Sertãozinho (SP) - A nova gestão do Sindag, o Sindicato Nacional das Empresas de Aviação Agrícola, ainda não completou dois meses, mas já tem que lidar com um problema que pode impactar todo o setor.

Hoana Santos saiu do conselho, assumiu a presidência da entidade em maio, e atravessa um voo com muitas turbulências desde então.

Isso porque nos últimos dias de maio, o STF manteve em execução uma lei do estado do Ceará que proibiu a pulverização aérea nas fazendas da região. Originalmente, a lei foi sancionada pelo então governador Camilo Santana em janeiro de 2019, mas ao longo dos anos foi contestada pela Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA).

A entidade alegou uma violação à livre iniciativa e aos objetivos da política agrícola com a proibição da pulverização aérea nas plantações cearenses.

Contudo, a ministra do Supremo e relatora do tema, Cármen Lúcia, e outros membros do colegiado votaram recentemente a favor da constitucionalidade da lei.

O Sindag, que conta com 230 empresas de aviação, algo em torno de 90% do setor, e 28 de drones associadas, vê a medida com muita atenção. Isso porque acredita que ela pode criar precedentes para outros estados e municípios aderirem à ideia, algo que impactaria o agro brasileiro.

Nas estimativas de Hoana Santos, são pulverizados atualmente cerca de 100 milhões de hectares por aviões e drones no Brasil, o que gera, por baixo, algo em torno de 2,5 mil empregos diretos.

A presidente do sindicato conversou com exclusividade com o AgFeed durante o Congresso de Aviação Agrícola do Brasil, realizado em Sertãozinho nesta semana, e detalhou os planos de ação do sindicato junto a outras entidades do agro para conter os danos e os precedentes que essa ação do STF pode causar no setor.

Na visão de Hoana Santos, o primeiro mês e meio de gestão foi marcado por um movimento de articulação política. A intenção, segundo a presidente, é mostrar a importância da pulverização via aviões agrícolas a segmentos da sociedade que não são ligados ao agro.

“Nosso desafio é a comunicação. Precisamos que parte da classe política entenda a importância dessa pulverização para a segurança alimentar”, afirma.

Ela ressalta que estados e municípios que possuem um histórico e importância maior do agronegócio tendem a rejeitar projetos que surjam, mas que algumas votações podem passar despercebidas do olhar da entidade.

A presidente do Sindag cita que o órgão já monitora projetos semelhantes para proibir a pulverização em curso no Pará, Minas Gerais e até mesmo Goiás e Rio Grande do Sul, estados com presença forte do agro.

“O nosso conselho de administração tinha costume de se reunir a cada 15 dias, mas no último mês fizemos pelo menos cinco reuniões para pensar nessa articulação”, afirmou Santos.

Segundo a presidente, a alegação dos propositores dessas leis contra a pulverização está relacionada à uma agenda ambiental.

Para mostrar que os impactos no meio ambiente não são o que se prega e que essas medidas podem afetar tanto uma questão de empregos quanto na produção de alimentos, o Sindag busca participar de audiências públicas, algo que foi levantado em uma reunião com a PGR, para apresentar seus pontos de vista.

Dentre as estimativas da presidente que devem ser mostradas à classe política estão níveis de porcentagem de algumas culturas que necessitam da pulverização. Uma delas é a de cana de açúcar, que segundo Hoana, podem necessitar de 50% desse tipo de prática e até mesmo na cultura do arroz, onde pode chegar a 70%.

“O impacto é grande, estamos elaborando um estudo econômico para que os ministros nos ouçam”, comentou.

Simplificando as regras

Ao mesmo tempo em que o setor de aviação agrícola vive um drama, a Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), aprovou uma emenda que simplifica as regras para o segmento.

Dentre as medidas, que entrarão em vigor no segundo dia de outubro, foi extinta a necessidade de uma certificação dos operadores aeroagrícolas. O certificado atual chamado de COA (Certificado de Operador Aéreo) foi substituído pelo CDAG (Cadastro de Operador Aeroagrícola), sem validade fixa.

Além disso, as empresas não precisam apresentar à Anac o cadastro da empresa junto ao Ministério da Agricultura.

Agora, uma empresa só precisa cadastrar os dados básicos e indicar um gestor responsável pela aeronave. O diário de bordo também não é mais obrigatório durante as operações agrícolas, somente precisa estar presente no local.

