Não tem sido um período fácil para as indústrias de máquinas agrícolas e com a AGCO, fabricante global de marcas como Fendt, Valtra e Massey Ferguson, não é diferente.
No balanço do primeiro trimestre deste ano, a companhia reportou lucro líquido de US$ 168 milhões, o que representa uma queda de 27,8% em relação ao mesmo período de 2023. Na América do Sul as vendas caíram quase 40%.
“Foram 3 anos de mercados muito aquecidos, no mundo inteiro, mas o setor é cíclico e é natural ter uma acomodação”, afirmou Luís Felli, head global da Massey Ferguson, se referindo ao comportamento do setor de grãos.
Para 2024 como um todo, ele admite que as vendas de máquinas agrícolas no Brasil ainda poderão recuar pelo menos 10%, mas acredita que o cenário tende a melhorar no segundo semestre.
“A chegada do La Niña, prevista para setembro, pode pressupor produtividades mais baixas no Sul do Brasil e na Argentina. Dependendo da intensidade, o mercado tende a se antecipar e o preço sobe”, afirmou Felli, ao conversar com o AgFeed, durante a Agrishow.
Nesta semana, à medida que ficam mais claros os efeitos das chuvas na safra do Rio Grande do Sul, segundo maior produtor de soja, já tem sido observado um movimento de alta nos preços, sob a influência do clima.
Ele lembrou que além de efeitos na América do Sul, o fenômeno La Niña, nos últimos anos, também provocou seca severa em outros países, como na Europa. Por isso acredita na reação dos preços de commodities como soja e milho na segunda metade do ano.
“Neste cenário o agricultor já fica com um humor diferente, melhora a visão dele sobre o negócio e tende a voltar a investir”, avalia.
Enquanto isso, a fabricante segue apostando em segmentos que não pararam de crescer no Brasil. “Seguimos com muita atividade em setores como café, açúcar, arroz e frutas, que estão indo muito bem”, ponderou.
Estratégia mais digital
Luís Felli disse ao AgFeed que, há 3 anos, a AGCO fez um ajuste na estratégia, definindo que “o agricultor precisa estar no centro de tudo o que é feito, para todas as marcas”.
Na prática, ao invés de apenas desenvolver produtos e lançar no mercado, a empresa procurou ouvir as necessidades do cliente e trabalhar com foco em soluções que trouxessem algumas premissas: ajudar o agricultor a ganhar eficiência, com ganhos ambientais, a partir da tecnologia.
“Foi uma transformação, começamos a investir mais em aquisições de empresas de tecnologia, como a Precision Planting em 2017, a Appareo, em 2021, e, mais recentemente, com o investimento de US$ 2 bilhões na compra de 85% da Trimble”, afirmou Felli, que também é vice-presidente sênior da AGCO.
Ele calcula que o investimento total, considerando as diferentes empresas adquiridas, fique próximo de US$ 3 bilhões. Nesta mais recente, por meio de uma joint venture, foi criada a marca PTxTrimble, especializada em agricultura de precisão.
Os próximos passos da JV estão relacionados ao processo de integração das redes da AGCO, globalmente, indo além das marcas próprias.
“Vamos levar essa tecnologia da PTxTrimble atráves de retrofit, como já se faz com a precision planting, temos grande capilaridade no mercado de retrofit de máquinas usadas”, destacou.
A estratégia consiste em instalar as tecnologias de agricultura de precisão nas máquinas que já estão no campo, em uso, mesmo aquelas produzidas por montadoras concorrentes. “Nenhuma outra empresa faz isso, vamos acelerar a adoção”
Felli diz que um dos objetivos é oferecer tecnologias que permitam o uso mais racional de defensivos e fertilizantes. A empresa conta com 3 produtos de “weed seeker”, que pulveriza somente a planta daninha, identificando onde não é necessário aplicar pesticidas.
Já o desenvolvimento de máquinas autônomas visa reduzir o custo com mão de obra. E outra prioridade, segundo Felli, é o incentivo a práticas que melhorem a saúde do solo, como o plantio direto, o que reduz a emissão de nitrato e nitrito, que são “exponenciais na comparação com o CO2”.
Tendências no setor
Entre as prioridades da AGCO está o desenvolvimento de máquinas movidas a combustíveis alternativos. Luís Felli acredita que o mais promissor e viável no Brasil, para o curto prazo, seja o trator a biodiesel.
“Já temos disponível para compra o trator que funciona com o B100, é só uma questão de o agricultor desejar”, disse o executivo. Segundo ele, na Europa o produto já está sendo comercializado.
A AGCO também já lançou o primeiro trator elétrico de série do mundo, com a marca Fendt, mas ele não chegou no Brasil porque ainda não há mercado aqui, segundo a empresa.
“Temos também trator rodando com hidrogênio, são processos que podem ambientalmente ser menos invasivos, mas tudo isso tem que ser econômico, para que se sustente, a menos que seja mandatório”, afirmou.
Ele se diz mais otimista com o biodiesel por ser mais fácil a adaptação do agricultor. No elétrico será necessário planejar horário de uso e de recarga, por exemplo.
Pela marca Valtra, a fabricante também está testando tratores que funcionam a biogás, em parceria com usinas de cana que estão produzindo o biocombustível. A expectativa é que no máximo em 2 anos os tratores a biogás já sejam produzidos e comercializados no Brasil.
“Mesmo os europeus demandam alimento barato, se não viabilizarmos soluções ambientalmente corretas e econômicas, elas não irão prosperar, esse é o desafio de todos nós”.
A empresa persiste em suas metas de descarbonização, uma delas é zerar a pegada de carbono. Em outra frente, a AGCO quer contribuir para reduzir as emissões nas fazendas.
“De todas as emissões para produzir alimentos 7% é maquina agrícola, o maior problema dentro da porteira é o solo”, explica Luís Felli. Por isso, a empresa tem reforçado soluções de agricultura de precisão e incentivo à maior adoção do plantio direto que hoje, segundo ele, só estaria presente em 50% das áreas de grãos. “A tecnologia vai diminuir o problema”.