Há dois anos, executivos da Agrivalle, tradicional empresa so segmento de insumos biológicos controlada pela gestora Tarpon 10b – que investiu R$ 160 milhões na aquisição de posição majoritária em 2020 –, tinham uma meta em mente. E chegaram a mencioná-la em público: faturar R$ 1 bilhão em 2025.
Perguntando pelo AgFeed, na semana passada, sobre este objetivo, André Kraide Monteiro, CEO da companhia, não descartou chegar lá. Também não confirmou se será possível atingi-lo. “Estamos, neste momento, revisando nosso planejamento estratégico em função das mudanças fortes que estão acontecendo no mercado brasileiro em 2023”, respondeu.
A estratégia de crescimento, entretanto, já tem um norte. Para seguir avançando em meio ao mercado mais desafiador nas principais culturas, o caminho será investir em biotecnologia.
Na conversa com o AgFeed, Kraide, afirmou que o mercado de biológicos deve crescer no máximo 15% este ano, enquanto até o ano passado vinha avançando entre 30% e 40%.
"O faturamento da empresa vai crescer este ano, acima do mercado de biológicos, e esperamos uma retomada no ano que vem", destacou o executivo, sem detalhar números. Em 2022, segundo ele, a receita da Agrivalle ficou em torno de R$ 280 milhões.
Segundo Kraide, somente após o fechamento do ano será possível dizer se as metas serão modificadas. "O importante é que visualizamos continuar crescendo fortemente, sempre acima do crescimento de mercado".
Ele admite que 2023 foi um período atípico, bem diferente das últimas três safras. Mas avalia que, em 25 anos no setor, aprendeu que este é um comportamento normal e que “o ano ainda não terminou".
"Em função do El Niño, houve atraso na safra e o agricultor está pensando muito mais na tomada de decisão. Mas é um ano bom, ainda se vê crescimento na participação dos biológicos", afirma.
O CEO diz que o “franco crescimento” não será interrompido porque a adoção dos biológicos no mercado brasileiro ainda é baixa se comparada ao que ocorre na Europa e Estados Unidos.
"Não dá para descartar que o mercado de biológicos no Brasil alcance R$ 30 bilhões em 2030", diz ele. "Afinal, enquanto nos mercados maduros os biodefensivos representam 25% do total, aqui na América Latina ainda representam menos de 10%". O executivo acredita que no Brasil a adoção será mais rápida.
As projeções levam em conta uma visão que dá nome à controladora da Agrivalle, a gestora Tarpon 10b, que se baseia no investimento em produtos e soluções para atender à população mundial estimada para chegar a 10 bilhões de pessoas em 2050.
A Agrivalle é líder de mercado em biofungicidas, com o produto da marca Twixx-A, e também tem boa atuação em nematicidas, uma área mais desenvolvida nos bioinsumos. Com 20 anos de existência, já foi bastante focada no segmento de hortifrúti, mas hoje tem como principais clientes os produtores de soja, milho, cana-de-açúcar, além de uma presença em café e citricultura. São vendas feitas diretamente aos agricultores e também para revendas, cooperativas, ou mesmo no modelo B2B.
"Temos buscado ir além do controle de pragas e doenças, com os biodefensivos, olhando a cadeia produtiva de forma mais ampla, para colaborar por exemplo com a sustentabilidade do solo”, ressaltou Kraide.
Na safra 2023/2024, o CEO da Agrivalle acredita que haverá uma maior demanda por produtos voltados ao combate da cigarrinha, praga que já causou grandes prejuízos às lavouras de milho.
Apesar das vendas de insumos seguirem bastante atrasadas no milho, ele diz que há estoques para atender compras de última hora, que ainda podem ser feitas no início de 2024. "Com o clima mais seco nas principais regiões, pode haver uma maior presença da cigarrinha", explica.
