Quando perguntados sobre quais as marcas que mais representam o nosso país, quase um terço dos entrevistados da pesquisa Branding Brasil, realizada pela Agência Ana Couto, uma das mais prestigiadas do País, respondeu Petrobras. Outros disseram que os chinelos da Havaianas, os cosméticos da Natura ou o refrigerante Guaraná eram a melhor tradução da brasilidade.
Apenas 7%, no entanto, disseram que a marca mais importante era o Agro.
A menção, ainda que espontânea, ao setor agrícola mostra a falta de identificação das empresas que fazem parte das cadeias produtivas brasileiras. Há um sentimento de orgulho com o campo e com a agricultura, associada ao desenvolvimento do Brasil. Mas mostra, também, que falta uma percepção clara do setor na construção de valor de uma marca.
No marketing, o termo Branding é usado em uma variedade de contextos, mas significa, basicamente, a gestão estratégica de marca. Abrange um conjunto de ações que as empresas podem adotar para consolidar não apenas uma posição no mercado, mas transmitir propósitos e valores e criar uma conexão com os consumidores e clientes.
O tema é explorado em "A (R)Evolução do Branding", primeiro livro de Ana Couto, a festejada profissional fundadora da agência, que acaba de chegar ao mercado. A obra sintetiza o método que a designer usa nas campanhas de reposicionamento de marca que desenvolve.
Para ela, o Branding envolve três "ondas". A primeira é centrada no produto oferecido pela empresa, seus diferenciais e custo-benefício. A segunda "onda" é dedicada às pessoas e à criação de identificação, fidelização e conexão emocional. A terceira diz respeito ao propósito, envolvendo o impacto e a visão de mundo da companhia.
"Para surfar nessas ondas, tudo deve estar alinhado", diz Couto. O problema, segundo ela, é que falta visão de longo prazo. "Há muito foco no agora", afirma, "mas uma marca forte se constrói com método, disciplina e métricas".
A falta de pensamento estratégico de longo prazo não é restrita ao agronegócio, é claro. Embora tenha nos produtos agrícolas o carro chefe de seu comércio exterior, no ranking das 500 marcas mais valiosas do planeta, elaborado pela consultoria internacional Brand Finance, o Brasil tem apenas três colocados, todos do setor financeiro.
O mais bem posicionado é o Itaú, na 263ª posição. Banco do Brasil e Bradesco aparecem quase no final da lista, em 431º e 477º, respectivamente.
No Top 5, quatro americanas, Apple, Microsoft, Google e Amazon, e uma sul-coreana, a Samsung.
Por muito tempo, o Brasil foi considerado uma economia fechada e muito centrada em commodities. Até hoje, na pesquisa Branding Brasil, a maior parte dos entrevistados diz que o país é forte produtor de commodities. Mas elas não geram empatia ou identificação.
No agronegócio, no entanto, a relação é ainda mais complexa. "Mais do que resistência, há falta de conhecimento sobre os benefícios da construção de uma marca”, diz Ana Couto. A situação, felizmente, vem mudando.
A metodologia de Couto foi criada a partir de muitos trabalhos realizados para a indústria, inclusive dentro do agro. Um dos mais emblemáticos foi feito para o grupo Mantiqueira, maior produtor de ovos do país.
Além de uma nova marca corporativa, a empresa passou por uma transformação verbal e visual. Foi criada a marca Happy Eggs, que tenta comunicar o valor envolvido de um produto obtido a partir de galinhas livres, e a linha Mantiqueira em Casa, com e-commerce e clube de assinatura.
A profissional também esteve à frente do desenvolvimento do nome e da marca da empresa resultante da fusão entre Shell e Cosan. Raízen, escolhida a partir da união de "raíz" e "energia", faz referência à cana de açúcar, matéria-prima fundamental dos negócios da empresa. O design também ajuda a modernizar a companhia e apresentá-la como fonte de energia limpa e renovável.
Problema histórico
Por muito tempo, o mercado brasileiro de publicidade ficou focado em anúncios e comerciais, um método mais tradicional de divulgar uma marca ou um produto. "Nesse contexto, o Branding sempre apareceu a reboque da publicidade", diz Ana Couto.
Embora eficaz a curto prazo, a estratégia não cria uma conexão longeva com o cliente. É o caso de grandes redes de varejo, que quando deixam de injetar dinheiro no horário nobre da televisão perdem relevância rapidamente.
Lá fora, principalmente nos Estados Unidos, a construção de imagem e de marca capazes de fidelizar os clientes é disseminada há mais tempo. É por isso que algumas empresas são tão importantes mundo afora.
Novamente, a pesquisa Branding Brasil fornece dados relevantes. Entrevistados disseram que Coca-Cola, Nike, Adidas e Avon, todas estrangeiras, são marcas que representam o país.
A conexão da Nike com a Seleção Brasileira ou a imagem de celebração associada à Coca-Cola são exemplos de como o posicionamento e a comunicação de valores podem fazer a diferença.
"Não basta se associar a um clube de futebol. É preciso pensar como aquilo faz sentido dentro da estratégia", diz Couto.
Dificuldade global
Embora o Brasil não tenha muitas empresas entre as mais valiosas e reconhecidas no ranking global, a mesma lista indica que há uma barreira natural para as companhias ligadas ao agronegócio.
Entre as 100 mais valiosas, há muitos nomes famosos da tecnologia, das finanças e do setor automotivo. Mas poucas com DNA do campo. O Banco Agrícola da China, em 16ª posição, é uma empresa do setor financeiro que presta serviços para o agro. A Shell, como empresa de energia, evoca uma conexão com o agro. Mas só.
O Brasil tem ativos importantes e poderia explorar, por exemplo, a conexão com a natureza, o potencial de geração de energia limpa e a capacidade produtiva capaz de alimentar o mundo. São frentes em que o agro é forte, mas ainda pouco exploradas de forma eficiente.
No trabalho com a Cosan, Couto afirma que buscou inspiração na atuação nos "setores de maior potencial para o país: energia renovável, agronegócio, óleo e gás, mineração e créditos de carbono", além de associar a empresa a uma referência de gestão para o país.
O potencial e os bons exemplos existem. Basta que o agronegócio entenda o potencial da boa comunicação e do valor de uma marca forte. E, assim, assumir o protagonismo mundial.