Em junho deste ano, o casamento bilionário entre a petroleira britânica BP e a trading global Bunge chegou ao final, depois de cinco anos de convivência.
Pelos termos do acordo, concluído no início de outubro, a BP concordou em pagar US$ 1,4 bilhão pelo controle de 11 usinas de etanol em cinco estados brasileiros, com capacidade para moer 32 milhões de toneladas de cana, sendo hoje a segunda maior companhia sucroenergética do País.
Com a operação, a empresa amplia de 300 para 9 mil o número de colaboradores no País e passa a contar no grupo com uma marca cujo Ebitda está estimado em US$ 1 bilhão por ano.
Para Geovane Consul, CEO que ocupa o posto desde 2019, pouco muda, de imediato, no dia a dia do negócio. Mas nas perspectivas percebe-se uma grande diferença. Consul avalia que a partir de agora, o controle acionário integralmente nas mãos da BP pode “viabilizar investimentos em muitos projetos no País”.
O tempo ainda é curto para definir quais seriam os próximos aportes. Em uma conversa com o AgFeed durante a 24ª Conferência Internacional Datagro sobre Açúcar e Etanol, realizada em São Paulo, nesta semana, o executivo, que agfora comanda a BP Bioenergy, não esconde que espera um novo cenário para breve.
“Ficamos felizes em ter a BP como sócia e detentora do capital da empresa, e encaramos isso como um reconhecimento pelo que foi feito nos últimos cinco anos”, declarou.
“A BP é líder global na transição energética, com muita tecnologia e valores sólidos”, acrescentou.
Consul participou de um painel no evento e apontou vários caminhos que devem ser percorridos, agora com mais intensidade, pela companhia. Ele reforçou, por exemplo, que os bioinsumos fazem parte da estratégia de investimentos futuros da BP Bioenergy.
E afirmou que a empresa pretende entrar, nos próximos meses, no mercado de biometano. Segundo Consul, existem sobre a mesa dois projetos para produzir o gás verde, que serão submetidos à aprovação da BP.
Um deles é na Usina Tropical, em Goiás. O outro na Usina Moema, no interior de São Paulo. De acordo com o CEO, a expectativa é, com os dois projetos finalizados, produzir mais de 100 mil metros cúbicos de biometano por ano. O executivo não informou os valores previstos para investimentos.
Há ainda outros caminhos nessa rota dos biocombustíveis alternativos, segundo revelou. Uma delas, por exemplo, passa por reuniões marcadas com a montadora de caminhões sueca Scania para desenvolver alternativas aos caminhões canavieiros da BP Bioenergy, hoje movidos a diesel.
A aposta nos bioinsumos
A empresa, que hoje conta com 400 mil hectares plantados com cana e 11 unidades agroindustriais, têm apostado cada vez mais nos bioinsumos, segundo o CEO.
Considerando todas as aplicações da safra, a BP espera terminar o ciclo 2024/2025 com a aplicação de 3,3 milhões de hectares (somando os manejos) com biológicos, uma alta de 1500% frente ao que era aplicado em 2019, ano em que a antiga BP Bunge foi formada e Consul assumiu o posto.
A empresa estima que saiu de um uso de 100% de fertilizantes químicos em 2020 para a faixa dos 30%, falando de nitrogênio e fósforo, e 17% no potássio nessa safra. No cálculos de Consul, 60% da área com aplicação de inseticidas é feita com produtos biológicos.
“As opções de bioinsumos são enormes. Começamos a investir nisso há cinco anos e hoje já vemos muita disponibilidade pelas empresas que entraram nesse mercado”, afirmou Consul.
“Isso traz benefícios não só em sustentabilidade, mas também em deixar de depender do dólar e de insumos caros, diminuindo nossa necessidade de fazer hedge em fertilizantes”.
Para além do uso, a empresa se vê pronta para atuar como fornecedora de matérias-primas para indústrias de fertilizantes organominerais. A BP Bioenergy estima que sete de suas usinas estão prontas para fazer essa produção.
Consul ressaltou, porém, que a ideia não é criar uma fábrica de organominerais e sim atuar com parceiros. “Tem gente que faz isso melhor que a gente. Nosso foco é a produção de cana”.
Em junho deste ano, pouco antes do anúncio do fim da joint-venture, a então BP Bunge havia sinalizado ao AgFeed que possuía o objetivo de ser autossuficiente em fertilizantes nos próximos anos, usando os subprodutos do processamento da cana, como vinhaça e torta de filtro.
O projeto, que faz parte da estratégia de agricultura regenerativa da empresa, quer reduzir 16% dos seus custos, que é a média gasta pelo setor com esse tipo de insumo.
"O plano é chegar a ter 100% do potássio de fabricação própria com vinhaça até 2026", afirmou, na época, Rogério Bremm, diretor agrícola da empresa.
Fim do casamento
Se de um lado a BP vê uma avenida de crescimento no mercado de bioenergia, alinhado com seu projeto de transição energética, a Bunge viu a joint-venture perder sentido.
Enquanto aguarda os últimos países aprovarem a compra da Viterra, que a transformará na maior trading do mundo, a Bunge deixou claro que sua estratégia está focada na comercialização e processamento de grãos.
Ao mesmo tempo, a venda da participação para a BP reforça o caixa para dar mais saúde ao negócio em meio a um processo de alavancagem.
Na época do anúncio Greg Heckman, CEO da Bunge, foi direto ao ponto ao dizer que "este negócio não é fundamental para a estratégia de longo prazo da Bunge e essa transação nos permitirá focar e investir em nossos negócios core, ao mesmo tempo que fortalecerá ainda mais nosso balanço".