O Brasil tem 12% das vacas leiteiras, mas produz menos de 5% do leite do mundo. Nas mais de 1 milhão de propriedades dessa atividade pecuária, presente em 98% dos municípios, as 20 milhões de fêmeas têm uma disparidade na produtividade que vai de 5 quilos até 40 quilos diários de leite.
Para atingir um nível de produtividade correspondente à fatia global de animais, uma das principais alternativas é o uso da somatropina bovina recombinante (r-BST). O hormônio para o crescimento é naturalmente produzido pelos animais e a suplementação de r-BST sintetizado a partir da bactéria Escherichia coli, em vacas a partir de 60 dias pós-parto, é capaz turbinar essa produtividade em até 20% sem a necessidade de aumento do rebanho.
Duas companhias produzem globalmente r-BST em escala: a LG Chem, braço farmacêutico da gigante sul-coreana, e a brasileira Agener União Saúde Animal. A companhia, do Grupo União Química, produz a somatropina com o nome Lactotropin na unidade norte-americana de Augusta (Georgia), adquirida da Elanco em 2018, e, desde 2019, dobrou as vendas com a ajuda do produto líder no mercado brasileiro.
E foi no Brasil que nasceu a parceria com a MSD Saúde Animal, gigante global e uma das líderes no setor no País. Até o ano passado, ambas eram concorrentes nas vendas desse tipo de produto. Mas a MSD encerrou parceria de mais de 30 anos com a LG Chem para a venda do Boostin, concorrente do Lactotropin. As conversas com a Agener começaram no segundo semestre de 2024 e o acordo foi relativamente rápido.
Anunciada nesta segunda-feira, 24 de fevereiro, ao mercado, a parceria pretende ser o “hormônio” para um novo ciclo de crescimento dos negócios das duas empresas do setor, segundo detalhes revelados ao AgFeed por executivos da Agener e da MSD.
Pelo acordo, a MSD será a distribuidora exclusiva e atuará também na regulamentação do Lactotropin em praticamente todos os mercados globais, além de ter distribuição conjunta com a Agener no Brasil. O acordo exclui apenas Estados Unidos, México e África do Sul, que seguirão a cargo da Agener e outros parceiros.
Apesar do apetite global, a parceria olha inicialmente para o potencial do mercado brasileiro, de acordo com Delair Bolis, presidente da MSD Saúde Animal para Brasil, Paraguai, Uruguai e Bolívia. Segundo ele, o “casamento” com a Agener traz para o portfólio da MSD o maior produto de saúde animal.
“O Brasil é um dos países que mais utiliza r-BST, mas, das 20 milhões de vacas leiteiras, menos de 50% usam o produto, o que dá para avaliar o potencial desse mercado”, afirmou Bolis.
Segundo ele, a área de ruminantes de corte e leite responde por 50% do faturamento total da MSD Saúde Animal no Brasil, ou seja, R$ 1 bilhão dos R$ 2 bilhões. Desse total, o segmento r-BST representa de de 8% a 10%, ou até R$ 100 milhões anuais de receita.
Com sede em New Jersey (EUA), a MSD Saúde Animal está presente em mais de 50 países e seus produtos estão disponíveis em cerca de 150 mercados. No portfólio, mais de 70 produtos biofarmacêuticos. São 26 fábricas, com duas unidades no Brasil, uma em Cruzeiro (SP), de vacinas e medicamentos, e outra em Joinville (SP), de equipamentos para monitorar e identificar animais
A parceria, também válida na assistência técnica, terá uma equipe de 500 profissionais em campo capaz de atender mais de 1 milhão de fazendas de leite.
“Com o acordo, o potencial é grande e, mesmo sabendo que crescer duplo dígito dentro do tamanho da empresa é difícil, crescer acima da inflação é nosso compromisso, senão perdemos participação de mercado”, completou o presidente da MSD Saúde Animal para Brasil, Paraguai, Uruguai e Bolívia.
Já Marco Rogerio Dalalio, diretor da Agener, espera que a parceria com a MSD gere um crescimento exponencial para o produto dentro da companhia. A unidade norte-americana da Agener produz até 40 milhões de doses anuais do Lactotropin, mas tem capacidade de expansão ilimitada para abastecer novos mercados, segundo o executivo.
“Hoje estamos em 20 a 25 países e a chance de dobrar esses mercados é rápida”, afirmou Dalalio. Além do acordo comercial, o executivo destacou também parceria regulatória entre as duas empresas para a abertura de novos mercados para o produto. Ele cita China e Índia, onde a MSD já tem representação, como potenciais mercados a serem abertos.
O principal discurso para a abertura dos mercados e o crescimento do Lactotropin é o ambiental, de um produto redutor da pegada de carbono, já que amplia a produção com os mesmos rebanho e área de pastagem.
“O pecuarista não precisa comprar mais vacas, pois consegue utilizar o produto com o mesmo rebanho e produzir mais, com mesmo consumo de água e gerando a mesma quantidade de dejetos”, afirmou Dalalio.
Quinta empresa no mercado farmacêutico de saúde animal, a terceira em ruminantes, a Agener União Saúde Animal atua também nas áreas de animais de companhia e de suínos. São 74 produtos e um faturamento global de R$ 1,38 bilhão em 2023 - em 2024 os números ainda não foram divulgados.
Com a parceria, a empresa espera aumentar em 40% a receita e dobrar as vendas, já que o Lactotropin responde por 22% do faturamento da companhia.
O produto, de uso contínuo e aplicado a cada 14 dias, tem o preço em dólar, o que traz impacto natural para o comércio no Brasil após a valorização da moeda norte-americana. No entanto, essa pressão é reduzida pelo valor do leite, que “vem de anos de bons momentos e baliza o preço do nosso produto no País”, nas palavras de Dalalio.