Uma das exigências ambientais recentes da União Europeia é o cerco aos chamados microplásticos, um resíduo que, por incrível que pareça, também afeta a agricultura.

O processo de tratamento de sementes envolve, em muitos casos, o uso de polímeros que contém os microplásticos. E o mercado europeu proibiu este ano a venda de produtos que contenham estes elementos.

No Brasil, por enquanto não há restrições do tipo, mas uma multinacional Milliken decidiu se antecipar e começou a vender um polímero que não contém microplásticos, como alternativa para o setor.

A empresa norte-americana tem mais de 150 anos e atua com especialidades químicas, revestimentos e materiais de alto desempenho. Para o agro, comercializa os corantes de sementes e defensivos.

Com a certificação do Seedcare Institute, da Syngenta, e da Fundação ABC, os polímeros sem microplástico na formulação da empresa entraram no mercado neste mês de dezembro, e são a grande aposta da empresa para turbinar as vendas nos próximos anos.

Conforme explicou ao AgFeed o gerente de contas sênior da Milliken, Ivan Francischini, as empresas globais de sementes como Corteva, Syngenta e Bayer, que produzem sementes e vendem no mercado europeu já estão adotando essa tecnologia em todo o mundo, mesmo onde não há legislação para o tema.

“Essas empresas nos procuraram e já estamos trabalhando com eles. Acredito que o sementeiro que atua principalmente com o milho deve estar atento a isso”, diz.

Outro produto do portfólio da Milliken que a empresa diz ser único no Brasil é um polímero incolor, vendido em separado, sem o corante. “Oferecemos para o vendedor a possibilidade de dosar a dispersão de pigmento separado. Com isso o cliente vende de acordo com sua estratégia”, diz.

Com 40 anos no agro, Ivan Francischini é formado em engenharia agronômica pela UFV nos anos 1980. Antes de entrar na Milliken em 2018, atuou por 15 anos na Syngenta, e na maior parte do tempo, justamente com tratamento de sementes.

Ele conta que quando recebeu a proposta da Milliken, ainda não conhecia a empresa. Após uma pesquisa, viu que o viés de inovação do negócio poderia se encaixar dentro da agricultura. Fora da área de químicos, a Milliken tem como seus principais clientes a Unilever e a P&G, e atua no desenvolvimento de colorantes para produtos de limpeza.

Naquela época, atuava no Brasil de forma singela, e Ivan entrou no negócio para dar uma tração e estruturar a operação brasileira. “Vi que a empresa possuía um arcabouço de tecnologia de estudos vasto, mas focado no mercado americano. Comecei a mostrar que precisaríamos de algumas adaptações para trazer essa tecnologia para o mercado brasileiro”, disse.

Isso fez com que a matriz passasse a investir na operação brasileira. Sem divulgar valores, ele contou que primeiro foi feito um investimento em um laboratório de desenvolvimento, focado em polímeros e produtos de germinação.

Foi então que em 2020, a operação comercial de fato começou. Na ocasião, a empresa importava os produtos americanos e vendia para as sementeiras aqui. No início, Francischini revelou que os primeiros clientes foram as multinacionais, que segundo o diretor, já conheciam a operação global da empresa, e a partir de 2021, com um aumento no time, passaram a atender clientes locais.

“Na safra 2022/23, passamos a atender sementeiras do Mato Grosso e Goiás e cooperativas no Paraná e Rio Grande do Sul, por exemplo”, explica. Para dar conta da demanda e pela dificuldade logística, a empresa também investiu nessa mesma época em uma produção local no país.

Ivan Francischini não entrou em detalhes do tamanho da operação, mas disse que a estrutura consegue atender a demanda projetada para até os próximos cinco anos. “Atendemos o mercado brasileiro e estamos em conversas para atender Argentina e Paraguai”.

Influência do clima

Com o El Niño, que causou um forte atraso na semeadura da soja, produtores estão fazendo o chamado replantio da safra de verão.

O último relatório da Pátria Agronegócios, do final de novembro, indicou que cerca de 11,7% da área nacional estava sendo replantada. Matheus Pereira, diretor da empresa, revelou ao AgFeed que esse número deve ainda chegar a 15% nas próximas semanas.

Ruim para os produtores, mas bom para quem vende as sementes. Na Milliken, Francischini disse que o início do ano da empresa tem sido ótimo. Na companhia, o ano é dividido em períodos de 28 dias, ou seja, são 13 “meses”. O primeiro período do ano de 2024 já começou, e as vendas aceleraram na Milliken.

“Alguns choram e outros sorriem. Como nós trabalhamos com um produto que faz revestimento do tratamento, se a semente é perdida ele precisa de outra, o agricultor precisa de outra, sementeiro já tinha terminado o tratamento, teve que fazer mais pedidos de tratamento, e de polímeros, e nós tivemos essa agilidade nessa emergência”, conta.

Contudo, o atraso e os replantios devem prejudicar a segunda safra, e consequentemente os próximos “meses” da Milliken. “Temos clientes no sul que perderam mais de 50% da produção de trigo, esse El Ninõ vai afetar nossas vendas lá na frente. Com a seca, o produtor não planta a soja e, sem o capital da soja, não planta o milho. Ou planta atrasado ou perde a janela”.