Desde o início da segunda gestão de Donald Trump como presidente dos Estados Unidos já se esperava uma retomada das tensões comerciais com a China e possíveis efeitos para o agronegócio americano – repetindo o que havia ocorrido durante sua primeira passagem pela Casa Branca, entre 2018 e 2022.

O que não estava no roteiro da maior parte do mercado era a dimensão do tarifaço anunciado há um mês por Trump. E, claro, seus efeitos colaterais, que têm trazido dores de cabeça a uma série de empresas americanas.

Uma que lida com elas agora é a gigante Bunge, uma das maiores tradings de commodities do mundo. Por conta do acirramento das disputas entre os dois países, a companhia encara nas últimas semanas a paralisação do processo de aprovação, pelas autoridades chinesas de análise da concorrência, da aquisição da Viterra.

O negócio – avaliado em US$ 18 bilhões, sendo US$ 8,2 bilhões com a compra de ações pertencentes à Glencore, controladora da Viterra, e o restante assumindo dívidas da Viterra – foi selado em junho de 2023 e, ao longo de quase dois anos, passou pelo escrutínio de mais de 40 países onde as duas companhias têm operações.

A Bunge esperava concluir essas aprovações em cerca de um ano, mas encontrou dificuldades em mercados como o da União Europeia e do Canadá, considerado o calcanhar de Aquiles da transação, por ser o mercado em que poderia haver uma maior concentração na soma das duas operações.

Em meados de janeiro passado, o sinal verde (com ressalvas) das autoridades canadenses parecia ter clareado o caminho para a concretização da operação. Mas faltava a China – e a posse de Trump.

No mercado chinês, a princípio, não se esperava nenhuma uma fusão entre as duas companhias. Segundo informações da agência Bloomberg, a Bunge opera cerca de cinco plantas de processamento de soja no país oriental e a Viterra, uma única unidade de comercialização de produtos agrícolas.

Além disso, não é comum as autoridades chinesas colocarem obstáculos a negócios entre grandes companhias estrangeiras.

Desde 2008, quando a China colocou em vigor uma lei antimonopólio, apenas uma grande transação foi barrada, no distante 2009, e envolvia uma empresa local de produção, que havia recebido uma oferta de compra da Coca-Cola.

A paralisação do processo nas últimas semanas acendeu o sinal de alerta na sede da Bunge no estado do Missouri, nos Estados Unidos. Segundo fontes não identificadas, citadas pela Bloomberg, empresa tem buscado, sem sucesso retomar as conversações com o governo chinês.

O próprio CEO da companhia, Greg Heckman, teria feito várias viagens à China diversas vezes para conversas com autoridades. Em nota, a Bunge informou que o processo se encontra em fase final de aprovação e que mantém um "diálogo construtivo" com a administração chinesa.

Mas o fato é que vários do prazos previstos no acordo de aquisição da Viterra já expiraram, inclusive duas extensões automáticas de três meses que constam no contrato.

A aprovação chinesa é fundamental para a conclusão do negócio. Se isso não ocorrer, além de correr o risco de o negócio ter de ser desfeito, a Bunge teria que pagar à Viterra uma multa rescisória estimada US$ 400 milhões.