Se não houver mais nenhuma surpresa de última hora, a fusão entre Marfrig e BRF, formando a MBRF, será decretada oficialmente na próxima terça-feira, 5 de agosto.

Nesta data, os acionistas das duas companhias devem apenas formalizar a transação que cria uma gigante com receitas somadas de mais de R$ 180 bilhões, segundo mostra o mapa de votação da assembleia geral extraordinária divulgado neste sábado, 2 de junho, pela BRF.

Segundo o documento, que traz os votos antecipadamente manifestados por 90% dos minoritários da companhia, a união das duas empresas já tem a aprovação de 71,4% dos detentores de ações e ADRs da companhia dona das marcas Sadia e Perdigão.

Esse total não inclui os papeis nas mãos do controlador ou em tesouraria. A Marfrig já controla a BRF com um total de 58,87% do capital da empresa e se absterá da votação.

Os números informados ao mercado deixam o quadro praticamente irreversível. Dos 10% dos acionista que não votaram antecipadamente, apenas 1% se inscreveu para a assembleia.

Se desconsiderados os votos dos detentores de ADRs, a aprovação sobe para mais de 82%. Nesse grupo minoritário, cerca de 56% dos votantes rejeitaram a fusão, um resultado já esperado, já que a Marfrig informou que, com a fusão, deve encerrar o programa de depósito de ações.

A fusão Marfrig-BRF foi anunciada em 15 de maio passado e, desde então, tem sofrido uma série de percalços e contestações de alguns minoritários e concorrentes.

A primeira convocação para a assembleia geral extraordinária de acionistas previa sua realização em 18 de junho. Um dia antes dessa data, entretanto, a CVM adiou a reunião por 21 dias, acatando um pedido de Alex Fontana, minoritário que faz parte da família fundadora da Sadia, empresa que deu origem à BRF junto com a Perdigão.

Ele questionava a relação de troca de ações proposta pela Marfrig, que prevê que cada ação da BRF será transformada em 0,85 ação da nova companhia, a MBRF, no caso dos acionistas que desejam continuar sendo investidores do negócio.

A mesma alegação embasou um segundo adiamento da assembleia, que havia sido remarcada para 14 de julho. Três dias antes, porém, provocada pelo fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil (Previ), a CVM acatou argumento de que haveria insuficiência de documentos para analisar o processo de avaliação que levou as duas companhias a estabelecerem tal relação de troca de ações.

“Os dados numéricos referentes às premissas e projeções não foram revelados e o tarjamento englobou valores das sinergias esperadas, incluindo dados financeiros e operacionais”, argumentou, na ocasião, a CVM em seu parecer técnico.

Desde então, essa frente de contestação perdeu força, com a saída da Previ do bloco de minoritários – a instituição, que detinha pouco menos de 5% do capital da BRF, decidiu se desfazer de seus papeis e os vendeu no dia 14 de julho. Na semana passada, informou à CVM que abandonaria o processo que pedia mais informações sobre a fusão.

Assim, o único obstáculo à pretensão do controlador da Marfrig, Marcos Molina, de incorporar a BRF corre, agora, no Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), que, em uma primeira decisão, aprovou sem restrições a fusão.

Posteriormente, contudo, o órgão antitruste aceitou pedido da Minerva, frigorífico concorrente, para se tornar um “terceiro interessado” no processo. No dia 27 de junho, a Minerva entrou oficialmente com um recurso pedindo que a fusão fosse “reavaliada”.

O argumento básico da Minerva é que a decisão do Cade de autorizar a fusão não leva em consideração a concorrência em alguns mercados específicos em que as empresas atuam.

Juntamente ao recurso apresentado, a Minerva anexou um parecer econômico elaborado pela LCA Consultores com base nessas preocupações.
As principais questões apontadas pela Minerva, com base no trabalho da consultoria, se referem ao poder de portfólio da nova empresa, a MBRF.

A empresa argumentou que poderão haver concentrações de share em algumas categorias, como por exemplo no mercado de hambúrgueres e também nas vendas para o setor de food service.

Além disso, fora do universo do mercado consumidor, há a argumentação de que BRF e Marfrig são compradoras de carne bovina da própria Minerva. Com a união, a empresa se preocupa com o poder de barganha frente a fornecedores, incluindo a própria.

Por fim, ainda há uma questão acionária contestada pela Minerva. Isso porque o Salic, fundo soberano da Arábia Saudita, passará a ter uma participação relevante tanto na Marfrig quanto na Minerva, onde já é acionista desde 2015.

Na empresa dos Vilela de Queiroz, o fundo possui 24,5% do capital. E investe nas empresas de Marcos Molina por meio de uma participação de 11% na BRF. Com a fusão, o mercado projeta que a porcentagem na nova empresa seja pouco diluída, ficando próxima dos 10%.

No mais recente capítulo desse processo, na quinta-feira, 31 de julho, Gustavo Freitas de Lima, presidente do Cade, assinou um despacho em que intima o Salic a prestar mais esclarecimentos em relação à sua posição acionária três empresas (Minerva, BRF e Marfrig), tanto em relação à participação quanto a direitos de preferência ou exercícios de opção de compra de ações que possam ampliar a participação em cada uma delas.

Somado a isso, pede uma previsão de participação na nova empresa após a concentração dos negócios. O prazo para manifestação do Salic é de 10 dias.

É improvável que o Cade estabeleça algum impedimento à fusão, mas a autarquia poderia impor algumas condições para sua efetivação. Ou seja, o nascimento da MBRF agora parece certo. Mas pode não ser exatamente da forma que seus pais imaginaram.

Resumo

  • Mais de 70% dos acionistas minoritários da BRF já votaram a favor da fusão com a Marfrig, o que praticamente garante a aprovação oficial na assembleia marcada para 5 de agosto
  • Votação acontece após dois adiamentos, provocados por contestações de acionistas minoritários, agora enfrquecidas com a saída da Previ do quadro acionário
  • Cade ainda analisa recurso da concorrente Minerva e intimou o fundo Salic (acionista relevante das três empresas) a prestar esclarecimentos