Na octogenária holandesa Enza Zaden, uma das maiores empresas do mundo em melhoramento genético de hortaliças, o momento é de colheita.
Ao longo de suas história, a empresa tem investido cerca de 30% de seu faturamento em pesquisa e desenvolvimento de novas variedades de cebolas, alfaces e tomates, além de melões, melancias, pimentões, abóboras, abobrinhas, cenouras e chicórias (os principais produtos vendidos no Brasil).
Agora, numa era de extremos climáticos, seja de muita chuva ou de muito sol, variedades resistentes a ondas de calor, excesso hídrico e doenças que aumentam nesses climas, ganham o mercado. E é na oferta desse tipo de produto que a Enza aposta em 2025 e nos próximos anos.
Em entrevista ao AgFeed, Jean François Hardouin, gerente regional da empresa para a operação da América do Sul e do Caribe, afirmou que no ano passado a empresa faturou cerca de 500 milhões de euros globalmente.
Desse total, investiu algo próximo de 130 milhões de euros. Hardouin menciona que o crescimento em faturamento fica em torno de 10% ao ano, logo, a perspectiva é da companhia investir num patamar próximo aos 150 milhões de euros em 2025.
A hora da colheita chegou pois, segundo o executivo, as variáveis das condições climáticas já são consideradas nos laboratórios da companhia holandesa há tempos. “Nossa linha de P&D e portfólio já é voltada para o que está ocorrendo hoje. Investimentos desse tipo são sempre de médio e longo prazo”, diz.
A operação nacional e também latina, que segundo ele cresce em torno de 25% – acima, portanto, da média global – ganha uma atenção especial nos novos cultivares.
No mundo, a empresa atua em 25 países, mas Hardouin cita que o Brasil e a região da América Latina possuem um “potencial e oportunidades a serem mais exploradas”.
Nesta semana, por exemplo, a companhia lançou uma cultivar de tomate resistente ao vírus transmitido pela mosca branca, uma das principais pragas do cultivo.
A empresa atua em todas as regiões brasileiras e o produto carro-chefe são as sementes de cebolas. A genética da empresa para o vegetal é dona de um market share de 65%.
Ao longo dos últimos anos, dois outros cultivares têm ganho espaço no portfólio e no mercado: a alface americana e o melão.
Na hortaliça, ele cita que, dos últimos 25 anos de atuação no Brasil, 10 foram marcados com pesquisas intensas em folhosas.
“O resultado hoje é que somos líderes no mercado de sementes de alface americana para companhias que vendem produtos higienizados, que atendem mercados como o de fast food. Além disso, temos cultivares que atendem um período delicado para o cultivo, que é o verão”, afirmou Jean François Hardouin.
“Nossa genética está bem posicionada nesse mercado. São cultivares desenvolvidas localmente no Brasil e que ganham espaço cada vez mais”.
A companhia possui uma estação de pesquisa em Holambra (SP), com 20 hectares de áreas para testes de variedades e uma equipe de 35 pesquisadores.
No melão, o executivo reforça que hoje o País é um dos principais exportadores do fruto, com uma produção concentrada entre Ceará e Rio Grande do Norte.
De acordo com dados do Comex Stat, plataforma vinculada ao MDIC (Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços), as exportações do melão vindo desses estados somaram 141 mil toneladas na safra de agosto a dezembro do ano passado, 3% acima do mesmo período em 2023.
Por conta dessa dinâmica, Hardouin menciona que a empresa desenvolveu variedades que suportam grandes viagens e com sabores mais marcantes. O melão brasileiro geralmente vai para a Europa.
Olhando para o futuro, o executivo cita que, além de colocar a empresa como uma referência em cultivares resistentes, quer posicionar os produtos como auxiliadores para redução do impacto ambiental de cultivos HF, que são conhecidos por demandarem muitos insumos químicos.
“Entregando uma genética resistente a pragas e doenças, o fazendeiro usa menos produtos para aumentar a resistência da planta e menos controladores. Isso é relevante tanto para reduzir o custo de produção quanto para um menor impacto ambiental”, afirmou.
Ainda na América Latina, a empresa inaugurou no ano passado uma subsidiária no Chile. “O país oferece condições climáticas favoráveis e um mercado agrícola dinâmico, que está alinhado com nossa missão de fornecer as melhores soluções em genética vegetal”, disse Hardouin.
A unidade atende tanto o mercado chileno quanto outros países do continente, como o Brasil.
Por ano, a companhia vende em torno de 800 toneladas de sementes e lança 150 novas variedades, em média.
Do autodidata à multinacional
De acordo com Jean François Hardouin, a história da Enza é comum no meio das hortaliças. A companhia nasceu há 86 anos por uma ideia de Jacob Mazereeuw.
Após o final da Segunda Guerra, o holandês, que não tinha um background de melhorista ou agronomia, quis ajudar a sanar a miséria e a falta de alimentos que assolava o Velho Continente no período.
“Autodidata”, como explicado por Hardouin, ele ajudava agricutores a produzir de forma mais eficiente. O que era uma pequena loja em Enkhuizen, na Holanda, foi se transformando em uma multinacional nas décadas seguintes
Anos depois, seu filho Piet, este já formado como melhorista, trouxe mais tecnologia ao negócio e escalou a operação para outros países da Europa como Espanha, Turquia e Itália. O atual CEO é Jaap Mazereeuw, da terceira geração da família a liderar o negócio.
No Brasil, a operação começou há 25 anos com parceiros. A empresa trazia sementes desenvolvidas e os agricultores testavam no campo. Hardouin entrou na Enza há 15 anos.
“A empresa estava num movimento global de ter mais subsidiárias e fui contratado para liderar primeiro uma equipe comercial aqui. Há cinco anos começamos também com o braço de P&D, investindo cada vez mais em produtos tropicais adaptados ao Brasil”, explicou.
O pontapé inicial por aqui foi com sementes de cebola com alterações genéticas. A companhia notou que os materiais da cebola crioula tinham baixa eficiência e apostou no segmento. “ A entrada desses híbridos revolucionou o cultivo de Norte a Sul do País”.