Duas cadeiras, mais de R$ 560 bilhões em faturamento em 2024 e um encontro incomum, ao menos em público. Na tarde desta terça-feira, dia 16 de setembro, o Grupo J. Safra promoveu durante seu evento J.Safra Investment Conference 2025, um bate papo entre dois dos maiores empresários do setor de proteína animal do País.
Ao lado do CEO do Banco Safra, José Olympio Pereira, estavam Wesley Batista, acionista e conselheiro da JBS e J&F, e Marcos Molina, controlador e chairman da Marfrig e BRF, agora unidas na MBRF.
Até o próprio Marcos Molina admitiu que a cena era incomum. “Nunca ninguém teve coragem de colocar nós dois no mesmo painel”, brincou.
Mas o encontro serviu para algo além da curiosidade, e mostrou como os dois executivos enxergam o futuro da proteína, o presente do comércio internacional e o passado recente de internacionalização das companhias brasileiras.
Se o debate tivesse um eixo, ele seria os Estados Unidos e, ao olhar para o futuro, Batista e Molina voltaram a todo momento à comparação entre as operações brasileiras e americanas e chegaram a um diagnóstico comum: o Brasil é competitivo e ainda tem espaço para crescer.
“Sem dúvida, o market share do Brasil vai estar mais alto daqui a dez anos nas três proteínas (bovina, suína e de aves)”, disse Batista, da JBS.
O empresário mencionou que, no caso dos bovinos, o rebanho brasileiro é o dobro do americano, mas a produção ainda é a mesma em toneladas. Essa discrepância se deve ao avanço genético e de nutrição animal, segundo ele.
“O Brasil evoluiu muito nesses aspectos nos últimos anos, o que deve continuar com a lavoura impulsionando a pecuária. Quanto mais a agricultura cresce, mais a pecuária cresce, e agora ainda mais com o DDG, temos uma combinação perfeita”, disse.
Ainda no universo dos bois, JBS e Marfrig se inserem diante de um contexto desfavorável aos Estados Unidos no curto-prazo.
O momento do ciclo bovino americano é inverso ao do Brasil, com o menor rebanho em 70 anos, o que abre espaço para empresas brasileiras conquistarem cada vez mais mercado no país.
Tanto JBS quanto Marfrig possuem uma forte operação na Terra do Tio Sam. No segundo trimestre deste ano, a operação JBS Beef North America faturou US$ 6,8 bilhões, um avanço de 15% de um ano para cá. Na empresa de Molina, a operação da América do Norte trouxe uma receita de US$ 3,26 bilhões no segundo trimestre, alta de 5,3% em um ano.
Molina reforçou, durante o painel, que a proteína nacional “nunca esteve tão bem posicionada”. Ele citou que as empresas americanas de proteína possuem uma receita 90% atrelada ao mercado interno. No Brasil, o cenário é inverso: 25% fica no País e o restante chega a 120 países. Essa adaptação do setor dá às empresas um know-how operacional maior que as concorrentes americanas, disse Molina.
“A Tyson tentou internacionalizar e não conseguiu porque vende a maior parte no mercado interno. Aqui estamos acostumados a atender outros países, cada um com sua maneira, exigência e qualidade, desde os mais simples até Irã, Rússia, China, os mais difíceis”, disse.
Por conta disso, o futuro das duas companhias também passa pela diversificação e pelo valor agregado.
Batista citou a estratégia da JBS de ampliar a operação de processados em nível global, principalmente nos Estados Unidos, onde os órgãos antitruste dificultam novas compras de empresas dos segmentos de bovinos, aves e suínos, cenário também visto no Brasil.
Olhando para novas aquisições e consolidações, Wesley Batista citou que existem “muitas oportunidades na Europa”, região onde, segundo ele, o setor de proteína está muito fragmentado.
No Brasil, Batista vê oportunidades no setor de pescados, em especial na tilápia. Porém, citou “questões ambientais” como ponto de dificuldade. “Hoje a licença para uma fazenda de tilápia no Rio Paraná ou no Mato Grosso é quase impossível”, disse.
No mesmo tema, Molina mencionou a histórica relação da BRF com o mercado externo, em especial no Oriente Médio. Questionado sobre incursões em novos mercados, Molina disse que a Marfrig não olha para pescados nem para ovos no momento e que o foco é, assim como da concorrente, em crescer organicamente e investir em processados.
Ao olhar para o presente, o tarifaço americano foi tema inevitável. Batista admitiu que houve impacto na JBS, mas lembrou que a demanda global continua firme pela diversificação da empresa.
“A carne americana está no momento mais caro da história. Mesmo com 50% de tarifa continua exportando. Caiu o volume, mas não tudo”.
Para Molina, o efeito foi neutralizado, no caso da Marfrig, por também operar como compradora de matéria-prima local para hamburguer.
As projeções para consumo também vieram à mesa. Batista ressaltou duas forças recentes: a consolidação da proteína como alimento “da moda” e o efeito indireto de medicamentos para emagrecimento, como Ozempic e Mounjaro.
“São 15 milhões de americanos em uso frequente desses medicamentos, que por uma preocupação de perder massa magra, ingerem mais proteína. Não sabemos medir ainda esse aumento, mas já vimos influência”, afirmou Batista.
Resumo
- Encontro inédito entre Wesley Batista (JBS) e Marcos Molina (Marfrig/BRF) no J.Safra Investment Conference destacou a força do Brasil nas três proteínas e a vantagem frente ao ciclo desfavorável dos EUA
- Executivos defenderam a diversificação internacional e a aposta em valor agregado, com foco em processados
- Tarifaço americano e novas tendências de consumo, como o "efeito Osempic", também entraram na pauta