Em apenas dois anos, a realidade da Cooperativa de Produtores de Limão de Urupês (Cooperlimão), sediada na cidade de mesmo nome no interior paulista, mudou totalmente.

Em 2023, diante de dificuldades, os 27 produtores que restavam na cooperativa chegaram a discutir o encerramento das atividades da instituição, criada há menos de uma década, em 2016.

Eles não podiam imaginar que, dois anos depois, representantes da mesma cooperativa no Canadá estariam fechando as primeiras vendas de limão para aquele mercado.

O que explica essa rápida mudança nos rumos da Cooperlimão é uma profunda reestruturação que foi sendo executada de lá para cá, cujos frutos estão amadurecendo agora, com a inserção do produto da cooperativa em outros mercados.

À frente da transformação, está Anselmo Spadão, gestor da Cooperlimão, que chegou à cooperativa em 2023 em um momento de crise, inicialmente para prestar consultoria aos produtores, às vésperas do encerramento das atividades da cooperativa.

"Lembro de uma reunião em que os cooperados listavam, em um flipchart, repassando item a item, o checklist de tudo o que precisavam para encerrar a cooperativa", recorda.

Spadão explica que o problema da cooperativa estava na forma como os produtores associados estavam recebendo seus pagamentos: a Cooperlimão recebia o produto dos cooperados, rateava a despesa a partir do volume de frutas que entrou naquele mês e, com o resultado das vendas, distribuía sobras para os cooperados e os pagava em 90 dias. "Naturalmente, esse esquema estava insatisfatório para os cooperados", recorda.

Urupês, município onde está sediada a cooperativa, é o segundo maior produtor de limões no Brasil, com cerca de 1,2 milhão de pés da fruta e uma produção anual estimada em 89 mil toneladas, segundo dados da prefeitura local.

A cidade, de apenas 13 mil habitantes está a 800 quilômetros do Rio de Janeiro, principal destino dos limões produzidos pela Cooperlimão. Ao perceber que os cooperados não conheciam seu principal cliente no País, Spadão não teve dúvidas: reuniu os produtores para que visitassem o Ceasa fluminense.

"Foi aí que eles entenderam a necessidade de ter fruta no Rio, entenderam o volume e a demanda. Não tem comparação uma cidade de 13 mil habitantes com o movimento de um box vendendo limão no Ceasa", afirma.

No retorno, Spadão e os cooperados ainda passaram por São Paulo, onde fizeram uma visita ao Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo (CEAGESP), localizado na zona oeste da capital paulista.

Já de volta ao interior, após a viagem, Spadão foi surpreendido com uma oferta dos cooperados. "Eles se reuniram e me fizeram um convite para eu me dedicar à cooperativa e implantar meu projeto de reestruturação. Foi assim que tudo começou."

Foi uma novidade para Spadão, que tinha experiência no ramo de distribuição de bebidas, após atuar como distribuidor da Ambev em Bebedouro (SP), e atuava com uma consultoria própria, auxiliando empresas a qualificar sua gestão empresarial, mas nunca havia trabalhado com o cooperativismo.

"Entrei de cabeça. Fui me desligando das outras empresas que eu prestava serviços e hoje atendo 100% à Cooperlimão", afirma.

A primeira mudança implementada por Spadão na cooperativa foi trazer mais segurança aos cooperados. "A partir daquele momento, eu estaria apresentando a eles um preço diário de compra. Como o limão é praticamente uma commodity, o preço dele oscila todos os dias.”

Além disso, para ter mais capital e conseguir pagar mais rapidamente os produtores, Spadão tomou a decisão de diminuir os preços do limão para ter mais liquidez. "Combinei com os cooperados que começaríamos com o menor valor de mercado. Se a caixa de limão estava avaliada entre R$ 30 e R$ 40, eu começaria com R$ 30 para a gente se capitalizar", diz.

Dessa forma, a Cooperlimão conseguiu diminuir o prazo de pagamento paulatinamente, recorda. "Inicialmente era 90 dias, passou para 82 dias, foi diminuindo, diminuindo e hoje está em 38 dias, ou seja, a partir da entrega do limão, o cooperado tem 38 dias para receber."

Desde então, nenhum cooperado quis sair da cooperativa e agora já há uma fila para entrada. "Hoje já temos 12 possíveis cooperados passando por um processo de seleção."

Para que um novo cooperado entre, o limão tem de estar dentro dos padrões de qualidade e certificações da cooperativa.

"E, principlamente, vemos se ele tem o espírito do cooperativismo. Se ele entra aqui só pensando em ganhar todos os dias e não ser cooperativista, vai trazer problema para nós", avalia.