Investimentos em genética
Os últimos investimentos da Agrivalle foram no aumento da capacidade de sua fábrica em Indaiatuba, no interior de São Paulo, apontada como uma das mais modernas do País, e na implantação de novas tecnologias, como 12 biorreatores, que custaram cerca de R$ 33 milhões, incluindo melhoria nas estruturas e laboratórios, inaugurados em março deste ano.
Sobre o próximo investimento da empresa, Kraide diz que ainda não pode revelar detalhes, mas a ideia é ampliar a área de atuação da Agrivalle, "além dos bioinsumos, olhando um pouco mais para o lado de genética". Tudo indica que será algo relacionado a análise genética da microbiota do solo.
Ele explica que o objetivo é entender o impacto dos produtos não apenas nas plantas, nos insetos e fungos, mas também ver como os biodefensivos atuam, ao longo do tempo, no solo, saber qual benefício eles terão daqui a 10 anos, por exemplo.
"Tudo o que fizemos, a Agrivalle, a Tarpon 10B, é com esse foco de atender o crescimento da população de forma sustentável. Olhamos de maneira integrada, tem biodefensivos, pós-colheita, pecuária, tudo vai se conectando, não só linear para uma cultura ou para outra", afirma.
Entre as prioridades também está, segundo André Kraide, manter os investimentos para melhorar a eficiência dos produtos já lançados pela Agrivalle – um dos desafios em biológicos é melhorar o chamado “shelf life”, o tempo de "validade" para que os organismos vivos sigam atuando com eficácia.
O CEO da Agrivalle diz que a empresa foi pioneira no que se chama de segunda geração de bioinsumos, quando se mistura diferentes microrganismos, fungos com bactérias, por exemplo, para obter multifunções.
A primeira geração é aquela que já é usada há pelo menos 30 anos na agricultura brasileira, com a aplicação dos microrganismos, individualmente, para cada fim.
"Agora estamos olhando para a terceira geração de bioinsumos e pretendemos fazer um investimento pesado, inclusive com parceria da Finep”, contou Kraide.
O projeto mencionado pelo executivo é o RNAi Agrivalle, realizado em parceria com a HMS Agroscience. O objetivo é criar "uma plataforma de RNA em larga escala para o agronegócio na América Latina". Segundo os técnicos, o RNAi atua nas células dos insetos e fungos, inativando proteínas vitais para a sua sobrevivência.
Para o projeto, a Agrivalle obteve um financiamento de R$ 10 milhões junto à Finep, agência pública voltada a iniciativas de inovação.
"Acreditamos que vai ser a nova revolução dentro da evolução dos bioinsumos", afirmou o executivo. Segundo ele, é um trabalho de engenharia genética, mas há modificação nos insetos, apenas identifica-se o gene que pode silenciar uma proteína que ele precisa para se alimentar.
"Será sempre um gene específico para determinada praga, por isso estamos investindo em pesquisa", diz. “Isso traz benefícios ao meio ambiente, porque não é produto com amplo espectro de controle, são bem específicos".
Na opinião de André Kraide, estas tecnologias mais sofisticadas representam um diferencial da indústria em relação aos projetos “on farm” e às inúmeras biofábricas que vêm sendo construídas por agricultores no interior do Brasil.
"Hoje o modelo on farm é 16% do total. Como o crescimento vai ser grande, vai ter espaço pra todo mundo e talvez ele fique limitado em primeira e segunda gerações", avalia. E completa: “Cada um faz o melhor no que sabe fazer, não vamos fazer agricultura tão bem como o produtor”.
Ainda pensando em 2024, Kraide afirma que a biofábrica já tem capacidade instalada para atender o crescimento de mercado, por isso pretende investir em inteligência artificial para melhorar o “bioprocesso”.
"Temos uma quantidade enorme de dados que a gente vem coletando ao longo destes anos, vamos otimizar através de IA real time qualquer movimento de oxigênio, temperatura. É uma das melhorias que faremos”, acrescenta.