A Boa Safra enfrentou um 2024 complexo. Afetada principalmente pelos extremos climáticos, que diminuíram a produção de sementes, o que consequentemente reduziu a oferta, as vendas e o lucro, a direção da empresa vê o copo de diferentes ângulos.
De um lado, o “CEO sincero” Marino Colpo, que olhando para o copo meio vazio, considera que a empresa entregou um “balanço ruim, aquém do que ele gostaria”. Do outro, o “CFO otimista”, Felipe Marques, considera que, na comparação com os concorrentes, a empresa entregou bons resultados com uma baixa inadimplência. Um copo meio cheio.
Os dois entram em um consenso, porém ao olhar para 2025: é um ano de crescimento. Esse avanço deve se dar em diferentes frentes.
No aspecto mais cru da operação - a produção de sementes -, a Boa Safra ampliou sua capacidade produtiva de 240 mil big bags para 280 mil big bags atuais, com Marino Colpo de olho em atingir a capacidade máxima.
“Temos uma expectativa forte de crescimento em 2025. Em 2023 nossa capacidade era de 200 mil big bags e produzimos esse mesmo número. Em 2024, a capacidade era de 240 mil, mas produzimos 205 mil”, relembra.
No ano passado, a companhia comercializou 161 mil big bags, uma queda de 4% frente a 2024. Desse total, 60 mil big bags continham tecnologias de tratamento de sementes. A receita líquida da empresa foi de R$ 1,8 bilhão ano passado, baixa de 11% frente aos pouco mais de R$ 2 bilhões de 2023.
A questão climática, que atrapalhou os números de 2024, está mais controlada neste início de 2025 para Colpo. “Nenhum ano é perfeito, mas está com cara de ser um ano bom, com previsões positivas. Estamos no meio das semanas mais importantes do ano, e nos resta a observar as duas próximas semanas para um panorama mais amplo”.
Para reforçar o crescimento projetado para este ano, a empresa conta com uma posição de caixa confortável.
Hoje, a dívida bruta da empresa está em R$ 414 milhões, composta por R$ 141 milhões em obrigações que vencem neste ano e o restante no longo prazo. Como a empresa encerrou 2204 com R$ 585 milhões em caixa, sua dívida líquida é negativa em R$ 171 milhões.
“Somos quase um unicórnio em termos de estrutura de capital, o que nos dá conforto em termos de liquidez”, disse Colpo. Com isso, a alavancagem é negativa, já que o Ebitda (lucro antes de juros, impostos, amortização e depreciação) foi de R$ 183 milhões no ano passado, um número 35% menor do que em 2023.
Com essa posição, mesmo com uma desaceleração no negócio a empresa segue se capitalizando e avançou com sua agenda de aquisições e parcerias já em 2025.
Primeiro, em janeiro, a Boa Safra emitiu R$ 500 milhões em CRAs para financiar CPRs e operações. Segundo o CFO Felipe Marques, a captação será utilizada para capital de giro, compras de estoques, vendas de sementes à prazo e antecipação de royalties.
Logo após, em fevereiro, anunciou a criação de uma joint-venture para avançar no mercado de agricultura regenerativa. A Boa Safra terá 30% da SBS Green Seeds, empresa que une a operação de forrageiras da empresa da família Colpo com os negócios de Thiago Maschietto, dono da SememBras e Sementes Nobre.
A Boa Safra aportou R$ 45 milhões na SBS por meio de debêntures conversíveis em ações. Se quiser convertê-las, pode aumentar sua participação de 30% para 60%, assumindo o controle do negócio.
O ano de 2024
Ao comentar os resultados de 2024, Marino Colpo divide o ano que passou em seis aspectos distintos: três negativos e três positivos. O primeiro ponto negativo é justamente o clima.
As ondas extremas de seca e calor que prejudicaram a produção e a receita também foram sentidos no lucro líquido, que atingiu R$ 344 milhões em 2024, uma queda de 53% em um ano.
“O resultado é justificado pelo menor volume causado pelo clima. Estávamos animados e nos preparamos para um ano que acreditamos que seria bom para as sementes. Com a seca, o que era plantado em outubro acabou sendo plantado em meados de dezembro de 2023. Na colheita, em 2024, ainda tivemos excesso de chuvas”, explica o CEO.
Esperando um ano positivo, a Boa Safra se reforçou administrativamente para aumentar as vendas, e com isso, montou um time robusto preparado para a produção e comercialização.
Aí entra o segundo ponto negativo para o ano de 2024 segundo Colpo: o aumento nos custos e despesas. Em 2024, as despesas de pessoal avançaram 21% frente a 2023 e as despesas com vendas aumentaram 73%. O custo dos produtos vendidos (CPV) foi de R$ 1,617 bilhões, em linha com 2023.
O terceiro ponto que justifica o copo meio vazio de Marino Colpo está no crédito. O CEO afirma que a Boa Safra foi mais “exigente” na concessão de crédito com revendas e distribuidores.
Sem citar nomes, cita que a empresa diminuiu sua exposição a grandes grupos do setor de 41% em 2023 para 19% em 2024.
“Recuamos no crédito e acabamos ficando com produtos sobrando. Num terceiro trimestre mais aquecidos, voltamos ao mercado mas colocamos as mercadorias a um preço mais baixo. Restringimos o crédito e isso impactou nas vendas”, afirmou.
Mesmo com menos exposição a grandes redes do varejo agrícola, a Boa Safra ampliou sua base de clientes para 697 lojas ao final de 2024, ante 610 pontos de venda em 2023. “A empresa tem conseguido ‘varejar’ mais”, diz o CEO, se referindo ao primeiro ponto positivo de 2024.
“Tivemos problemas em algumas revendas grandes que estavam muito endividadas. Isso nos preocupa, mas temos diminuído essa exposição”.
Para 2025, ele ainda vê a Boa Safra “cautelosa e exigente” na concessão de crédito, mas prevê ampliar o recurso para pequenas e médias revendas.
Colpo cita que existem hoje 1,3 mil pontos de venda mapeados e que a expectativa é chegar a 900 lojas até o final de 2025 ao mesmo tempo em que prevê crescer share onde já atende.
Ainda olhando para o ano passado, o segundo ponto positivo citado por Marino Colpo está na agenda de crescimento e na evolução de seus novos negócios.
Ele cita, por exemplo, que a compra da Dasoja, feita em 2023, foi um bom negócio, e somente em um ano, dobrou de tamanho. “A aquisição da Avra Sementes, com portfólio exclusivo e parceria com a GDM também tem crescido bastante”.
Por fim, o último ponto positivo diz respeito a um crescimento operacional, com ampliação nas fábricas e construção de dois centros de distribuição (CD) no Mato Grosso. “Fizemos R$ 177 milhões em Capex em 2024, num investimento feito para crescer, mesmo não entregando a nossa capacidade produtiva máxima”.
Felipe Marques, CFO da empresa, ancora seu otimismo afirmando que nunca se sentiu tão bem preparado em relação aos concorrentes quanto neste ano. “Não mudamos a estratégia, fizemos o dever de casa para fazer os problemas virarem oportunidades. Temos uma companhia forte apesar de resultados não tão bons quanto esperávamos”, disse.