Em conversa com o AgFeed no Congresso de Aviação Agrícola do Brasil, a assessora de relacionamento com os regulados da Anac, Melina Zaban, afirmou que a agência reguladora tem trabalhado para “simplificar, desburocratizar e modernizar o setor”.

“Queremos que a aviação brasileira cresça, mas cresça com segurança”, diz.

Além das mudanças na aviação agrícola, a agência também mudou recentemente as regras para o uso de drones por aqui.

Para ir se adequando às novas tecnologias e já projetando novas atualizações em suas políticas, a Anac tem feito uma agenda de ir à campo e eventos, assim como o Congresso da Aviação Agrícola, para conhecer novas tecnologias e receber feedback direto dos produtores, sobre o que pode ser melhorado.

Essa não obrigatoriedade do diário de bordo dentro da aeronave, por exemplo, foi uma demanda levada por um empresário à agência no congresso realizado em 2022.

Na conversa, ele detalhou que, muitas vezes, o diário de bordo dentro do avião se molhava conforme o processo de lavagem acontecia depois de uma pulverização. “Essa foi uma mudança que fizemos por conta de uma participação dessa da Anac nesses eventos”, comenta.

O mercado de drones

Diferentemente dos Estados Unidos, onde há geralmente uma escolha entre drones e aviões agrícolas, a relação no Brasil é de complementaridade.

Esse mercado, vale dizer, tem crescido de forma exponencial por aqui. Em maio, por exemplo, o Sindag possuía 15 empresas fabricantes de drones entre seus associados. Em menos de dois meses o número dobrou, e passou para 28.

Uma estimativa do sindicato indica que pelo menos 10 mil drones devem estar em operação na agricultura brasileira até o fim do ano.

O Brasil já aparece em quarto lugar, mundialmente, em número de drones, perdendo apenas para a China, Japão e Coreia do Sul, segundo afirmou o pesquisador da Unesp, Vicente Cornago, em entrevista recente ao AgFeed.

A lei determina que todos os equipamentos e também os operadores sejam registrados junto à Anac e também ao Ministério da Agricultura.

Porém, o contraste entre a lentidão dos trâmites burocráticos e o ritmo acelerado de adoção da agricultura digital do campo, faz com que o número de registros e a quantidade real de drones voando pelas lavouras ainda estejam muito distantes. No sistema da Anac constavam 113.273 aeronaves não tripuladas registradas no dia 16 de maio.

Desse total, apenas uma pequena parte destes equipamentos é utilizada para a agricultura. Em menor número estão os drones que captam imagens e dados, ajudando a abastecer plataformas digitais que fazem a gestão das atividades nas fazendas.

As regras que regulamentam os drones são novas, assim como a tecnologia desses produtos em si. Porém, com poucos anos desde a primeira legislação, que era considerada “ampla” pelas autoridades, já houve mudanças, sendo a mais recente em abril.

Melina Zaban afirmou que o texto original da chamada RBAC 94 foi feito de forma genérica exatamente para agrupar as possibilidades da tecnologia.

Porém, conforme esse mercado de drones foi avançando, a entidade se viu obrigada a atualizar as normas. Em maio deste ano, a Anac simplificou a regulamentação e colocou no mesmo barco todos os aparelhos usados para pulverização de lavouras.

Até abril, só estavam 100% aptos a voar de forma regular - desde que estivessem registrados - os equipamentos da chamada classe 3, com no máximo 25kg de peso, incluindo a carga do produto a ser aplicado.

A classe 2, entre 25kg e 150kg, bastante utilizada na pulverização, precisava ter, além do registro na ANAC, uma pré-autorização para cada vez que o equipamento fosse voar.

“Os drones utilizados na pulverização em operações aeroagrícolas são agora considerados classe 3, sem a necessidade de certificação do produto. Além disso, não é necessário uma licença e habilitação dos pilotos e do seguro de drone, como em outras classes”, detalhou Zaban.

Na avaliação da presidente da Sindag, Hoana Santos, a legislação de drones tem que ser mais rígida, principalmente em relação aos utilizadores da tecnologia.

“Esperamos que eles tenham consciência. Acredito que se a Anac atingir um terço dos drones que estão no mercado para serem regulamentados é um bom número. A questão é o uso clandestino dos drones, já que qualquer um pode pegar um drone e sair aplicando produtos por aí”, explica a presidente.