No ano passado, a Cooperlimão produziu 590 mil caixas de limão, que trouxeram uma receita de R$ 29 milhões. Para este ano, a receita é estimada entre R$ 35 milhões e R$ 38 milhões.

A quantidade de exportações também vem crescendo. A Cooperlimão enviou 69 conteinêres carregados de limão no ano passado. Neste ano, até junho, haviam sido remetidos 56 contêineres. "Eu fechei junho praticamente empatando com toda a exportação do ano passado", diz Anselmo.

Entre os destinos, estão países como Portugal, Espanha, Chile, Alemanha e, mais recentemente, a cooperativa passou a fazer negócios com uma empresa do Canadá.

Entre os dias 29 de abril e 1º de maio, Anselmo e outros representantes da cooperativa estiveram em Toronto na Sial Canadá, uma das maiores feiras de alimentos da América do Norte, junto a uma comitiva brasileira de 21 empresas nacionais, que foram levadas em missão comercial pela Câmara de Comércio Brasil-Canadá (CCBC), com parceria do Ministério da Agricultura e Pecuária, Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB) e Invest Paraná, agência de investimentos do governo paranaense.

O Canadá não cultiva limões comercialmente devido ao clima frio e importa a fruta de outros países, principalmente do México.

Das 112 mil toneladas de limão que o Canadá trouxe do exterior em 2023, 85 mil toneladas vieram dos produtores mexicanos. A proximidade entre os dois países favorece o comércio entre os dois países, explica Spadão. "O limão que o Canadá importa do México demora 10 dias para chegar lá e vem de caminhão", diz.

Já o limão que sai de Urupês passa por uma rota longa. Primeiro, por um porto seco em Bauru, também no interior paulista, onde a carga é fiscalizada; depois chega ao Porto de Santos, também em São Paulo, de onde a carga é embarcada com destino ao Porto de Nova Iorque. De lá, o transporte é feito de caminhão até o Canadá. "Essa operação demora 34 dias”, diz Spadão.

Como a logística é complexa, não é de se estranhar que uma parte dos volumes embarcados acabe estragando – uma novidade para os compradores canadenses. "É uma perda de 5%, que é aceitável para nós. Só que eles não têm perdas por lá, é algo diferente do que estão acostumados.”

Arminio Calonga Jr., consultor de negócios da CCBC, lembra que o nível de exigência é uma característica relevante do mercado canadense.

"Trata-se de um mercado pequeno, mas que tem um poder de compra grande e isso é bom para a gente. Mas ao mesmo tempo, o consumidor exige e, consequentemente, o comprador também é exigente", explica.

Em um momento de tarifas aplicadas pelos Estados Unidos contra outros países, inclusive o Brasil, com o recente episódio da taxação de 50% sob produtos brasileiros importados, Calonga Jr. diz que isso reforça a posição do Canadá como país importador.

"Se fizer um ranking hoje de países importadores no geral de todos os produtos, o Canadá oscila entre a 11ª e a 12ª posição, à frente, por exemplo, do México que passa dos 100 milhões de habitantes”, avalia.

“O poder de importação do Canadá, a relevância da importação para o Canadá, a necessidade da compra de produtos de todos os gêneros alimentícios e não alimentícios, matéria-prima etc etc e tal, é muito grande."

Spadão, da Cooperlimão, fez mais de 50 contatos que visitaram o estande da cooperativa na Sial, conseguiu avançar em negociações com duas empresas e assinou acordo com uma delas, a National Produce, que enviou uma carga de 24 mil quilos de limões, comercializada por 8.160 dólares canadenses (cerca de R$ 45 mil na conversão).

A Cooperlimão negocia ainda com a segunda empresa, que aguarda os resultados desse primeiro envio para prosseguir com as conversas.

A ideia é que a cooperativa consiga alcançar novos mercados e, por isso, a Cooperlimão está trabalhando bastante com o aspecto educacional. Em mercados como o europeu, o consumidor está acostumado a consumir e processar o limão siciliano, mas não o limão taiti brasileiro.

"Pensando nisso, nós criamos um livro de receitas com 30 receitas com limão para que o consumo aumente. As pessoas não sabem fazer nem o suco de limão, que acaba ficando ácido", afirma.

"O que precisávamos era juntar um monte de cooperativas e produtores de limão e fazer essa divulgação de forma maciça lá fora. Tenho certeza de que dobraríamos o consumo”, emenda Spadão.

Resumo

  • Após quase encerrar atividades há dois anos, Cooperlimão fez reestruturação liderada por novo gestor e agora exporta limões ao Canadá
  • Cooperativa do interior paulista já exportou mais contêineres em 2025 do que em 2024 e mira expansão internacional
  • Primeira venda ao Canadá somou 24 toneladas; logística desafiadora contrasta com o alto potencial de consumo do país