma parceria com uma grande operadora de telecomunicações para que a planta seja a primeira do país a contar com equipamentos e sistemas conectados via internet 5G.

De lá, devem sair máquinas de quase todas as linhas produzidas atualmente pela Jacto. Inclusive as novidades em equipamentos autônomos, uma das principais apostas da empresa, e em colheitadeiras para cana.

A unidade atual, também em Pompeia, será reconfigurada para produzir componentes a serem utilizados nas linhas de montagem da nova planta, que terá 96 mil metros quadrados.

A marca é particularmente reconhecida pelos seus produtos para pulverização e adubação, mas recentemente lançou também máquinas voltadas para plantio e tem feito investimentos na área de serviços para agricultura digital, com a grife Jacto Next.

A Jacto exporta atualmente para mais de 100 países da América do Sul e do Norte, África e Europa. E vislumbra a expansão geográfica de suas vendas. Gonçalves esteve recentemente em missão para a China e não será surpresa ter as máquinas laranja da empresa, em breve, rodando por lavouras do continente asiático.

Planejamento centenário

Cada passo desse é planejado com disciplina nipônica pela empresa, com metas de longo prazo perseguidas como se fossem para amanhã. A construção da fábrica, por exemplo, é um dos pilares de um “plano estratégico de 100 anos”, elaborado na virada da década pelos acionistas e executivos da companhia.

“Nós buscamos ver o futuro da Jacto e estudamos várias possibilidades”, afirma Gonçalves. “Criamos um documento que tem um fundo mais aspiracional, mas que também sai das declarações para as ações. Foi quase uma terapia”, compara.

Já há mais de 10 anos a Jacto organizou sua governança corporativa, definindo os papéis da família Nishimura na gestão. Membros da família podem ocupar cargos executivos nas empresas do grupo até os 60 anos de idade – então, transferem-se para o conselho de administração, até a idade-limite de 72 anos.

Em 2019, foi feita a transição de comando para a terceira geração, com a ascenção de Franklim Shunjiro Nishimura para a presidência do Conselho da Holding e do Conselho Curador da Fundação Shunji Nishimura de Tecnologia (FSNT). Ricardo Seiji Bernardes Nishimura, por sua vez, ocupará a presidência do Conselho de Administração das empresas do Grupo Jacto.

“Família forte” é outro dos preceitos do plano centenário. A manutenção dos Nishimura no controle da empresa é ponto pacífico. Atualmente, ele é dividido por cinco holdings dos diferentes ramos de herdeiros do fundador.

São elas que definem os investimentos, conforme o estipulado no planejamento. Eles devem ser feitos sempre com capital próprio – evitar endividamento é outra regra de ouro da família Nishimura.

“A empresa está bem capitalizada”, garante Gonçalves. Com mais de R$ 3 bilhões de receita em 2021, cerca de 60% acima do ano anterior. Os dados de 2022 não foram divulgados, mas o CEO revela ter sido “um ano fantástico, fora da curva”.

Por isso, nem mesmo a mudança de cenário em 2023, com uma redução brusca na atividade em vários setores do agronegócio, altera o ânimo do executivo. Ele admite que a previsão para este ano é de vendas de 15% a 20% inferiores ao anterior, “o que ainda é muito bom”.

E garante que essa rearrumação cíclica do mercado não altera a disposição de investir da companhia. “O momento ainda é de expansão”, diz. “Nessas horas, proporcionalmente, é que investimos mais”. Novamente, aqui, números são preservados em sigilo.

Historicamente, a Jacto aplica 4,5% de sua receita em pesquisa e desenvolvimento. Um dos principais focos desse investimento vai hoje para a área de agricultura digital. “Esperamos estar presentes em 10 milhões de hectares em poucos anos”, afirma o CEO.

Na Jacto Next, sua marca nesse segmento, a proposta da empresa é criar dispositivos e softwares que permitam a conexão de equipamentos de diferentes marcas e idades a um sistema único, permitindo uma visão integrada da gestão de uma propriedade rural.

Um gargalo para essa expansão é a dificuldade em recrutar mão-de-obra especializada em diferentes regiões do Brasil. A estratégia da empresa é montar bases locais para atuação nos principais polos agrícolas.

Em Pompeia, a Jacto solucionou essa questão através da atuação da Fundação Shunji Nishimura, que firmou parcerias com o estado e outras empresas para criar uma instituição especializada na formação de especialistas em tecnologia aplicada ao agronegócio.

A Fatec Shunji Nishimura é hoje referência nacional e atrai mesmo as concorrentes da empresa na busca por profissionais. O nome do fundador, morto em 1999, é uma homenagem mais do que justa.

Visionário, ele criou a empresa a partir de uma oficina para consertos de equipamentos, quaisquer que fossem. E nunca deixou de acreditar que, para se manter crescendo e competitivo, tinha de estar na ponta da inovação.

No início da década de 1980, quando a Jacto já era uma realidade, Shunji Nishimura foi receber uma homenagem no Japão por sua contribuição, como japonês, ao desenvolvimento industrial brasileiro. Aproveitou para visitar algumas fábricas da Toyota.

Na volta, disse a seu filho Jiro, que então presidia a Jacto: “Se essa japonesada resolver vir para o Brasil, teremos de fechar nossa empresa”. O filho, então, foi ao Japão aprender técnicas de gestão que fizeram daquele país um paradigma em gerenciamento industrial, como just in time, kanban e 5S.

Em 1984, a Jacto foi pioneira na utilização desses modelos em suas unidades. Agora, dá um novo passo na mesma direção, pensando nos próximos cem anos. “Não temos pressa”, afirma Gonçalves.