Piracicaba (SP) - Com 86 anos de idade, a Cooxupé, Cooperativa Regional dos Cafeicultores de Guaxupé, ostenta o posto de maior cooperativa do País voltada para o cultivo do café. É também a maior do estado de Minas Gerais, um colosso com receita próxima dos R$ 10 bilhões.

A idade e a “mineirice” podem causar a impressão de uma instituição mais tradicional, ou “raiz”, no jargão popular. Apesar disso, a gestão da instituição, que conta com cerca de 19 mil cooperados, tem mantido olhares bem atentos para o futuro.

Para Osvaldo Bachião Filho – ou Osvaldinho, como o vide-presidente da Cooxupé é chamado pelos colegas do agro –, é tempo de tirar um certo “atraso” das tecnologias dentro do cultivo do café em comparação com o que acontece em outras culturas. E os movimentos para mudar isso já estão em curso.

Bachião conversou com o AgFeed durante o evento AgTech Meeting, realizado pelo hub AgTech Garage, em Piracicaba, no interior de São Paulo, e detalhou os planos e os desafios para a implementação de uma cultura de inovação na cooperativa e entre seus associados.

Segundo ele, a Cooxupé tem se aproximado, mineiramente, de empresas de tecnologia para o agro e também hubs de inovação para “disseminar o que já existe” para os cooperados. Um deles é o próprio AgTech Garage, que recentemente abriu uma “filial” em Uberaba, em parceria com a Ubyfol.

Segundo Bachião, uma ideia já semeada é desenvolver um projeto semelhante também para a região da cooperativa, no Sul de Minas, e criar uma espécie de “hub do café” por lá.

“O principal desafio é trazer o produtor para o rumo de enxergar o negócio como um negócio de verdade e tomar decisões baseadas em estatísticas e no que existe de moderno”, diz. “Além disso, a ideia é fazer, do ponto de vista agronômico, o possível para a produtividade subir”, comentou.

O dirigente, também produtor rural, lista inciativas em curso nessa direção. A cooperativa anunciou no mês passado, por exemplo, uma parceria com a Netafim para que os cooperados ampliem os esforços de irrigação em suas lavouras. A empresa israelense, líder global no segmento, foi pioneira no Brasil no conceito de irrigação de precisão, nos anos 1990.

Na agricultura de precisão, a cooperativa possui a iniciativa “Sustenta Mais: Agricultura Regenerativa”, realizado pela Cooxupé em parceria com a startup Quanticum e o IFSuldeMinas (Instituto Federal do Sul de Minas Gerais). A ideia foi reconhecida pela Bayer, e ganhou um prêmio de inovação concedido pela gigante do agro.

Segundo a cooperativa, o objetivo do projeto é mapear a saúde do solo em propriedades cooperadas com tecnologias de baixo custo e oferecer ao pequeno produtor análises mais ricas para a tomada de decisão, fortalecendo a sustentabilidade da lavoura.

A entidade também tem atuado como investidor de startups. Neste ano, por meio da Agroven, clube de investimentos formado por uma rede de empresários e famílias do agronegócio do qual a cooperativa faz parte, investiu na Solusolo, empresa de biológicos. A rodada toda ficou em R$ 2 milhões.

Ao mesmo tempo, Bachião diz que a implementação de novas práticas pode encontrar resistências nos produtores. Na hora de escolher as tecnologias e repassá-las aos cooperados, o marketing boca a boca pode fazer toda a diferença.

“Mineiro que sou, confio muito na tecnologia que vem das cooperativas. Para as startups, é preciso chegar no produtor através de gente sólida e séria, e mostrar o compromisso de melhorar a rentabilidade no fim da conta”, diz.

Bachião considera a Cooxupé criteriosa na seleção das tecnologias que colocará em sua “vitrine”, pois acredita numa tese de só entregar para os cooperados o que realmente faz a diferença no dia a dia e na rentabilidade.

Exemplo dentro de casa

Parte da ideia de trazer um parque tecnológico para a Cooxupé partiu de uma experiência pessoal do próprio Osvaldo.

Em sua propriedade, de cerca de 200 hectares, a tecnologia foi quase que uma necessidade pela falta de mão de obra qualificada na região. A propriedade do vice-presidente é tocada com cerca de nove pessoas, entre colheita e cultivo, e a tecnologia entrou para aumentar a produtividade.

A propriedade passou a contar com agricultura de precisão e também adotou o sistema de Manejo Integrado de Pragas e Doenças (MIP), para controlar invasoras e ter uma noção melhor do solo.

De cinco anos para cá, ele registrou um aumento de produtividade de 34 sacos para 50 sacos por hectares no local.

Osvaldo Bachião Filho, vice-presidente da Cooxupé

“Trouxemos o MIP e toda gestão de pragas e doenças é feita por ele”, conta. “Isso otimizou as operações, pois podemos entrar com os produtos certos na hora certa, incrementou a produtividade e nos deu a possibilidade de até tomar outros riscos. Essa experiência deu certo, e temos que escalar isso para a cafeicultura de forma geral”.

O aumento de produtividade vai além de novas tecnologias na Cooxupé e às vezes a solução para uma rentabilidade maior está dentro de casa. O executivo lembra que, em 2009, a cooperativa criou uma empresa para trabalhar com cafés especiais dos cooperados, a SMC Specialty Coffes.

Em 2016, passaram a identificar dentre os 6 milhões de sacas de café recebidas por ano, identificar aqueles de qualidade superior e criar um programa de remuneração extra para o produtor conforme o produto subisse de padrão, numa tabela de pontuação.

Depois de anos de trabalho, das cerca 6 milhões de sacas de café produzidas anualmente, 120 mil são identificadas como especiais.

“O mercado já paga por um café de qualidade superior e todo produtor com essa pontuação diferente acaba colocando mais dinheiro no bolso, que é o que importa para nós no final do dia”, afirmou o vice-presidente da Cooxupé.

Ele acredita que esse tipo de incentivo motiva os outros cooperados e acaba fazendo a régua de qualidade subir para todos.

Boas e não tão boas notícias

O aumento de produtividade, contudo, não depende só das melhores práticas e manejos. O clima é importante e, depois de dois anos com o clima prejudicando a produção, a expectativa para a nova colheita, que se encerra nesta semana na cooperativa, é de um ano mais positivo.

“O clima está melhor, as minas de água não diminuíram e não tivemos seca. Estamos prestes a ter boas notícias na cafeicultura”, comenta.

Em contrapartida, a queda do preço do café no mercado internacional deve trazer uma redução nas receitas da Cooxupé. No ano passado, a empresa faturou R$ 10,1 bilhões, com 6,8 milhões de sacas de café arábica vendidas, das quais 5,6 milhões de sacas foram para o mercado externo.

A expectativa agora, segundo Bachião, é de um faturamento de cerca de R$ 7 bilhões em 2023, uma queda de 30%. Reflexo direto do preço do café na Bolsa de Nova Iorque, que rondava, há um ano, uma faixa superior aos US$ 200. Agora o valor está em torno de US$ 145.

“O café estava R$ 1,5 mil e agora está R$ 800. Chutaram nossa canela, e com a canela doendo a gente manca um pouco. Mas ainda andamos”, brinca o vice-presidente da cooperativa.